Mente vazia, oficina do sistema da mídia golpista

Mente vazia, oficina do sistema da mídia golpista

quarta-feira, 14 de setembro de 2016

Com Cunha, ou sem Cunha, Com eles o Brasil vai para o ralo Em conversa premonitória, Maria da Conceição antevia a urgência de uma frente ampla com projeto para toda a nação.

por: Saul Leblon

Marcos Oliveira


                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                             Um dos maiores desafios na ação política é ser contemporâneo do seu próprio tempo.

Significa, entre outros requisitos, ter a noção exata das determinações que singularizam a luta pelo desenvolvimento em uma sociedade num dado momento histórico.

Ir além dele condenaria o voluntarismo mais heroico ao resultado mais pífio; o erro em sentido contrário não costuma ser menos inclemente com os hesitantes.

Nessa prova de fogo não se poupam boas intenções ou trajetórias consagradas de governantes, lideranças, partidos, movimentos, sindicatos, mídia ...

Com o desconto da ligeireza, não haveria despropósito em dizer que a tragédia vivida hoje pela sociedade brasileira decorre, em parte, de um erro de avaliação dessa natureza.

Já no final do primeiro mandato da Presidenta Dilma, a quilha da governabilidade exigia outro mix entre a rua e o parlamento.  

Gargalos gritavam a necessidade de mudar o lastro para o exercício do poder --e isso implicava uma recomposição das alianças.

A política fiscal contracíclica  havia esgotado seu fôlego diante de uma persistente desordem global do neoliberalismo.

A escolha de um ajuste rápido baseado em aperto de gastos e desvalorização cambial  --para crescer ancorado em exportações, subestimou a anemia do comércio internacional...

Ao negligenciar a dimensão política do impasse econômica, o governo perdeu o lastro, o golpismo nativo --e o Departamento de Estado-- farejou  a deriva, a aliança da mídia com a escória, o dinheiro e o judiciário fez o resto.

A exata compreensão da encruzilhada exacerbada pelo golpe de 31 de agosto tornou-se agora uma questão de vida ou morte.

Não do PT. Da nação que o Brasil poderia ser, mas ainda não é.

O fato de, em menos de quinze dias, o golpe ter jogado ao mar a carne podre de seu principal operador, cassando Eduardo Cunha por 450 votos a 10, não deve nutrir ilusões em autodissolução.

A faxina no porão, na verdade, alivia a disputa no convés.

A cabeça de Cunha serve como esparadrapo na imagem de um governo corroído pela ilegitimidade.

Passa, ademais, a imagem de um suposto controle sobre o Congresso --para aprovar ‘as reformas’ exigidas pelo mercado.

É improvável que gere retaliações: o descarte não teria ocorrido sem garantias  robustas e generosas, inclusive de salvo conduto na Lava Jato.

O conjunto reafirma no presente, em cores ainda mais vivas, aquilo que já era verdade na travessia do primeiro para o segundo mandato do governo Dilma: o nome do novo protagonista capaz de sacudir a espiral conservadora, com escala e força  capaz de derrota-la, é  a rua mobilizada.

Manifestações  recorrentes tem arrastado centenas de milhares de pessoas às praças e avenidas de todo o país.

A maciça presença, inclusive de famílias inteiras de classe média, deu a elas um peso pedagógico em si: a desobediência civil diante da violência fardada ou midiática desmente para o conjunto da sociedade a fraude do ‘consenso golpista’.

É essa rota de colisão em defesa de eleições diretas que vai trincar a ordem unida da santa aliança entre a escória parlamentar, a mídia, o dinheiro e o judiciário

Para que ela se consolide, porém, não basta a rua dizer o que não quer para o Brasil.

A agenda antissocial e antinacional do golpe terá que ser afrontada por pleitos, bandeiras e projetos que ofereçam à nação uma nova  referência de futuro crível  para a economia, a sua gente e a sua esperança.

A chance de as forças progressistas se transformarem nessa baliza depende da escala e da consistência desse repto nas ruas.

Há um requisito mais geral para isso: a determinação para enxergar o esgotamento de um ciclo e as balizas que podem pavimentar o próximo.

Das muitas conversas que Carta Maior teve sobre essa travessia com intelectuais e lideranças progressistas, uma se notabilizou pelo desassombro atrelado à experiência.

‘Essa crise não se parece com nenhuma outra que vivi’, disse a professora Maria da Conceição Tavares ainda no início da ofensiva golpista, cuja virulência ela precificava, intuitivamente, no diagnóstico sobre a dissociação extremada de interesses econômicos e sociais em confronto.

‘Nenhuma das que acompanhei mais de perto –o pós-Getúlio e a do golpe de 1964, para não falar das outras, como a do fim da ditadura—envolvia um travamento estrutural e político tão difícil’, explicou para sublinhar em contraponto: ‘ Sem falar no quadro internacional, que é completamente outro, marcado pelo ambiente financeiro destrambelhado’.

‘Estamos em uma transição de ciclo estrutural’, escandiu a professora para demarcar o que de essencial precisaria ser contemplado na busca de alternativas  progressistas para o futuro brasileiro.

Nos anos 50 e nos anos 70, depois do suicídio de Getúlio, discorria então  --‘assim como após o golpe militar, havia espaço para se agregar novos setores à estrutura econômica brasileira’.

“Agregar é mais fácil do que reformar as estruturas, me entende?, repetiu algumas vezes durante a conversa, sem disfarçar a apreensão com a gravidade das próprias palavras .

A agregação amortece a colisão entre os interesses já instalados e os novos.

O que fez, afinal, Getúlio quando foi reconduzido ao poder em apoteótica votação nas eleições de 1950, com o Brasil desordenado pela ‘malta liberal’ de Dutra?

‘Getúlio viu espaço oco para agregar novos motores na economia’, observava a decana dos economistas brasileiros na conversa premonitória sobre o golpe que se desenhava.

Segundo ela, Vargas tomou uma série de iniciativas diante da avenida aberta a sua frente:  o Plano de Eletrificação, em 1951; o BNDES, em 1952; a Petrobrás em 1953.

‘Eram medidas convergentes com uma industrialização ainda em fraldas, onde muito havia por fazer, mas que já dava um horizonte à nação’.

Vargas modernizou áreas já existentes, adicionou novas turbinas a elas, investiu no setor de bens de base  -- ‘de base porque produz equipamentos, componentes, insumos universais, para todos os segmentos, certo?’.

Interligou isso aos duráveis, amalgamando a economia com uma cola política feita de expansão do emprego e extensão de direitos ao florescente operariado urbano.

‘Aí acharam melhor eliminá-lo, que a coisa estava indo longe demais’, brincou a voz professoral.

‘Mas a crise da morte do Vargas’, atalharia em seguida a economista, ‘embora violenta por todos os seus ingredientes, paradoxalmente  durou pouco’.

Aqui puxou a memória de acontecimentos que acompanhou diretamente, jovem matemática atravessando a fronteira para a economia.

‘Durou pouco porque havia toda uma avenida aberta, aquela que Vargas deixou para JK  agregar: a dos bens de consumo’, interrompeu para retomar o fôlego.

‘O que fez JK, então? Fez o Plano de Metas dilatou a infraestrutura; trouxe o parque automobilístico, deslanchou um novo ciclo de expansão’.

O impasse vivido por Jango seria um primeiro sinal de que a agregação pura já enfrentava gargalos estruturais, lembrou Conceição a Carta Maio, convidada a traçar  um paralelo com a gravidade da crise que, pouco depois redundaria no golpe atual.

‘Tanto que tivemos ali uma ruptura violenta’, pontuou a economista que se exilou no Chile durante a ditadura, onde assessorou a equipe de Salvador Allende, cuja derrubada completou quarenta e três anos neste 11 de setembro.

Quando Jango se viu na contingência de ampliar o espaço do brasileiros miseráveis, excluídos do mercado e da cidadania  --que dilataria o fôlego do desenvolvimento pela alavanca do mercado de massa-- os interesses estabelecidos reagiram violentamente.

‘Por quê?, indaga a narradora como se visse um filme rebobinado passando outra vez diante de seus olhos atentos e fixos.

Em vez de apenas agregar, as reformas de base buscavam democratizar o que antes era um privilégio dos herdeiros da casa grande.

Eis a diferença sinalizada por ela.

A terra, por certo. Mas também a educação, o comando sobre riquezas naturais; o controle sobre a moeda e os capitais; a ampliação da democracia na base da sociedade.

Deu-se o que é sabido.

‘Só que os milicos do golpe eram eles mesmos desenvolvimentistas! ‘, atalhou Conceição rindo das ironias da história. Os  ‘milicos’ no entanto tropeçariam ‘feio’, lembra.

Fizeram o torto por linhas certas: em vez de agregar novos polos de ponta à industrialização, como eletroeletrônica etc, o regime ditatorial  super-dimensionou outros já existentes  --a siderurgia, por exemplo.

A ‘sobreagregação’ expandiu o PIB por um tempo, mas endividou o país sem contrapartida  exportadora  para os dólares tomados a juros baixos, mas a taxas flutuantes.

Quando elas flutuaram ferozmente para cima --saltaram de 7,5% para 20,18% em 1980—‘o regime perdeu o assoalho’, disparou a voz rouca inconfundível.

‘O que se tem agora é mais sério, de qualquer forma, do que a transição de Vargas para JK e de Jango para o golpe’, sentenciaria em seguida antevendo o embate que, afinal, se concretizou.

‘É estrutural’, repetia  Conceição mais uma vez.

Estrutural, insiste, significa que não se resolve adicionando mais carga na mesma máquina de crescimento -- como se fez antes para reacomodar os conflitos de classes.

‘O Brasil não vai acabar, nem o capitalismo’, brincou então querendo desanuviar a turbulência intrínseca ao quadro que desenha em largas pinceladas de cores fortes. ‘Mas há um esgotamento desse correr para frente baseado em aditivos que se sobrepõem à engrenagem anterior claudicante’.

Ainda por cima, coroado por um  ambiente internacional pantanoso.

Então é diferente de tudo o que Conceição viu e viveu.

‘A estrutura econômica do país está montada. É preciso recauchutar a máquina mas, sobretudo, reorientar seu rumo’, aqui a professora retomava o fio do impasse.

O Brasil viveu um período acelerado de consolidação industrial no 2o PND (1975/79) , o plano de desenvolvimento da ditadura –‘dificilmente repetirá aquele desempenho característico da fase de instalação e consolidação de um parque industrial’, adverte.

Esse tempo acabou.

A indústria brasileira, na verdade, está sendo corroída por duas inércias que o ciclo iniciado em 2003 não corrigiu. De um lado, a valorização cambial acumulada nas últimas décadas asfixiou o parque fabril brasileiro sob a avalanche das importações asiáticas. Simultaneamente, cristalizou-se uma inserção internacional capenga, que perdeu o bonde tecnológico dos anos 80/90 porque ruminava a dolorida digestão da dívida externa da ditadura.

‘O bonde perdido de um ciclo internacional não passa de novo’, adverte a professora na conversa premonitória. ‘Não vamos mais competir com os chineses naquilo que eles tomaram de nós e se mostraram líderes no mundo’, advertiu sobre a erosão sofrida em vários setores e cadeias industriais.

Por isso o pré-sal e o mercado de consumo doméstico, revigorado pelo ganho de poder de compra e escala propiciados pelas novas balizas sociais e salariais do ciclo do PT, bem como o PAC na infraestrutura e, objetivamente, o agronegócio, são tão importantes.

É esse o novo chão do desenvolvimento brasileiro no século XXI.

Os encadeamentos inscritos no regime de partilha do pre-sal e a exigência de conteúdo nacional, ambos demonizados e agora às portas de serem revogados pelo golpe com a decisiva indução de um ex- companheiro de exílio de Conceição –José Serra--  encerram impulsos industrializantes de ponta, com escala capaz de criar, aí sim, uma inserção virtuosa do país nas cadeias internacionais.

O mercado de massa, por sua vez,  poderá  atrair plantas industriais e lastrear segmentos ainda não triturados por décadas de importações baratas. ‘O PAC arremata o comboio puxando tudo pela alavanca do investimento público’.

Conceição contextualizou esse tripé de forma realista, ciente de que a areia movediça da crise política estreitou a margem de manobra em todas as frentes.

‘Hoje isso depende muito do financiamento chinês para se viabilizar. É por aí que vamos completar o investimento público do PAC; não enxergo outra saída com as restrições impostas na frente fiscal’, suspirava a olhar o país a escapar-lhe pelos dedos.

Seu próprio desalento, porém, sofre um safanão em tom de advertência na frase seguinte: ‘ Mas se não defendermos as políticas sociais, o PAC e o pré-sal não teremos mais modelo nenhum, nem de desenvolvimento, nem de industrialização, nem nação; o Brasil vai para o ralo’.

A costura dessa travessia envolve uma operação essencialmente política, como já explicou, porque mexe profundamente em interesses cristalizados.

O nome do jogo não é mais ganha/ganha: é correlação de forças. E ele se joga na rua.

A  alternativa ao ajuste golpista baseado na supressão de direitos trabalhistas, por exemplo, adquire subversiva transparência:  chama-se taxação das fortunas, do lucro dos bancos, dos dividendos,  das remessas disfarçadas de assistência, das heranças etc.

´Não existe resposta técnica para o que se esboça diante de nós’, projetaria com precisão a professora de uma geração inteira de economistas, entre alunos e amigos, que a ouvem e respeitam, mesmo quando dela divergem.

Como já antevia, com o golpe, os gargalos se fecharam em arrocho, que  já derrete o consumo das famílias, derradeiro lacre de segurança do ciclo petista que avançou de forma quase ininterrupta até meados de 2014.

O consumo das famílias pesa 63% na demanda da economia e arrastou junto a receita, o investimento, o emprego... O que sobra?

‘A sobra é insuficiente para sustentar uma nação, um governo e um projeto progressista de desenvolvimento’, diz a voz naturalmente grave, mas com sustenido emotivo.

‘Você não sairá disso com debate econômico’, profetizou  Conceição. ‘É preciso algo amplo, democrático que se imponha como um  lastro,  uma nova referência’.

Conceição quis dizer exatamente isso que hoje significa ser contemporâneo do próprio tempo:  a rua munida de projeto para o conjunto da sociedade – ‘inclusive para os setores produtivos’.

A professora vislumbrou tudo isso meses antes, talvez porque quisesse acelerar o tempo, a tempo de ver seu país resgatar o sonho de ser a grande nação pela qual ela lutou durante seus oitenta e seis anos.

Ex-ministro da Justiça acusa Janot de traição

:

Em carta publicada no blog do jornalista Marcelo Auler, o ex-ministro da Justiça Eugênio Aragão responde ao procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que atacou os críticos da Lava Jato durante discurso na posse da ministra Cármen Lúcia à presidência do STF; "Visto a carapuça, Doutor Rodrigo Janot", escreve Aragão, lembrando de opiniões que os dois compartilhavam sobre o Ministério Público, e inclusive a de que tinham "consciência da inocência de José Genoino", contra quem Janot pediu a prisão logo no primeiro mês no cargo; Aragão faz duras críticas à condução da Operação Lava Jato e diz, em referência ao Ministério Público: "Nossa instituição exibe-se, assim, sob a sua liderança, surfando na crise para adquirir musculatura, mesmo que isso custe caro ao Brasil e aos brasileiros"; Aragão diz ainda que Janot se calou sobre o golpe e questiona por que demorou para afastar Cunha 


Sobre a honestidade de quem critica a Lava Jato

Por Eugênio Aragão, ex-ministro da Justiça, via Blog do Marcelo Auler

“Praecepta iuris sunt haec: honeste vivere, alterum non laedere, suum cuique  tribuere” (Ulpiano)
“Os preceitos do direitos são estes: viver honestamente, não lesar a outrem, dar a cada um o que é seu.” (Ulpiano)

“Disse o Senhor Procurador-Geral da República por ocasião da posse da nova presidente do STF, Ministra Carmen Lúcia, que se tem “observado diuturnamente um trabalho desonesto de desconstrução da imagem de investigadores e de juízes. Atos midiáticos buscam ainda conspurcar o trabalho sério e isento desenvolvido nas investigações da Lava Jato”.

Visto a carapuça, Doutor Rodrigo Janot. E lhe respondo publicamente, por ser esse o único meio que me resta para defender a honestidade de meu trabalho, posta em dúvida, também publicamente, pelo Senhor, numa ocasião solene, na qual jamais alcançaria o direito de resposta.
O Senhor sabe o quanto tenho sido ostensivamente crítico da forma de agir estrambólica dos agentes do Estado, perceptível, em maior grau, desde a Ação Penal 470, sob a batuta freisleriana do Ministro Joaquim Barbosa.

Aliás, antes de ser procurador-geral, o Senhor compartilhava comigo, em várias conversas pessoais, minha crítica, dirigida, até mesmo, ao Procurador-Geral da República de então, Doutor Gurgel. Lembro-me bem de suas opiniões sobre a falta de noção de oportunidade de Sua Excelência, quando denunciou o Senador Renan Calheiros em plena campanha à presidência do Senado.

Lembro-me, também, de nossa inconformação solidária contra as injustiças perpetradas na Ação Penal 470 contra NOSSO (grifo do original) amigo José Genoíno.

“Não foi uma só vez que o Senhor contou que seus antecessores sabiam da inocência de Genoíno, mas não o retiraram da ação penal porque colocaria em risco o castelo teórico do “Mensalão”, como empreitada de uma quadrilha, da qual esse nosso amigo tinha que fazer parte, para completar o número”.

Por sinal, conheci José Genoíno em seu apartamento, na Asa Sul, quando o Senhor e eu dirigíamos em parceria a Escola Superior do Ministério Público da União. Àquela ocasião, já era investigado, senão denunciado, por Doutor Antônio Fernando.

Admirei a sua coragem, Doutor Rodrigo, de não se deixar intimidar pelos arroubos midiáticos e jurisdicionais vindas do Excelso Sodalício. Com José Genoíno travamos interessantes debates sobre o futuro do País, sobre a necessidade de construção de um pensamento estratégico com a parceria do ministério público.

Tornou-se, esse político, então, mais do que um parceiro, um amigo, digno de ser recebido reiteradamente em seu lar, para se deliciar com sua arte culinária. De minha parte, como não sou tão bom cozinheiro quanto o Senhor, preferia encontrar, com frequência, Genoíno, com muito gosto e admiração pela pessoa simples e reta que se me revelava cada vez mais, no restaurante árabe do Hotel das Nações, onde ele se hospedava. Era nosso point.

Cá para nós, Doutor Rodrigo Janot, o Senhor jamais poderia se surpreender com meu modo de pensar e de agir, para chamá-lo de desonesto. O Senhor me conhece há alguns anos e até me confere o irônico apelido de “Arengão”, por saber que não fujo ao conflito quando pressinto injustiça no ar. Compartilhei esse pressentimento de injustiça com o Senhor, já quando era procurador-geral e eu seu vice, no Tribunal Superior Eleitoral.

Compartilhei meus receios sobre os desastrosos efeitos da Lava Jato sobre a economia do País e sobre a destruição inevitável de setores estratégicos que detinham insubstituível ativo tecnológico para o desenvolvimento do Brasil. Da última vez que o abordei sobre esse assunto, em sua casa, o Senhor desqualificou qualquer esforço para salvar a indústria da construção civil, sugerindo-me que não deveria me meter nisso, porque a Lava Jato era “muito maior” do que nós.
Mas continuemos no flash-back.

Tinha-o como um amigo, companheiro, camarada. Amigo não trai, amigo é crítico sem machucar, amigo é solidário e sempre tem um ouvido para as angústias do outro.

Lutamos juntos, em 2009, para que Lula indicasse Wagner Gonçalves procurador-geral, cada um com seus meios. Os meus eram os contatos sólidos que tinha no governo pelo meu modo de pensar, muito próximo ao projeto nacional que se desenvolvia e que fui conhecendo em profundidade quando coordenador da 5ª Câmara de Coordenação e Revisão da PGR, que cuidava da defesa do patrimônio público.
Ficamos frustrados quando, de última hora, Lula, seguindo conselhos equivocados, decidiu reconduzir o Doutor Antônio Fernando.
 
Em 2011, tentamos de novo, desta vez com sua candidatura contra Gurgel para PGR.
Na verdade, sabíamos que se tratava apenas de um laboratório de ensaio, pois, com o clamor público induzido pelos arroubos da mídia e os chiliques televisivos do relator da Ação Penal 470, poucas seriam as chances de, agora Dilma, deixar de indicar o Doutor Gurgel, candidato de Antônio Fernando, ao cargo de procurador-geral.

Ainda assim, levei a missão a sério. Fui atrás de meus contatos no Planalto, defendi seu nome com todo meu ardor e consegui, até, convencer alguns, mas não suficientes para virar o jogo.
Mas, vamos em frente.

Em 2013, quando o Senhor se encontrava meio que no ostracismo funcional porque ousara concorrer com o Doutor Gurgel, disse-me que voltaria a concorrer para PGR e, desta vez, para valer.
 
Era, eu, Corregedor-Geral do MPF e, com muito cuidado, me meti na empreitada. Procurei o Doutor Luiz Carlos Sigmaringa Seixas, meu amigo-irmão há quase trinta anos, e pedi seu apoio a sua causa.
Procurei conhecidos do PT em São Paulo, conversei com ministros do STF com quem tinha contatos pessoais. Enquanto isso, o Senhor foi fazendo sua campanha Brasil afora, contando com o apoio de um grupo de procuradores e procuradoras que, diga-se de passagem, na disputa com Gurgel tinham ficado, em sua maioria, com ele.

Incluía, até mesmo, o pai da importação xinguelingue ( Gíria paulista: produto barato que vem da China, geralmente de baixíssima qualidade) da teoria do domínio do fato, elaborado por Claus Roxin no seu original, mas completamente deturpada na Pindorama, para se transmutar em teoria de responsabilidade penal objetiva.

Achava essa mistura de apoiadores um tanto estranha, pois eu, que fazia o trabalho de viabilizar externamente seu nome, nada tinha em comum com essa turma em termos de visão sobre o ministério público.

Como o Senhor sabe, no início de 2012, publiquei, numa obra em “homenagem” ao então Vice-Presidente da República, Michel Temer, um artigo extremamente polêmico sobre as mutações disfuncionais por que o ministério público vinha passando.

Esse artigo, reproduzido no Congresso em Foco, com o título “Ministério Público na Encruzilhada: Parceiro entre Sociedade e Estado ou Adversário implacável da Governabilidade?”, quando tornado público, foi alvo de síncopes corporativas na rede de discussão @Membros.

Faltaram querer me linchar, porque nossa casa não é democrática. Ela se rege por um princípio de omertà muito próprio das sociedades secretas. Mas não me deixei intimidar.

Depois, ainda em 2013, publiquei outro artigo, em crítica feroz ao movimento corporativo-rueiro contra a PEC 37, também no Congresso em Foco, com o título “Derrota da PEC 37: a apropriação corporativa dos movimentos de rua no Brasil”.

(N.R. A PEC 37, derrotada na Câmara em junho de 2013, determinava que o poder de investigação criminal seria exclusivo das polícias federal e civis, retirando esta atribuição de alguns órgãos e, sobretudo, do Ministério Público (MP).

Sua turma de apoio me qualificou de insano, por escrever isso em plena campanha eleitoral do Senhor. Só que se esqueceram que meu compromisso nunca foi com eles e com o esforço corporativo de indicar o Procurador-Geral da República por lista tríplice.Sempre achei esse método de escolha do chefe da instituição um grande equívoco dos governos Lula e Dilma.
 
Meu compromisso era com sua indicação para o cargo, porque acreditava na sua liderança na casa, para mudar a cultura do risco exibicionista de muitos colegas, que afetava enormemente a qualidade de governança do País.

No seu caso, pensava, a coincidência de poder ser o mais votado pela corporação e de ter a qualidade da sensibilidade para com a política extra-institucional, era conveniente, até porque a seu lado, poderia colaborar para manter um ambiente de parceria com o governo e os atores políticos.

Não foi por outro motivo que, quando me deu a opção, preferi ocupar a Vice-Procuradoria-Geral Eleitoral a ocupar a Vice-Procuradoria-Geral da República que, a meu ver, tinha que ser destinada à Doutora Ela Wiecko Volkmer de Castilho, por deter, também, expressiva liderança na casa e contar com boa articulação com o movimento das mulheres. Este foi um conselho meu que o Senhor prontamente atendeu, ainda antes de ser escolhido.
 
Naqueles dias, a escolha da Presidenta da República para o cargo de procurador-geral estava entre o Senhor e a Doutora Ela, pendendo mais para a segunda, por ser mulher e ter tido contato pessoal com a Presidenta, que a admirava e continua admirando muito.
Ademais, Doutora Ela contava com o apoio do Advogado-Geral da União, Doutor Luís Inácio Adams. Brigando pelo Senhor estávamos nós, atuando sobre o então Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo e o amigo Luiz Carlos Sigmaringa Seixas.

Quando ouvimos boatos de que a mensagem ao Senado, com a indicação da Doutora Ela, estava já na Casa Civil para ser assinada, imediatamente agi, procurando o Ministro Ricardo Lewandowski, que, após recebê-lo, contatou a Presidenta para recomendar seu nome.
 
No dia em que o Senhor foi chamado para conversar com a Presidenta, fui consultado pelo Ministro da Justiça e pelo Advogado-Geral da União, pedindo que confirmasse, ou não, que seu nome era o melhor. Confirmei, em ambos os contatos telefônicos.

Na verdade, para se tornar Procurador-Geral da República, o Senhor teve que fazer alianças contraditórias, já que não aceitaria ser nomeado fora do método de escolha corporativista.

Acendeu velas para dois demônios que não tinham qualquer afinidade entre si: a corporação e eu.
Da primeira precisou de suporte para receber seus estrondosos 800 e tantos votos e, de mim, para se viabilizar num mundo em que o Senhor era um estranho. Diante do meu receio de que essa química poderia não funcionar, o Senhor me acalmou, dizendo que nós nos consultaríamos em tudo, inclusive no que se tinha a fazer na execução do julgado da Ação Penal 470, que, a essa altura, já estava prestes a transitar.

O dia de sua posse foi, para mim, um momento de vitória. Não uma vitória pessoal, mas uma vitória do Estado Democrático de Direito que, agora, teria um chefe do ministério público enérgico e conhecedor de todas as mazelas da instituição. Sim, tinha-o como o colega no MPF que melhor conhecia a política interna, não só pelos cargos que ocupara, mas sobretudo pelo seu jeitão mineiro e bonachão de conversar com todos, sem deixar de ter lado e ser direto, sincero, às vezes até demais.

Seu déficit em conhecimento do ambiente externo seria suprido com o exercício do cargo e poderia, eu, se chamado, auxiliá-lo, assim como Wagner Gonçalves ou Claudio Fonteles.

Meu susto se deu já no primeiro mês de seu exercício como procurador-geral. Pediu, sem qualquer explicação ou conversa prévia com o parceiro de que tanto precisou para chegar lá, a prisão de José Genoíno. E isso poucos meses depois de ele ter estado com o Senhor como amigo in pectore.

Eu não tenho medo de assumir que participei desses contatos. Sempre afirmei publicamente a extrema injustiça do processo do “Mensalão” no que toca aos atores políticos do PT. Sempre deixei claro para o Senhor e para o Ministro Joaquim Barbosa que não aceitava esse método de exposição de investigados e réus e da adoção de uma transmutação jabuticaba da teoria do domínio do fato.
 
Defendi José Genoíno sempre, porque, para mim, não tem essa de  abrir seu coração (e no seu caso, a sua casa) a um amigo e depois tratá-lo como um fora da lei, sabendo-o inocente.

Tentei superar o choque, mas confesso que nunca engoli essa iniciativa do Senhor.

Acaso achasse necessário fazê-lo, deveria ter buscado convencer as pessoas às quais, antes, expressou posição oposta. E, depois, como José Genoino foi reiteradamente comensal em sua casa, nada custava, em último caso, dar-se por suspeito e transferir a tarefa do pedido a outro colega menos vinculado afetivamente, não acha?

Como nosso projeto para o País era maior do que minha dor pela injustiça, busquei assimilar a punhalada e seguir em frente, sabendo que, para terceiros, o Senhor se referia a mim como pessoa que não podia ser envolvida nesse caso, por não ter isenção.

E não seria mesmo envolvido. Nunca quis herdar a condução da Ação Penal 470, para mim viciada ab ovo, e nunca sonhei com seu cargo. Sempre fui de uma lealdade canina para com o Senhor e insistia em convencer, a mim mesmo, que sua atitude foi por imposição das circunstâncias. Uma situação de “duress”, como diriam os juristas anglo-saxônicos.

Mas chegou o ano 2014 e, com ele, a operação Lava Jato e a campanha eleitoral. Dois enormes desafios. Enquanto, por lealdade e subordinação, nenhuma posição processual relevante era deixada de lhe ser comunicada no âmbito do ministério público eleitoral, no que diz respeito à Lava Jato nada me diziam, nem era consultado.

O Senhor preferiu formar uma dupla com seu chefe de gabinete, Eduardo Pelella, que tudo sabia e em tudo se metia e, por isso, chamado carinhosamente de “Posto Ipiranga”. Era seu direito e, também por isso, jamais o questionei a respeito, ainda que me lembrasse das conversas ante-officium de que sempre nos consultaríamos sobre o que era estratégico para a casa.

Passei a perceber, aos poucos, que minha distância, sediado que estava fora do prédio, no Tribunal Superior Eleitoral, era conveniente para o Senhor e para seu grupo que tomava todas as decisões no tocante à guerra política que se avizinhava.

Não quis, contudo, constrangê-lo. Tinha uma excelente equipe no TSE. Fazia um time de primeira com os colegas Luiz Carlos Santos Gonçalves, João Heliofar, Ana Paula Mantovani Siqueira e Ângelo Goulart e o apoio inestimável de Roberto Alcântara, como chefe de gabinete. Não faltavam problemas a serem resolvidos numa das campanhas mais agressivas da história política do Brasil. Entendi que meu papel era garantir que ninguém fosse crucificado perante o eleitorado com ajuda do ministério público e, daí, resolvemos, de comum acordo, que minha atuação seria de intervenção mínima, afim de garantir o princípio da par conditio candidatorum.

Quando alguma posição a ser tomada era controversa, sempre a submeti ao Senhor e lhe pedi reiteradamente que tivesse mais presença nesse cenário. Fiquei plantado em Brasília o tempo todo, na posição de bombeiro, evitando que o fogo da campanha chegasse ao judiciário e incendiasse a corte e o MPE. As estatísticas são claras. Não houve nenhum ponto fora da curva no tratamento dos contendentes.
Diferentemente do que o Senhor me afirmou, nunca tive briga pessoal com o então vice-presidente do TSE.

Minha postura de rejeição de atitudes que não dignificavam a magistratura era institucional.

E, agora, que Sua Excelência vem publicamente admoestá-lo na condução das investigações da Lava Jato, imagino, suas duras reações na mídia também não revelam um conflito pessoal, mas, sim, institucional. Estou certo? Portanto, nisso estamos no mesmo barco, ainda que por razões diferentes.

Passada a eleição, abrindo-se o “terceiro turno”, com o processo de prestação de contas da Presidenta Dilma Rousseff que não queria e continua não querendo transitar em julgado apesar de aprovado à unanimidade pelo TSE e com as ações de investigação judicial e de impugnação de mandato eleitoral manejadas pelo PSDB, comecei, pela primeira vez, a sentir falta de apoio.

Debitava essa circunstância, contudo, à crise da Lava Jato que o Senhor tinha que dominar. As vezes que fui chamado a assinar documentos dessas investigações, em sua ausência, o fiz quase cegamente. Lembrava-me da frase do querido Ministro Marco Aurélio de Mello, “cauda não abana cachorro”.

Só não aceitei assinar o parecer do habeas corpus impetrado em favor de Marcelo Odebrecht com as terríveis adjetivações da redação de sua equipe. E o avisei disso. Não tolero adjetivações de qualquer espécie na atuação ministerial contra pessoas sujeitas à jurisdição penal.

Não me acho mais santo do que ninguém para jogar pedra em quem quer que seja. Meu trabalho persecutório se resume à subsunção de fatos à hipótese legal e não à desqualificação de Fulano ou Beltrano, que estão passando por uma provação do destino pelo qual não tive que passar e, por conseguinte, não estou em condições de julgar espiritualmente.

Faço um esforço de me colocar mentalmente no lugar deles, para tentar entender melhor sua conduta e especular sobre como eu teria agido. Talvez nem sempre mais virtuosamente e algumas vezes, quiçá, mais viciadamente.

Investigados e réus não são troféus a serem expostos e não são “meliantes” a serem conduzidos pelas ruas da vila “de baraço e pregão” (apud Livro V das Ordenações Filipinas). São cidadãos, com defeitos e qualidades, que erraram ao ultrapassar os limites do permissivo legal. E nem por isso deixo de respeitá-los.
Fui surpreendido, em março deste ano, com o honroso convite da senhora Presidenta democraticamente eleita pelos brasileiros, Dilma Vana Rousseff, para ocupar o cargo de Ministro de Estado da Justiça.
Imagino que o Senhor não ficou muito feliz e até recomendou à Doutora Ela Wiecko a não comparecer a minha posse. Aliás, não colocou nenhum esquema do cerimonial de seu gabinete para apoiar os colegas que quisessem participar do ato. Os poucos (e sinceros amigos) que vieram tiveram que se misturar à multidão.
A esta altura, nosso contato já era parco e não tinha porque fazer “mimimi” para exigir mais sua atenção. Já estava sentindo que nenhum de nossos compromissos anteriores a sua posse como procurador-geral estavam mais valendo.

O Senhor estava só monologando com sua equipe de inquisidores ministeriais ferozes. Essa é a razão, meu caro amigo Rodrigo Janot, porque não mais o procurei como ministro de forma rotineira. Estive com o Senhor duas vezes apenas, para tratar de assuntos de interesse interinstitucional.

E quando voltei ao Ministério Público Federal, Doutor Rodrigo Janot, não quis mais fazer parte de sua equipe, seja atuando no STF, seja como coordenador de Câmara, como me convidou. Prontamente rejeitei esses convites, porque não tenho afinidade nenhuma com o que está fazendo à frente da Lava Jato e mesmo dentro da instituição, beneficiando um grupo de colaboradores em detrimento da grande maioria de colegas e rezando pela cartilha corporativista ao garantir a universalidade do auxílio moradia concedida por decisão liminar precária.
 
Na crítica à Lava Jato, entretanto, tenho sido franco e assumido, com risco pessoal de rejeição interna e externa, posições públicas claras contra métodos de extração de informação utilizados, contra vazamentos ilegais de informações e gravações, principalmente em momentos extremamente sensíveis para a sobrevida do governo do qual eu fazia parte, contra o abuso da coerção processual pelo juiz Sérgio Moro, contra o uso da mídia para exposição de pessoas e contra o populismo da campanha pelas 10 medidas, muitas à margem da constituição, propostas por um grupo de procuradores midiáticos que as transformaram, sem qualquer necessidade de forma, em “iniciativa popular”.

Nossa instituição exibe-se, assim, sob a sua liderança, surfando na crise para adquirir musculatura, mesmo que isso custe caro ao Brasil e aos brasileiros.

Vamos falar sobre honestidade, Senhor Procurador-Geral da República.
 
A palavra consta do brocardo citado no título desta carta aberta.

O Senhor não concorda e não precisa mais concordar com minhas posições críticas à atuação do MPF.

Nem tem necessidade de uma aproximação dialógica. Já não lhe sirvo para mais nada quando se inicia o último ano de seu mandato.

Mas depois de tudo que lhe disse aqui para refrescar a memória, o Senhor pode até me acusar de sincericídio, mas não mais, pois a honestidade (honestitas), que vem da raiz romana honor, honoris, esta, meu pai, do Sertão do Pajeú, me ensinou a ter desde pequeno. Nunca me omiti e não me omitirei quando minha cidadania exige ação.

Procuro viver com honra e, por isto, honestamente, educando seis filhos a comer em pratos Duralex, usando talheres Tramontina e bebendo em copo de requeijão, para serem brasileiros honrados, dando valor à vida simples.

Diferentemente do Senhor, não fiquei calado diante das diatribes políticas do Senhor Eduardo Cunha e de seus ex-asseclas, que assaltaram a democracia, expropriando o voto de 54 milhões de brasileiros, pisoteando-os com seus sapatinhos de couro alemão importado. Não fui eu que assisti uma Presidenta inocente ser enxovalhada publicamente como criminosa, não porque cometeu qualquer crime, mas pelo que representa de avanço social e, também, por ser mulher.

O Senhor ficou silente, apesar de tudo que conversamos antes de ser chamado a ser PGR. E ficou aceitando a pilha da turma que incendiava o País com uma investigação de coleta de prova de controvertido valor.

Eu sou o que sempre fui, desde menino que militou no Movimento Revolucionário 8 de Outubro. E o Senhor? Se o Senhor era o que está sendo hoje, sinto-me lesado na minha boa fé (alterum non laedere, como fica?). Se não era, o que aconteceu?

“A Lava Jato é maior que nós”?

Esta não pode ser sua desculpa. Tamanho, Senhor Procurador-Geral da República, é muito relativo. A Lava Jato pode ser enorme para quem é pequeno, mas não é para o Senhor, como espero conhecê-lo. Nem pode ser para o seu cargo, que lhe dá a responsabilidade de ser o defensor maior do regime democrático (art. 127 da CF) e, devo-lhe dizer, senti falta de sua atuação questionando a aberta sabotagem à democracia. Por isso o comparei a Pilatos. Não foi para ofendê-lo, mas porque preferiu, como ele, lavar as mãos.

Mas fico por aqui. Enquanto trabalhei consigo, dei-lhe o que lhe era de direito e o que me era de dever: lealdade, subordinação e confiança (suum cuique tribuere, não é?). E, a mim, o Senhor parece também ter dado o que entende ser meu: a acusação de agir desonestamente. Não fico mais triste. A vida nos ensina a aceitar a dor como ensinamento. Mas isso lhe prometo: não vou calar minha crítica e, depois de tudo o que o Senhor conhece de mim, durma com essa.
 
Um abraço sincero daquele que esteve anos a fio a seu lado, acreditando consigo num projeto de um Brasil inclusivo, desenvolvido, economicamente forte e respeitado no seio das nações, com o ministério público como ativo parceiro nessa empreitada.

Cunha ameaça contar como Temer conspirou contra Dilma e a democracia

:

O estopim do desembarque foi uma ameaça direta de Cunha ao presidente Michel Temer. O recado, em tom de ameaça, era sobre a possibilidade de Cunha contar 'a quem quisesse ouvir' detalhes das reuniões mantidas com Temer para afinar a aceitação do impeachment de Dilma Rousseff", diz reportagem do jornalista Fábio Serapião, do Estado de S. Paulo, que confirma o que todos sempre souberam: Eduardo Cunha e Michel Temer conspiraram juntos para afastar a presidente eleita Dilma Rousseff 

247 – Uma reportagem do jornalista Fábio Serapião, sobre os bastidores da cassação de Eduardo Cunha, traído por Michel Temer e pelo Palácio do Planalto, revela um segredo de Polichinelo: os dois conspiraram juntos para afastar a presidente eleita Dilma Rousseff do cargo para o qual foi eleita com 54 milhões de votos.

Cunha esperava que "Michel" fizesse gestos para protegê-lo, mas acabou sendo abandonado. Pouco antes da votação, ele prometeu contar, "a quem quisesse ouvir", detalhes da conspiração que feriu de morte a democracia brasileira.

Leia, abaixo, a reportagem de Serapião:

BASTIDORES: Planalto abandonou Cunha após ameaça direta a Temer
Por Fábio Serapião, no Estado de S. Paulo

Os desdobramentos de duas reuniões iniciadas na noite de domingo, 11, resultaram no placar de 450 deputados a favor da cassação de Eduardo Cunha e apenas 10 contra. O resultado foi se consolidando após o Planalto abandonar Cunha e liberar a base para votar pelo fim de seu mandato. O Estado apurou que o estopim do desembarque foi uma ameaça direta de Cunha ao presidente Michel Temer. O recado, em tom de ameaça, era sobre a possibilidade de Cunha contar “a quem quisesse ouvir” detalhes das reuniões mantidas com Temer para afinar a aceitação do impeachment de Dilma Rousseff.

Enquanto o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), reunia políticos e jornalistas na residência oficial, aliados de Cunha conversavam no escritório do advogado Renato Ramos. Estavam presentes, além de Maia, Moreira Franco, Geddel Vieira Lima e outros políticos. Todos comiam pizza quando o telefone de Maia tocou. A ligação partia de um dos convivas da outra reunião.

Convicto de que a reunião de Maia era um sinal do que o esperava na votação do dia seguinte, Cunha pediu para que dois de seus aliados fossem até a residência oficial para saber se o presidente da Câmara manteria a palavra de abrir a sessão somente com 420 deputados presentes. Maia confirmou que daria seguimento à votação apenas com esse quórum, mas informou que, em caso de tentativa de postergação, iniciaria a sessão com mais de 300 presentes.

Ao saber do posicionamento de Maia, já na madrugada da segunda-feira, 12, Cunha teria ficado nervoso. Na manhã de segunda, o clima piorou. Segundo aliados, Cunha fez a ameaça direta a Temer e acabou abandonado pelo Planalto.

Itamaraty extingue departamento de cooperação internacional para combate à fome

:

Ministério diz que funções da CGFOME, legado do governo Lula, foram redistribuídas; coordenador-geral do programa havia sido exonerado em junho 

Do Opera Mundi O Itamaraty extinguiu a CGFOME (Coordenação-Geral de Cooperação Humanitária e Combate à Fome), órgão criado em 2004 para coordenar ações do governo brasileiro de combate à fome no âmbito internacional. A informação foi revelada pelo jornal O Globo nesta terça-feira (13/09) e confirmada por Opera Mundi.

Nesta terça-feira (13/09), a reportagem de Opera Mundi tentou entrar em contato com a CGFOME por meio dos telefones que continuam disponíveis no site oficial do órgão, mas não foi atendida.

A reportagem ligou então para diversos números disponibilizados no site do Ministério e foi atendida pela Ouvidoria Consular, que afirmou que a CGFOME foi de fato extinta há cerca de dois meses.

Procurada por Opera Mundi, a assessoria do Itamaraty disse que a "extinção da Coordenação se deu no âmbito da reorganização administrativa e redistribuição de competências do MRE, refletidas no Decreto 8.817, de 21 de julho de 2016 e decorrentes do Decreto 8.785, de 10 de junho de 2016, que determinou o enxugamento da estrutura e a devolução de 46 cargos em comissão do MRE".A assessoria do Itamaraty afirmou que as funções realizadas anteriormente pela CGFOME "foram atribuídas a outras unidades do MRE a fim de se manter a continuidade, sendo as operações de cooperação humanitária assumidas pela Agência Brasileira de Cooperação e as atividades de coordenação política assumidas pela Divisão de Temas Sociais".

A CGFOME foi criada em 2004 como desdobramento do programa Fome Zero, inciativa de 2003 do governo Lula para combater a fome e a miséria no Brasil. O órgão promovia o combate à fome no cenário internacional a partir da experiência brasileira, tratando das ações de cooperação humanitária internacional do governo.

Em junho, o Ministério das Relações Exteriores já havia exonerado o diplomata Milton Rondó Filho, coordenador-geral de Ações Internacionais de Combate à Fome da Secretaria Geral de Relações Exteriores, após ele ter enviado em março uma série de telegramas a embaixadas e representações brasileiras no exterior alertando para a possibilidade de um golpe de Estado no Brasil.

Na época, o Itamaraty afirmou que as mensagens haviam sido enviadas sem autorização superior. Buscado por Opera Mundi na ocasião para esclarecimentos com relação à exoneração de Rondó, a pasta informou que se trata de “substituição natural de um ocupante de cargo em confiança, e da movimentação habitual de membro do Serviço Exterior Brasileiro”.