Mente vazia, oficina do sistema da mídia golpista

Mente vazia, oficina do sistema da mídia golpista

domingo, 4 de novembro de 2012

ENEM: UM EXEMPLO TERRÍVEL PARA SÃO PAULO



Subtrair espaços à exclusão equivale no Brasil a estreitar o horizonte político do conservadorismo. E vice versa.  A  atordoante derrota de Serra em SP credencia a maior cidade do país, uma das três maiores manchas urbanas do planeta, a se tornar uma gigantesca referencia políticas sociais emancipadoras. Os derrotados sabem que uma seta do tempo foi disparada no dia 28 de outubro de 2012; ela tem potencial para traçar  um novo divisor de ciclos na política brasileira.Desdenhar do feito de Lula é uma forma de acusar o golpe. Outra é tentar implodir seu autor e seu entorno.'Veja', os mervais, robertos freires e que tais estão soltos na praça sem focinheira. Estão fazendo as duas coisas ao mesmo tempo. E com o mesmo objetivo: segurar a seta do tempo histórico. O  êxito do Enem nesse momento, uma semana depois da derrota maiúscula do PSDB em casa, não poderia acontecer em hora mais ingrata. Com Haddad e Lula, o exame criado pelos tucanos virou uma porta de entrada de pobres na universidade. Um exemplo terrível de coisas que podem acontecer em SP. (LEIA MAIS AQUI)


Lula e o exorcismo que vem aí



por Luiz Carlos Azenha

Uma capa recente do Estadão resumiu de forma enxuta os caminhos pelos quais a oposição brasileira pode enveredar para tentar interromper aos 12 anos o domínio da coalizão encabeçada pelo PT no governo federal.
De um lado, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso sugeria renovação do discurso do PSDB.
De outro, um novo depoimento de Marcos Valério no qual ele teria citado o nome do ex-presidente Lula:
Valério foi espontaneamente a Brasília em setembro acompanhado de seu advogado Marcelo Leonardo. No novo relato, citou os nomes de Lula e do ex-ministro Antonio Palocci, falou sobre movimentações de dinheiro no exterior e afirmou ter dados sobre o assassinato do ex-prefeito de Santo André Celso Daniel.
Curiosamente, no dia seguinte acompanhei de perto uma conversa entre quatro senhores de meia idade em São Paulo, a capital brasileira do antipetismo, na qual um deles argumentou que Fernando Haddad, do PT, foi eleito novo prefeito da cidade por causa do maior programa de compra de votos já havido na República, o Bolsa Família. Provavelmente leitor da Veja, ele também mencionou entrevista “espírita” dada por Marcos Valério à revista, na qual Lula teria sido apontado como chefe e mentor do mensalão.
Isso me pôs a refletir sobre os caminhos expressos naquelas manchetes que dividiram a capa do Estadão.
Sobre a renovação do discurso do PSDB sugerida pelo ex-presidente FHC, pode até acontecer, mas não terá efeito eleitoral. O PT encampou a social democracia tucana e, aliado ao PMDB, ocupou firmemente o centro que sempre conduziu o projeto de modernização conservadora do Brasil. Ao PSDB, como temos visto em eleições recentes, sobrou o eleitorado de direita, o eleitorado antipetista representado pelos quatro senhores de meia idade e classe média que testemunhei conversando no Pacaembu.
Estimo que o eleitorado antipetista represente cerca de 30% dos votos em São Paulo, capital, talvez o mesmo em outras metrópoles. Ele alimenta e é alimentado pelos grandes grupos de mídia, acredita e reproduz tudo o que escrevem e dizem os colunistas políticos dos grandes jornais e emissoras de rádio e TV. Há, no interior deste grupo de 30% dos eleitores, um núcleo duro dos que militam no antipetismo, escrevendo cartas aos jornais, ‘trabalhando’ nas mídias sociais e participando daquelas manifestações geralmente fracassadas que recebem grande cobertura da mídia do Instituto Millenium.
Este processo de retroalimentação entre a mídia e os militantes do antipetismo é importante, na medida em que permite sugerir a existência de uma opinião pública que reflete a opinião publicada. É por isso que os mascarados de Batman, imitadores de Joaquim Barbosa, aparecem com tanta frequência na capa de jornais; é por isso que os jornais escalam repórteres e fotógrafos para acompanhar os votos de José Dirceu e José Genoíno e geram um clima de linchamento público contra os condenados pelo STF; é por isso que os votos de Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski nas recentes eleições foram usados de forma teatral para refletir a reação da “opinião pública” (de dois ou três, diga-se) ao “mocinho” e ao “bandido” do julgamento do mensalão. Curiosamente, ninguém se interessou em acompanhar os votos de Luiz Fux e Rosa Weber.
O antipetismo é alimentado pelo pensamento binário do nós contra eles, pelo salvacionismo militante segundo o qual do combate às saúvas lulopetistas dependem a Família, a Pátria e a Liberdade.
Criar essa realidade paralela é importante. Em outras circunstâncias históricas, foi ela que permitiu vender a ideia de que um governo popular estava sitiado pela população. Sabe-se hoje, por exemplo, que João Goulart, apeado do poder pelo golpe cívico-militar de 1964 com suporte dos Estados Unidos, tinha apoio de grande parcela da população brasileira, conforme demonstram pesquisas feitas na época pelo Ibope mas nunca divulgadas (por motivos óbvios).
[Ver aqui sobre o apoio a Jango]
Hoje, o mais coerente partido de oposição do Brasil, a mídia controlada por meia dúzia de famílias, forma, dissemina e mede o impacto das opiniões da militância antipetista. O consórcio midiático, no dizer da Carta Maior, produz a norma, abençoa os que se adequam a ela (mais recentemente a ministra Gleisi Hoffmann, que colocou seus interesses particulares de candidata ao governo do Paraná adiante dos do partido ao qual é filiada) e pune com exílio os que julga “inadequados” (o ministro Lewandowski, por exemplo).
Diante deste quadro, o Partido dos Trabalhadores, governando em coalizão, depende periodicamente de vitórias eleitorais como uma espécie de salvo conduto para enfrentar a barulhenta militância antipetista.
Esta sonha com as imagens da prisão de José Dirceu, mas quer mais: o ex-presidente Lula é a verdadeira encarnação do Mal. É a fonte da contaminação do universo político — de onde brotam águas turvas, estelionatos como o Bolsa Família e postes eleitorais que só servem para disseminar o Mal.
O antipetismo é profundamente antidemocrático, uma vez que julga corrompidos ou irracionais os eleitores do PT. Corrompidos pelo “estelionato eleitoral” do Bolsa Família ou incapazes de resistir à retórica demagoga e populista do ex-presidente Lula e seus apaniguados.
A mitificação do poder de Lula, como se emanasse de alguém sobre-humano, é essencial ao antipetismo. Permite afastar o ex-presidente de suas raízes históricas, dos movimentos sociais aos quais diz servir, desconectar Lula de seu papel de agente de transformação social. O truque da desconexão tem serventia dupla: os antipetistas podem posar de defensores do Bem sem responder a perguntas inconvenientes. Quem são? A quem servem? A que classe social pertencem? Qual é seu projeto político? Quais são suas ideias?
A crença de que vencer eleições, em si, será suficiente para diminuir o ímpeto antipetista poderá se revelar o mais profundo erro do próprio PT diante da conjuntura política. O antipetismo não depende de votos para existir ou se propagar. Estamos no campo do simbólico, do quase religioso.
Os quatro senhores do Pacaembu, aos quais aludi acima, estavam tomados por uma indignação quase religiosa contra Lula e o PT. Pareciam fazer parte de uma seita capaz de mobilizar todas as forças, constitucionais ou não, para praticar o exorcismo que é seu objetivo final. Como aconteceu às vésperas do golpe cívico-militar de 64, o que são as leis diante do imperativo moral de livrar a sociedade do Mal?


O script do golpe


Posted by  

Vencidas as inacreditáveis ingenuidade e imprudência de democratas bem-intencionados que chegaram a crer que a direita midiática continuaria aceitando ser contrariada por uma vontade popular que as urnas teimam em expressar eleição após eleição desde o histórico 2002, é chegada a hora de ler o script do golpe – que já não se esconde.
Retrocedamos, pois, ao limiar daquele outono de 1964, quando, já em nome do “combate à corrupção”, os mesmos meios de comunicação evocavam a “ética” contra o governo trabalhista de então, que, tenhamos presente, cometia o “crime” de combater a desigualdade renitente que infecta a nação há 500 anos, só que com muito menos ousadia do que o atual.
No início dos anos 1960, o Coeficiente de Gini, que mede a concentração de renda das nações, em sua versão verde-amarela, já altíssimo, alcançava a marca pornográfica de 0,52 – quanto mais próximo de 1, maior a desigualdade.

Aos trancos e barrancos, no limiar do golpe Jango Goulart retomara, em certa medida, o controle do governo, após tentativas civilizadas de impedir que adotasse medidas contra uma chaga nacional que escandalizava o mundo e mantinha o país agrilhoado ao atraso.
A expressão “reforma agrária” também escandalizava, só que aos detentores do que, à época, tinha muito mais importância do que hoje: a propriedade da terra. E, para colocar lenha na fogueira, os movimentos estudantil e sindical se entregavam, entre um devaneio e outro, ao idílio socialista. E o que é pior: sem fazer maior segredo.
Os arreganhos golpistas, para se venderem à sociedade, não falavam no “direito” dos ricos a concentrarem parcela indecente da renda. A ideia de que o povo estava sendo roubado pelo governo justificaria melhor a conspiração que já germinava nas redações dos donos da “imprensa”.
Era preciso, pois, construir “razões” para justificar o uso da força bruta a fim de obter o que, cada vez mais, ficava evidente que não seria obtido pelas urnas – até porque, na falta de votos, fraudá-las seria impossível estando os “comunistas” no poder, pois são os governos que organizam eleições.
Dez anos antes, a mesma desculpa fora usada para acuar aquele que, heresia das heresias, ousara erigir uma legislação trabalhista que tantos “custos” acarretara ao “pobre” capital.
A história do Brasil, como se vê, é a prova de que a “corrupção” sempre foi o artifício do capital e das elites para manter a esquerda, seu trabalhismo e seu viés distributivista de renda longe do poder de Estado.
A pontuação do coeficiente de Gini, naquele outono de 1964, era pouco maior do que é hoje. Com a ditadura, as coisas foram postas no lugar, ou seja, de 0,52, naquele momento, ao fim da ditadura foi parar em cerca de 0,60, em um processo que tornou o rico mais rico e o pobre, mais pobre.
Entre todas as razões para o golpismo se erguer de novo por estas bandas, portanto, a queda vertiginosa do Gini que marcou os governos Lula e Dilma explica, como nada mais, a volta das acusações de corrupção ao grupo político que, no poder, é responsável por, em dez anos, devolver ao Brasil o que a ditadura levou vinte para lhe roubar – em 2012, o índice é pouco menor do que o de 1964.
No entanto, se as razões de hoje para o golpismo via acusações de corrupção ao governo de turno são as mesmas de há meio século, o script do golpe teve que ser reescrito. Não existe mais o inimigo externo a ameaçar tomar os bens das famílias mais abastadas para entregá-los à ralé preguiçosa, morena e inculta.
Sem a ameaça de tropas vermelhas a marchar sobre a nação, não se justifica mais o uso das forças armadas para golpear a democracia. É por aí que começou a ser construída, em Honduras, uma modalidade de golpe que há pouco se reproduziu no Paraguai de forma mais próxima – porém ainda grosseira – do modelo que se pretende aplicar por aqui.
O golpe “constitucional” de Honduras inaugurou a modalidade, o do Paraguai a refinou um pouco mais, mas ainda não o suficiente para ser usada no Brasil. O ansiedade por retomar o poder naqueles países pecou pelo tempo escandalosamente curto para desenvolver o processo.
No Brasil, com a comunicação de massas, o Judiciário, os militares e boa parte da classe política de acordo, pode-se dar tempo ao tempo, começando a devorar a democracia pelas beiradas.
A aceleração que se está vendo do processo, portanto, deve-se à gota d’água que foram as eleições de 2012, que extirparam aos golpistas contemporâneos qualquer esperança em obter do povo a colaboração eleitoral para recolocá-los no poder.
Pela burrice de que padecem os autoritários, confiaram na “burrice” popular que acreditaria, por exemplo, em uma revista que há dez anos, semana após semana, só enxerga e denuncia corrupção em um único partido, em um único nível de governo. Passada a última surra eleitoral, aplicada bem quando a bomba atômica (o julgamento do mensalão) foi detonada, não há mais esperança.
A condenação ditatorial de José Dirceu, José Genoino e outros petistas menos relevantes não conspurcou nem o PT, nem Lula e muito menos o governo Dilma Rousseff. Acabaram-se as ilusões.
Assim, o golpismo destro-midiático descobriu que o povo simplesmente se recusa a acreditar que o PT inventou a corrupção  no país – premissa contida no fato de petistas serem os primeiros políticos a ser condenados pelo STF após mais de cem anos de história republicana.
Eis que a ingenuidade de Lula e de Dilma, quase inacreditável, foi um presente dos deuses – ou dos demônios – para o golpismo tupiniquim. Lula, um estrategista político como nunca se viu outro no Brasil, nomeou, de olhos fechados, inimigos políticos para o cargo que dá a quem ocupa a prerrogativa de processar até o presidente da República.
Dessa maneira, há poucas dúvidas – se é que existe alguma – de que o doutor Roberto Gurgel aceitará, gostosamente, a denúncia que a oposição faz àquele que responsabiliza por suas derrotas eleitorais, o que ela faz por não entender que o que leva o povo a votar nos que ele indica não são seus belos olhos, mas a distribuição de renda e oportunidades.
Os golpistas mais espertos, então, já sabem que anular Lula será insuficiente enquanto a vida do brasileiro continuar melhorando. Mesmo que consigam fazer o processo dele andar até as eleições de 2014, de forma a chegar lá desmoralizado, a situação do país reelegerá Dilma.
Se mesmo após Lula ter sido inocentado nas investigações sobre o mensalão agora estão conseguindo envolvê-lo com matérias  meramente opinativas de revistas e jornais, o que custará “descobrirem”, antes de agosto – quando Gurgel será substituído –, que a presidente, que integrou o governo anterior, também integrou a “quadrilha”?