Mente vazia, oficina do sistema da mídia golpista

Mente vazia, oficina do sistema da mídia golpista

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Brasil precisa de um Hugo Chávez

Para quem se envolveu emocionalmente com o martírio de milhares de famílias atacadas violentamente pelo Estado brasileiro foi duro ser esbofeteado daquele jeito pela Globo e por seu despachante Geraldo Alckmin ontem (1º de fevereiro) à noite.
Dá para imaginar como aquelas famílias massacradas pelo carrasco que dirige São Paulo a serviço de alguns poucos bilionários se sentiram ao vê-lo expor novamente seu conceito de democracia.
Torna-se imperativa, assim, a reflexão de que se há uma coisa que não existe no Brasil é democracia. Como pode ser democrático que milhares de homens, mulheres, crianças e idosos sejam expulsos de suas casas a toque de bombas em benefício exclusivo de uma empresa privada?
O governador de São Paulo poderia ter tido a decência de dizer que o capitalismo é assim mesmo, um sistema econômico em que, como diz o nome, prevalece o capital em detrimento do homem, e que não tem culpa por o Brasil ter escolhido viver sob tal sistema.
Alckmin confunde regime político com sistema econômico. Na democracia, prevalece a vontade da maioria e no capitalismo, da minoria. Na democracia, quem decide é muita gente e no capitalismo são poucos os que tomam decisões que todos têm que acatar.
O Estado usar tropas para tirar milhares de pessoas de suas casas usando violência e depois jogá-las na rua ou em abrigos imundos a fim de beneficiar um grupo de ricaços que não lota um elevador é mero resultado do capitalismo, não da democracia.
Ah, mas foi apenas cumprimento da lei. Nem isso é verdade: havia conflito entre instâncias do Judiciário (estadual e federal). E se esse Judiciário não é capaz de observar que na democracia não pode atender ao interesse de poucos massacrando a muitos, tampouco é democrático.
É a segunda vez, em curto período, que Alckmin associa democracia a ações violentas da Polícia Militar, mesmo que o principal paradigma do regime democrático seja o de substituir a violência pelo diálogo.
Foi uma bofetada na democracia o Jornal Nacional levar ao ar a invenção absurda de que os moradores do Pinheirinho teriam sido obrigados por lideranças a ficarem ali no dia do despejo. Centenas de flagelados depuseram por escrito, assinaram o depoimento e nenhum relatou semelhante coisa.
De um lado, então, há milhares de pessoas com nome, sobrenome e imagem dizendo que não tentaram resistir por força de liderança alguma, mas porque simplesmente não tinham para onde ir; de outro, há uma gravação de alguém sem nome, sem rosto e que pode até ser falsa.
Há, ainda, um homem sem caráter que diz que antes os flagelados viviam em moradias precárias e que agora vivem em moradias dignas e uma emissora que divulga isso sem reparo algum, sem mostrar que agora é que estão vivendo em moradias precárias, para dizer o mínimo.
Quem defenderá este povo? A mídia inventa, mente, distorce, omite e não há um só político de peso (ao qual não se possa negar espaço) para desmascarar uma farsa que não resiste a trinta segundos de contraditório.
O povo brasileiro, que em grande parte vive em condições pouco melhores do que aquela em que viviam os flagelados do Pinheirinho antes de virarem moradores de rua, está indefeso diante da sanha do capitalismo selvagem.
Este país precisa de um líder feito de carne, osso e sangue nas veias e que seja capaz de se indignar ante aquela vergonha, ante aquele crime de lesa-humanidade que foi a nova aula de “democracia” de Geraldo Alckmin. O Brasil precisa mesmo é de um Hugo Chávez.
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Assista, abaixo, à “aula de democracia” que Geraldo Alckmin deu em 1º de fevereiro de 2012 na concessão pública que transmite o Jornal Nacional.


Mataram os cães das crianças diante delas e foram elogiados


Praticaram todo tipo de violência contra aquele povo. Foram violências físicas e materiais, mas não só. Tanto violências físicas quanto materiais podem ser curadas, se não causam morte. Todavia, há um tipo de violência que a medicina não cura e que o dinheiro não indeniza: a violência que deixa marcas na alma, a violência psicológica.
Não é preciso ser psicólogo para entender os danos que presenciar cenas de guerra pode gerar para o desenvolvimento moral e intelectual de uma criança. Quando aquele pequeno cidadão participa delas, então, a possibilidade de ocorrerem danos irreparáveis em sua personalidade vira quase uma certeza.
Como crescerá aquela criança que viu pai e mãe sendo escorraçados, muitas vezes agredidos, enquanto bombas ensurdecedoras explodiam ao redor? E se a isso acrescentarmos a visão de seu animal de estimação sendo morto a tiros por um suposto representante da lei?
Será que essa criança crescerá com uma ojeriza intrínseca ao conceito de autoridade e com profunda descrença na lei?
E a revolta? O que causará em seu caráter, quando crescer? Poderá crescer com raiva da sociedade? Será que alguma dessas pessoas que adoraram o que fizeram com o povo do Pinheirinho não poderá encontrar uma daquelas crianças já crescida, algum dia no futuro? E será que não poderá, então, conhecer os efeitos que os traumas na infância causam?
Talvez, apenas talvez, passando por tratamento psicológico essa criança traumatizada poderá não vir a desenvolver alguma sociopatia no futuro. Tal possibilidade de eliminar os traumas naquele pequeno cidadão, porém, inexiste quando se trata de uma família muito pobre e de um Estado ausente.
A polícia matar a tiros o cãozinho de uma criança diante dela, obrigá-la a recitar, junto a seus pais e amigos, um refrão humilhante como o de que “O Pinheirinho é da PM”, são algumas das práticas que, segundo relatos que obtive ao entrevistar flagelados, alguns poucos membros da Polícia Militar paulista, em lágrimas, recusaram-se a cometer.
Menos mal para quem ainda quer manter um mínimo de fé na humanidade.
No depósito de gente que visitei na segunda-feira lá em São José dos Campos, enquanto fazia pausa entre uma entrevista e outra alguma coisa me agarrou a perna da calça. Era um garotinho de menos de um metro de altura.
Segundo dedinhos do tamanho de uma tampa de caneta informaram, quando lhe perguntei a idade, tem dois anos. Fala com aquele jeito característico dos bebês, até por ser pouco mais do que um bebê.
A profusão de crianças, segundo mães me disseram, é a principal razão para as famílias terem levado cães e outros animais de estimação para lá. Os laços das crianças com os animais as ajudam a suportar a situação.
De volta ao menininho. A diferença abissal de altura me impedia de ouvir o que balbuciava, de forma que o tomei nos braços, fui até uma mesa, coloquei-o sentadinho sobre ela e me sentei no banco.
Busquei primeiro acarinhá-lo para lhe ganhar a confiança. Cutuquei de leve, com o indicador, a sua barriguinha talvez mais proeminente do que deveria ser – avaliei naquele instante. Um sorriso, então, começou a se formar, deixando ver os dentinhos.
– Sabe que você é muito bonito?
Novo sorriso.
– Você gosta daqui?
O olhar se perde por um instante, mas o sorriso ressurge.
– Como é seu nome?
Não responde, apenas sorri. Então o bracinho se ergue e o dedinho aponta em direção ao muro que nos separa da rua:
– Ó, ó, ó…
– O que é?
– Ó lá…
– O que tem lá?
Ele não responde, o sorriso se desfaz e o olhar volta a se perder. Abaixa os olhos. Tento recuperar o sorriso, mas não volta.
Alguém me quebra o transe perguntando se não quero ir almoçar. Emito um suspiro involuntário, seguro a cabeça do menino com as mãos e lhe beijo a fronte. Depois o abraço. Ficamos assim alguns segundos. Sua cabeça recostada no meu ombro, ele silente e inerte.
Novo suspiro e o ponho no chão, tomando cuidado para não fazê-lo deixar cair a caixinha de papelão que manteve o tempo todo na mão, na qual se lê, em letras vermelhas e estilizadas,  “Toddynho”.
Mal o garotinho toca o chão, ele vira as costas e sai correndo.
Especulei sobre o que quis dizer quando apontou para fora do “abrigo”, mas não farei ilações. O leitor que reflita sobre o que poderia ser ou se não era nada, ainda que não tenha sido o que me pareceu…
Durante a incursão no “abrigo”, testemunhei fatos como os que foram parar no documento que o governo federal divulgou ontem, quais sejam, de que nesses locais faltam condições de higiene, alimentação adequada e atendimento médico.
Um dos problemas identificados pela força-tarefa que foi àquela cidade levantar denúncias de violações de direitos humanos é o de que a presença de animais domésticos junto às famílias pode estar gerando a disseminação de doenças de pele, o que pode explicar as feridas nos braços daquele garotinho.
Também parece relevante relatar que percebi os animais prostrados. Poucos caminham, nenhum late. Nem com a presença de estranhos ou com as crianças mexendo com eles.
Também percebi, em vários pontos do abrigo, diferentes crianças rondando e tentando brincar com um mesmo animal. Lembrei-me disso ao ler, no documento de denúncia do governo federal, relatos como os que eu mesmo fiz em mais de uma das fichas de denúncia que preenchi, de que a polícia teria matado animais domésticos das crianças diante delas.
Hoje, leio artigo do senador tucano por São Paulo, Aloysio Nunes Ferreira, na Folha de São Paulo. Trata-se de um texto primário, protocolar, que só pode fazer sentido para quem não viu cena alguma do que aconteceu e continua acontecendo em São José dos Campos.
Na verdade, só quem não foi até lá, não conversou com aquele povo, não viu as condições em que está, tanto do ponto de vista psicológico quanto fisicamente, pode escrever uma coisa como aquela. Ou, então, só quem não tem um pingo de caráter.
Posso garantir que já há provas materiais de que muito do que se diz ali é mentira, e há indícios fortes – muitos dos quais ainda virão a luz – de que a outra parte do texto que ainda não pode ser desmascarada com facilidade, é mentira ou desinformação.
Haverá tempo para desmascarar as mentiras. E serão desmascaradas. Percebo que há um sentimento forte na sociedade de que aquilo não pode ficar impune justamente para que não se cumpra a profecia que fizeram as autoridades de São José dos Campos, de que o ataque ao Pinheirinho servirá de “exemplo”.
Enquanto as mentiras não forem totalmente desmascaradas, a sociedade terá que lidar com a indignação que dá ver soldados que mataram animais de estimação diante de crianças sendo elogiados pelas autoridades paulistas. Por isso voltarei a São José dos Campos, para ajudar a desmascarar essa farsa.
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Assista a matéria da TV do PT sobre o que a força-tarefa do Condepe apurou em São José dos Campos


A ditabranda de Yoany Sanchez

A mídia autóctone anda muito interessada em dois assuntos para os quais não costuma dar bola: blogueiros e direitos humanos. Só que não é aqui, mas em Cuba. Enquanto isso, no Brasil, detrata blogueiros e relativiza direitos humanos.
A blogueira cubana Yoany Sanchez é a contemplada por esse apreço inédito da mídia brasileira por ser a maior detratora individual do regime cubano em todo o mundo. Ninguém fala tão mal de Cuba quanto ela, que produz música para os ouvidos dos barões midiáticos.
Yoany, porém, é uma farsa, uma construção anticastrista que se dedica a inventar histórias sobre “violações de direitos humanos” em Cuba, como fez recentemente no caso do dissidente Wilman Villar Mendoza, que faleceu em Santiago de Cuba no mês passado.
A história da blogueira foi a de que Mendoza faleceu devido a uma greve de fome de 56 dias. Ela acusou o governo de seu país por sua morte dizendo-o “negligente”, provavelmente por não ter renunciado para atender às exigências do dissidente.
A verdadeira história, porém, é outra. Mendoza foi preso no fim de 2011 por ter agredido a esposa e quem o denunciou à polícia foi a própria sogra. Preso, teve complicações de saúde e faleceu.
Todavia, a mídia brasileira comprou integralmente a invenção de Yoany. E após o desmentido da família do sujeito de que ele fizera greve de fome, escondeu o fato do público.
As farsas da blogueira cubana são reiteradamente compradas pelos interessados estrangeiros. Como essa, agora, de que quer vir ao Brasil.
A mídia brasileira vende a história de uma revolucionária que luta contra uma ditadura cruel sob condições adversas, mas os fatos mostram que o regime cubano tem sido um pai para sua detratora. A história de Yoany não se encaixa no perfil que inventou.
Yoani María Sánchez Cordero é cubana de Havana, graduada em Filologia em universidade cubana desde 2000, segundo consta em seu blog. Dois anos depois de se formar às custas do erário cubano, casou-se com um alemão e foi viver na Suíça, não tendo tido qualquer dificuldade para emigrar.
Em 2004 decide voltar ao país, tornando-se o primeiro caso de alguém que fugiu de uma ditadura para dentro em vez de fugir para fora.
Se fôssemos tomar por base as condições de vida de Yoany na ditadura cubana, no entanto, concluiríamos que se trata de uma ditabranda.
Para comprovar isso, basta ver o escritório da blogueira na foto acima ou dar uma olhada na cena abaixo, em que ela aparece usando a internet sem fio de um dos hotéis mais luxuosos de Havana para falar mal de seu país em seu blog.

Ora, mas por que Yoany voltou à terrível ditadura Cubana? Porque gosta de sofrer?
A história que o governo cubano conta é bem outra. Na Suíça, a dissidente teria tido enormes dificuldades para encontrar trabalho e viver decentemente. Assim, desesperada, decidiu voltar ao seu país natal, onde teria casa, comida, tudo de graça.
Em Cuba, Yoany progrediu. Leva hoje uma vida confortável e não se sabe de onde vêm os recursos financeiros que lhe permitem morar como mora e gastar dinheiro na caríssima rede hoteleira do país.
Tampouco se sabe como é possível que em uma ditadura como a que pinta consiga falar ao mundo sem sofrer qualquer represália, ainda que faça denúncias vazias como em 2009, quando afirmou que sofreu violências por parte das “forças da ordem cubanas”.
Em 6 de novembro daquele ano, Yoany disse em seu blog que foi sequestrada pelo governo por 25 minutos e que sofreu “golpes e empurrões”, que colocaram um “joelho sobre o seu peito”, que a golpearam “nos rins e na cabeça” e que estava cheia de “marcas roxas”.
Três dias depois, no entanto, a terrível ditadura cubana permitiu àquela que sequestrara receber a imprensa internacional para denunciar o que lhe havia feito. Yoany só não esperava que essa imprensa, supostamente hostil a Cuba, pedisse para ver as tais marcas. Resumindo: não havia marca alguma.
A imprensa brasileira abafou, mas o caso é mundialmente conhecido graças ao jornalista francês Salim Lamranium, que conseguiu entrevistar Yoany. Foi um massacre, por assim dizer. Confira, abaixo, a entrevista.
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Entrevista com Yoany Sanches
Por Salim Lamranium, no Rebelión
O encontro com a jovem dissidente de fama controvertida não ocorreu em algum apartamento escuro, com as janelas fechadas, ou em um lugar isolado e recluso para escapar aos ouvidos indiscretos da “polícia política”. Ao contrário, aconteceu no saguão do Hotel Plaza, no centro de Havana Velha, em uma tarde inundada de sol.
O local estava bem movimentado, com numerosos turistas estrangeiros que perambulavam pelo imenso salão do edifício majestoso que abriu suas portas no início do século XX.
Yoani Sánchez vive perto das embaixadas ocidentais. De fato, uma simples chamada de meu contato ao meio-dia permitiu que combinássemos o encontro para três horas depois. Às 15h, a blogueira apareceu sorridente, vestida com uma saia longa e uma camiseta azul. Também usava uma jaqueta esportiva, para amenizar o relativo frescor do inverno havanês.
Foram cerca de duas horas de conversa ao redor de uma mesa do bar do hotel, com a presença de seu marido, Reinaldo Escobar, que a acompanhou durante uns vinte minutos antes de sair para outro encontro.
Yoani Sánchez mostrou-se extremamente cordial e afável e exibiu grande tranquilidade. Seu tom de voz era seguro e em nenhum momento ela pareceu incomodada. Acostumada aos meios ocidentais, domina relativamente bem a arte da comunicação.
Esta blogueira, personagem de aparência frágil, inteligente e sagaz, tem consciência de que, embora lhe seja difícil admitir, sua midiatização no Ocidente não é uma causalidade, mas se deve ao fato de ela preconizar a instauração de um “capitalismo sui generis” em Cuba.
A entrevista
Salim Lamrani – Comecemos pelo incidente ocorrido em 6 de novembro de 2009 em Havana. Em seu blog, a senhora explicou que foi presa com três amigos por “três robustos desconhecidos” durante uma “tarde carregada de pancadas, gritos e insultos”. A senhora denunciou as violências de que foi vítima por parte das forças da ordem cubanas. Confirma sua versão dos fatos?
Yoani Sánchez – Efetivamente, confirmo que sofri violência. Mantiveram-me sequestrada por 25 minutos. Levei pancadas. Consegui pegar um papel que um deles levava no bolso e o coloquei em minha boca. Um deles pôs o joelho sobre meu peito e o outro, no assento dianteiro, me batia na região dos rins e golpeava minha cabeça para que eu abrisse a boca e soltasse o papel. Por um momento, achei que nunca sairia daquele carro.
SL – O relato, em seu blog, é verdadeiramente terrorífico. Cito textualmente: a senhora falou de “golpes e empurrões”, de “golpes nos nós dos dedos”, de “enxurrada de golpes”, do “joelho sobre o [seu] peito”, dos golpes nos “rins e [...] na cabeça”, do “cabelo puxado”, de seu “rosto avermelhado pela pressão e o corpo dolorido”, dos “golpes [que] continuavam vindo” e “todas essas marcas roxas”. No entanto, quando a senhora recebeu a imprensa internacional em 9 de novembro, todas as marcas haviam desaparecido. Como explica isso?
YS – São profissionais do espancamento.
SL – Certo, mas por que a senhora não tirou fotos das marcas?
YS – Tenho as fotos. Tenho provas fotográficas.
SL – Tem provas fotográficas?
YS – Tenho as provas fotográficas.
SL – Mas por que não as publicou para desmentir todos os rumores segundo os quais a senhora havia inventado uma agressão para que a imprensa falasse de seu caso?
YS – Por enquanto prefiro guardá-las e não publicá-las. Quero apresentá-las um dia perante um tribunal, para que esses três homens sejam julgados. Lembro-me perfeitamente de seus rostos e tenho fotos de pelo menos dois deles.
Quanto ao terceiro, ainda não está identificado, mas, como se tratava do chefe, será fácil de encontrar. Tenho também o papel que tirei de um deles e que tem minha saliva, pois o coloquei na boca. Neste papel estava escrito o nome de uma mulher.
NOTA DO EDITOR: os fatos que a blogueira denunciou teriam ocorrido em 2009. Até hoje, as fotos dos ferimentos que afirmou ter sofrido e que prometeu que divulgaria um dia, jamais apareceram.
SL – Certo. A senhora publica muitas fotos em seu blog. Para nós é difícil entender por que prefere não mostrar as marcas desta vez.
YS – Como já lhe disse, prefiro guardá-las para a Justiça.
SL – A senhora entende que, com essa atitude, está dando crédito aos que pensam que a agressão foi uma invenção.
YS – É minha escolha.
SL – No entanto, até mesmo os meios ocidentais que lhe são mais favoráveis tomaram precauções oratórias pouco habituais para divulgar seu relato. O correspondente da BBC em Havana, Fernando Ravsberg, por exemplo, escreve que a senhora “não tem hematomas, marcas ou cicatrizes”. A agência France Presseconta a história esclarecendo com muito cuidado que se trata de sua versão, sob o título “Cuba: a blogueira Yoani Sánchez diz ter sido agredida e detida brevemente”. O jornalista afirma, por outro lado, que a senhora “não ficou ferida”.
YS – Não quero avaliar o trabalho deles. Não sou eu quem deve julgá-lo. São profissionais que passam por situações muito complicadas, que não posso avaliar. O certo é que a existência ou não de marcas físicas não é a prova do fato.
SL – Mas a presença de marcas demonstraria que foram cometidas violências. Daí a importância da publicação das fotos.
YS – O senhor deve entender que tratamos de profissionais da intimidação. O fato de três desconhecidos terem me levado até um carro sem me apresentar nenhum documento me dá o direito de me queixar como se tivessem fraturado todos os ossos do corpo. As fotos não são importantes porque a ilegalidade está consumada. A precisão de que “me doeu aqui ou me doeu ali” é minha dor interior.
SL – Sim, mas o problema é que a senhora apresentou isso como uma agressão muito violenta. A senhora falou de “sequestro no pior estilo da Camorra siciliana”.
YS – Sim, é verdade, mas sei que é minha palavra contra a deles. Entrar nesse tipo de detalhes, para saber se tenho marcas ou não, nos afasta do tema verdadeiro, que é o fato de terem me sequestrado durante 25 minutos de maneira ilegal.
SL – Perdoe-me a insistência, mas creio que é importante. Há uma diferença entre um controle de identidade que dura 25 minutos e violências policiais. Minha pergunta é simples. A senhora disse, textualmente: “Durante todo o fim de semana fiquei com a maçã do rosto e o supercílio inflamados.” Como tem as fotos, pode agora mostrar as marcas.
YS – Já lhe disse que prefiro guardá-las para o tribunal.
SL – A senhora entende que, para algumas pessoas, será difícil acreditar em sua versão se a senhora não publicar as fotos.
YS – Penso que, entrando nesse tipo de detalhes, perde-se a essência. A essência é que três bloggers acompanhados por uma amiga dirigiam-se a um ponto da cidade que era a Rua 23, esquina G. Tínhamos ouvido falar que um grupo de jovens convocara uma passeata contra a violência. Pessoas alternativas, cantores de hip hop, de rap, artistas. Eu compareceria como blogueira para tirar fotos e publicá-las em meu blog e fazer entrevistas. No caminho, fomos interceptados por um carro da marca Geely.
SL – Para impedi-los de participar do evento?
YS – A razão, evidentemente, era esta. Eles nunca me disseram formalmente, mas era o objetivo. Disseram-me que entrasse no carro. Perguntei quem eles eram. Um deles me pegou pelo pulso e comecei a ir para trás. Isso aconteceu em uma zona bastante central de Havana, em um ponto de ônibus.
SL – Então havia outras pessoas. Havia testemunhas.
YS – Há testemunhas, mas não querem falar. Têm medo.
SL – Nem mesmo de modo anônimo? Por que a imprensa ocidental não as entrevistou preservando seu anonimato, como faz muitas vezes quando publica reportagens críticas sobre Cuba?
YS – Não posso lhe explicar a reação da imprensa. Posso lhe contar o que aconteceu. Um deles era um homem de uns cinquenta anos, musculoso como se tivesse praticado luta livre em algum momento da vida. Digo-lhe isso porque meu pai praticou esse esporte e tem as mesmas características. Tenho os pulsos muito finos e consegui escapar, e lhe perguntei quem era. Havia três homens além do motorista.
SL – Então havia quatro homens no total, e não três.
YS – Sim, mas não vi o rosto do motorista. Disseram-me: “Yoani, entre no carro, você sabe quem somos.” Respondi: “Não sei quem são os senhores.” O mais baixo me disse: “Escute-me, voce sabe quem sou, você me conhece.” Retruquei: “Não, não sei quem é você. Não o conheço. Quem é você? Mostre-me suas credenciais ou algum documento.” O outro me disse: “Entre, não torne as coisas mais difíceis.” Então comecei a gritar: “Socorro! Sequestradores! “
SL – A senhora sabia que se tratava de policiais à paisana?
YS – Imaginava, mas eles não me mostraram seus documentos.
SL – Qual era seu objetivo, então?
YS – Queria que as coisas fossem feitas dentro da legalidade, ou seja, que me mostrassem seus documentos e me levassem depois, embora eu suspeitasse que eles representavam a autoridade. Ninguém pode obrigar um cidadão a entrar em um carro particular sem apresentar suas credenciais. Isso é uma ilegalidade e um sequestro.
SL – Como as pessoas no ponto de ônibus reagiram?
YS – As pessoas no ponto ficaram atônitas, pois “sequestro” não é uma palavra que se usa em Cuba, não existe esse fenômeno. Então se perguntaram o que estava acontecendo. Não tínhamos jeito de delinquentes. Alguns se aproximaram, mas um dos policiais lhes gritou: “Não se metam, que são contrarrevolucioná rios!”
Esta foi a confirmação de que se tratava de membros da polícia política, embora eu já imaginasse por causa do carro Geely, que é chinês, de fabricação atual, e não é vendido em nenhuma loja em Cuba. Esses carros pertencem exclusivamente a membros do Ministério das Forças Armadas e do Ministério do Interior.
SL – Então a senhora sabia desde o início, pelo carro, que se tratava de policiais à paisana.
YS – Intuía. Por outro lado, tive a confirmação quando um deles chamou um policial uniformizado. Uma patrulha formada por um homem e uma mulher chegou e levou dois de nós. Deixou-nos nas mãos desses dois desconhecidos.
SL – Mas a senhora já não tinha a menor dúvida sobre quem eles eram.
YS – Não, mas não nos mostraram nenhum documento. Os policiais não nos disseram que representavam a autoridade. Não nos disseram nada.
SL – É difícil entender o interesse das autoridades cubanas em agredi-la fisicamente, sob o risco de provocar um escândalo internacional. A senhora é famosa. Por que teriam feito isso?
YS – Seu objetivo era radicalizar- me, para que eu escrevesse textos violentos contra eles. Mas não conseguirão.
SL – Não se pode dizer que a senhora é branda com o governo cubano.
YS -Nunca recorro à violência verbal nem a ataques pessoais. Nunca uso adjetivos incendiários, como “sangrenta repressão”, por exemplo. Seu objetivo, então, era radicalizar- me.
SL – No entanto, a senhora é muito dura em relação ao governo de Havana. Em seu blog, a senhora diz: “o barco que faz água a ponto de naufragar”. A senhora fala dos “gritos do déspota”, de “seres das sombras, que, como vampiros, se alimentam de nossa alegria humana, nos incutem o medo por meio da agressão, da ameaça, da chantagem”, e afirma que “naufragaram o processo, o sistema, as expectativas, as ilusões. [É um] naufráfio [total]“. São palavras muito fortes.
YS – Talvez, mas o objetivo deles era queimar o fenômeno Yoani Sánchez, demonizar-me. Por isso meu blog permaneceu bloqueado por um bom tempo.
SL – Contudo, é surpreendente que as autoridades cubanas tenham decidido atacá-la fisicamente.
YS – Foi uma torpeza. Não entendo por que me impediram de assistir à passeata, pois não penso como aqueles que reprimem. Não tenho explicação. Talvez eles não quisessem que eu me reunisse com os jovens. Os policiais acreditavam que eu iria provocar um escândalo ou fazer um discurso incendiário.
Voltando ao assunto da detenção, os policiais levaram meus amigos de maneira enérgica e firme, mas sem violência. No momento em que me dei conta de que iriam nos deixar sozinhos com Orlando, com esses três tipos, agarrei-me a uma planta que havia na rua e Claudia agarrou-se a mim pela cintura para impedir a separação, antes de os policiais a levarem.
SL – Para que resistir às forças da ordem uniformizadas e correr o risco de ser acusada disso e cometer um delito? Na França, se resistimos à polícia, corremos o risco de sofrer sanções.
YS – De qualquer modo, eles nos levaram. A policial levou Claudia. As três pessoas nos levaram até o carro e comecei a gritar de novo: “Socorro! Um sequestro!”
SL – Por quê? A senhora sabia que se tratava de policiais à paisana.
YS – Não me mostraram nenhum papel. Então começaram a me bater e me empurraram em direção ao carro. Claudia foi testemunha e relatou isso.
SL – A senhora não acaba de me dizer que a patrulha a havia levado?
YS – Ela viu a cena de longe, enquanto o carro de polícia se afastava. Defendi-me e golpeei como um animal que sente que sua hora chegou. Deram uma volta rápida e tentaram tirar-me o papel da boca.
Agarrei um deles pelos testículos e ele redobrou a violência. Levaram-nos a um bairro bem periférico, La Timba, que fica perto da Praça da Revolução. O homem desceu, abriu a porta e pediu que saíssemos. Eu não quis descer. Eles nos fizeram sair à força com Orlando e foram embora.
Uma senhora chegou e dissemos que havíamos sido sequestrados. Ela nos achou malucos e se foi. O carro voltou, mas não parou. Eles só me jogaram minha bolsa, onde estavam meu celular e minha câmera.
SL – Voltaram para devolver seu celular e sua câmera?
YS – Sim.
SL – Não lhe parece estranho que se preocupassem em voltar? Poderiam ter confiscado seu celular e sua câmera, que são suas ferramentas de trabalho.
YS – Bem, não sei. Tudo durou 25 minutos.
SL – Mas a senhora entende que, enquanto não publicar as fotos, as pessoas duvidarão de sua versão, e isso lançará uma sombra sobre a credibilidade de tudo o que a senhora diz.
YS – Não importa.
A Suíça e o retorno a Cuba
SL – Em 2002, a senhora decidiu emigrar para a Suíça. Dois anos depois, voltou a Cuba. É difícil entender por que a senhora deixou o “paraíso europeu” para regressar ao país que descreve como um inferno. A pergunta é simples: por quê?
YS – É uma ótima pergunta. Primeiro, gosto de nadar contra a corrente. Gosto de organizar minha vida à minha maneira. O absurdo não é ir embora e voltar a Cuba, e sim as leis migratórias cubanas, que estipulam que toda pessoa que passa onze meses no exterior perde seu status de residente permanente.
Em outras condições eu poderia permanecer dois anos no exterior e, com o dinheiro ganho, voltar a Cuba para reformar a casa e fazer outras coisas. Então o surpreendente não é o fato de eu decidir voltar a Cuba, e sim as leis migratórias cubanas.
SL – O mais surpreendente é que, tendo a possibilidade de viver em um dos países mais ricos do mundo, a senhora tenha decidido voltar a seu país, que descreve de modo apocalíptico, apenas dois anos depois de sua saída.
YS – As razões são várias. Primeiro, não pude ir embora com minha família. Somos uma pequena família, mas minha irmã, meus pais e eu somos muito unidos. Meu pai ficou doente em minha ausência e tive medo de que ele morresse sem que eu pudesse vê-lo. Também me sentia culpada por viver melhor do que eles. A cada vez que comprava um par de sapatos, que me conectava à internet, pensava neles. Sentia-me culpada.
SL – Certo, mas, da Suíça, a senhora podia ajudá-los enviando dinheiro.
YS – É verdade, mas há outro motivo. Pensei que, com o que havia aprendido na Suíça, poderia mudar as coisas voltando a Cuba. Há também a saudade das pessoas, dos amigos. Não foi uma decisão pensada, mas não me arrependo.
Tinha vontade de voltar e voltei. É verdade que isso pode parecer pouco comum, mas gosto de fazer coisas incomuns. Criei um blog e as pessoas me perguntaram por que eu fiz isso, mas o blog me satisfaz profissionalmente.
SL – Entendo. No entanto, apesar de todas essas razões, é difícil entender o motivo de seu regresso a Cuba quando no Ocidente se acredita que todos os cubanos querem abandonar o país. É ainda mais surpreendente em seu caso, pois a senhora apresenta seu país, repito, de modo apocalíptico.
YS – Como filóloga, eu discutiria a palavra, pois “apocalíptico” é um termo grandiloquente. Há um aspecto que caracteriza meu blog: a moderação verbal.
SL – Não é sempre assim. A senhora, por exemplo, descreve Cuba como “uma imensa prisão, com muros ideológicos”. Os termos são bastantes fortes.
YS – Nunca escrevi isso.
SL – São as palavras de uma entrevista concedida ao canal francês France 24 em 22 de outubro de 2009.
YS – O senhor leu isso em francês ou em espanhol?
SL – Em francês.
YS – Desconfie das traduções, pois eu nunca disse isso. Com frequência me atribuem coisas que eu não disse. Por exemplo, o jornal espanhol ABC me atribuiu palavras que eu nunca havia pronunciado, e protestei. O artigo foi finalmente retirado do site na internet.
SL – Quais eram essas palavras?
YS – “Nos hospitais cubanos, morre mais gente de fome do que de enfermidades. ” Era uma mentira total. Eu jamais havia dito isso.
SL – Então a imprensa ocidental manipulou o que a senhora disse?
YS – Eu não diria isso.
SL – Se lhe atribuem palavras que a senhora não pronunciou, trata-se de manipulação.
YS – O Granma manipula a realidade mais do que a imprensa ocidental ao afirmar que sou uma criação do grupo midiático Prisa.
SL – Justamente, a senhora não tem a impressão de que a imprensa ocidental a usa porque a senhora preconiza um “capitalismo sui generis” em Cuba?
YS – Não sou responsável pelo que a imprensa faz. Meu blog é uma terapia pessoal, um exorcismo. Tenho a impressão de que sou mais manipulada em meu próprio país do que em outra parte. O senhor sabe que existe uma lei em Cuba, a lei 88, chamada lei da “mordaça”, que põe na cadeia as pessoas que fazem o que estamos fazendo.
SL – O que isso quer dizer?
YS – Que nossa conversa pode ser considerada um delito, que pode ser punido com uma pena de até 15 anos de prisão.
SL – Perdoe-me, o fato de eu entrevistá-la pode levá-la para a cadeia?
YS – É claro!
SL – Não tenho a impressão de que isso a preocupe muito, pois a senhora está me concedendo uma entrevista em plena tarde, no saguão de um hotel no centro de Havana Velha.
YS – Não estou preocupada. Esta lei estipula que toda pessoa que denuncie as violações dos direitos humanos em Cuba colabora com as sanções econômicas, pois Washington justifica a imposição das sanções contra Cuba pela violação dos direitos humanos.
SL – Se não me engano, a lei 88 foi aprovada em 1996 para responder à Lei-Helms Burton e sanciona sobretudo as pessoas que colaboram com a aplicação desta legislação em Cuba, por exemplo fornecendo informações a Washington sobre os investidores estrangeiros no país, para que estes sejam perseguidos pelos tribunais norte-americanos. Que eu saiba, ninguém até agora foi condenado por isso.
Falemos de liberdade de expressão. A senhora goza de certa liberdade de tom em seu blog. Está sendo entrevistada em plena tarde em um hotel. Não vê uma contradição entre o fato de afirmar que não há nenhuma liberdade de expressão em Cuba e a realidade de seus escritos e suas atividades, que provam o contrário?
YS – Sim, mas o blog não pode ser acessado desde Cuba, porque está bloqueado.
SL – Posso lhe assegurar que o consultei esta manhã antes da entrevista, no hotel.
YS – É possível, mas ele permanece bloqueado a maior parte do tempo. De todo modo, hoje em dia, mesmo sendo uma pessoa moderada, não posso ter nenhum espaço na imprensa cubana, nem no rádio, nem na televisão.
SL – Mas pode publicar o que tem vontade em seu blog.
YS – Mas não posso publicar uma única palavra na imprensa cubana.
SL – Na França, que é uma democracia, amplos setores da população não têm nenhum espaço nos meios, já que a maioria pertence a grupos econômicos e financeiros privados.
YS – Sim, mas é diferente.
SL – A senhora recebeu ameaças por suas atividades? Alguma vez a ameaçaram com uma pena de prisão pelo que escreve?
YS – Ameaças diretas de pena de prisão, não, mas não me deixam viajar ao exterior. Fui convidada há pouco para um Congresso sobre a língua espanhola no Chile, fiz todos os trâmites, mas não me deixam sair.
SL – Deram-lhe alguma explicação?
YS – Nenhuma, mas quero dizer uma coisa. Para mim, as sanções dos Estados Unidos contra Cuba são uma atrocidade. Trata-se de uma política que fracassou. Afirmei isso muitas vezes, mas não se publica, pois é incômodo o fato de eu ter esta opinião que rompe com o arquétipo do opositor.
As sanções econômicas
SL – Então a senhora se opõe às sanções econômicas.
YS – Absolutamente, e digo isso em todas as entrevistas. Há algumas semanas, enviei uma carta ao Senado dos Estados Unidos pedindo que os cidadãos norte-americanos tivessem permissão para viajar a Cuba. É uma atrocidade impedir que os cidadãos norte-americanos viajem a Cuba, do mesmo modo que o governo cubano me impede de sair de meu país.
SL – O que acha das esperanças suscitadas pela eleição de Obama, que prometeu uma mudança na política para Cuba, mas decepcionou muita gente?
YS – Ele chegou ao poder sem o apoio do lobby fundamentalista de Miami, que defendeu o outro candidato. De minha parte, já me pronunciei contra as sanções.
SL – Este lobby fundamentalista é contra a suspensão das sanções econômicas.
YS – O senhor pode discutir com eles e lhes expor meus argumentos, mas eu não diria que são inimigos da pátria. Não penso assim.
SL – Uma parte deles participou da invasão de seu próprio país em 1961, sob as ordens da CIA. Vários estão envolvidos em atos de terrorismo contra Cuba.
YS – Os cubanos no exílio têm o direito de pensar e decidir. Sou a favor de que eles tenham direito ao voto. Aqui, estigmatizou- se muito o exílio cubano.
SL – O exílio “histórico” ou os que emigraram depois, por razões econômicas?
YS – Na verdade, oponho-me a todos os extremos. Mas essas pessoas que defendem as sanções econômicas não são anticubanas. Considere que elas defendem Cuba segundo seus próprios critérios.
SL – Talvez, mas as sanções econômicas afetam os setores mais vulneráveis da população cubana, e não os dirigentes. Por isso é difícil ser a favor das sanções e, ao mesmo tempo, querer defender o bem-estar dos cubanos.
YS – É a opinião deles. É assim.
SL – Eles não são ingênuos. Sabem que os cubanos sofrem com as sanções.
YS – São simplesmente diferentes. Acreditam que poderão mudar o regime impondo sanções. Em todo caso, creio que o bloqueio tem sido o argumento perfeito para o governo cubano manter a intolerância, o controle e a repressão interna.
SL – As sanções econômicas têm efeitos. Ou a senhora acha que são apenas uma desculpa para Havana?
YS – São uma desculpa que leva à repressão.
SL – Afetam o país de um ponto de vista econômico, para a senhora? Ou é apenas um efeito marginal?
YS – O verdadeiro problema é a falta de produtividade em Cuba. Se amanhã suspendessem as sanções, duvido muito que víssemos os efeitos.
SL – Neste caso, por que os Estados Unidos não suspendem as sanções, tirando assim a desculpa do governo? Assim perceberíamos que as dificuldades econômicas devem-se apenas às políticas internas. Se Washington insiste tanto nas sanções apesar de seu caráter anacrônico, apesar da oposição da imensa maioria da comunidade internacional, 187 países em 2009, apesar da oposição de uma maioria da opinião pública dos Estados Unidos, apesar da oposição do mundo dos negócios, deve ser por algum motivo, não?
YS – Simplesmente porque Obama não é o ditador dos Estados Unidos e não pode eliminar as sanções.
SL – Ele não pode eliminá-las totalmente porque não há um acordo no Congresso, mas pode aliviá-las consideravelmente, o que não fez até agora, já que, salvo a eliminação das sanções impostas por Bush em 2004, quase nada mudou.
YS – Não, não é verdade, pois ele também permitiu que as empresas de telecomunicaçõ es norte-americanas fizessem transações com Cuba.
Os prêmios internacionais, o blog e Barack Obama
SL – A senhora terá de admitir que é bem pouco, quando se sabe que Obama prometeu um novo enfoque para Cuba. Voltemos a seu caso pessoal. Como explica esta avalanche de prêmios, assim como seu sucesso internacional?
YS – Não tenho muito a dizer, a não ser expressar minha gratidão. Todo prêmio implica uma dose de subjetividade por parte do jurado. Todo prêmio é discutível. Por exemplo, muitos escritores latino-americanos mereciam o Prêmio Nobel de Literatura mais que Gabriel García Márquez.
SL – A senhora afirma isso porque acredita que ele não tem tanto talento ou por sua posição favorável à Revolução cubana? A senhora não nega seu talento de escritor, ou nega?
YS – É minha opinião, mas não direi que ele obteve o prêmio por esse motivo nem vou acusá-lo de ser um agente do governo sueco.
SL – Ele obteve o prêmio por sua obra literária, enquanto a senhora foi recompensada por suas posições políticas contra o governo. É a impressão que temos.
YS – Falemos do prêmio Ortega y Gasset, do jornal El País, que suscita mais polêmica. Venci na categoria “Internet”. Alguns dizem que outros jornalistas não conseguiram, mas sou uma blogueira e sou pioneira neste campo. Considero-me uma personagem da internet. O júri do prêmio Ortega y Gasset é formado por personalidades extremamente prestigiadas e eu não diria que elas se prestaram a uma conspiração contra Cuba.
SL – A senhora não pode negar que o jornal espanhol El Paístem uma linha editorial totalmente hostil a Cuba. E alguns acham que o prêmio, de 15.000 euros, foi uma forma de recompensar seus escritos contra o governo.
YS – As pessoas pensam o que querem. Acredito que meu trabalho foi recompensado. Meu blog tem 10 milhões de visitas por mês. É um furacão.
SL – Como a senhora faz para pagar os gastos com a administração de semelhante tráfego?
YS – Um amigo na Alemanha se encarregava disso, pois o site estava hospedado na Alemanha. Há mais de um ano está hospedado na Espanha, e consegui 18 meses gratuitos graças ao prêmio The Bob’s.
SL – E a tradução para 18 línguas?
YS – São amigos e admiradores que o fazem voluntária e gratuitamente.
SL – Muitas pessoas acham difícil acreditar nisso, pois nenhum outro site do mundo, nem mesmo os das mais importantes instituições internacionais, como as Nações Unidas, o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional, a OCDE, a União Europeia, dispõe de tantas versões de idioma. Nem o site do Departamento de Estado dos EUA, nem o da CIA contam com semelhante variedade.
YS – Digo-lhe a verdade.
SL – O presidente Obama inclusive respondeu a uma entrevista que a senhora fez. Como explica isso?
YS – Em primeiro lugar, quero dizer que não eram perguntas complacentes.
SL – Tampouco podemos afirmar que a senhora foi crítica, já que não pediu que ele suspendesse as sanções econômicas, sobre as quais a senhora diz que “são usadas como justificativa tanto para o descalabro produtivo quanto para reprimir os que pensam diferente”. É exatamente o que diz Washington sobre o tema.
O momento de maior atrevimento foi quando a senhora perguntou se ele pensava em invadir Cuba. Como a senhora explica que o presidente Obama tenha dedicado tempo a lhe responder apesar de sua agenda extremamente carregada, com uma crise econômica sem precedentes, a reforma do sistema de saúde, o Iraque, o Afeganistão, as bases militares na Colômbia, o golpe de Estado em Honduras e centenas de pedidos de entrevista dos mais importantes meios do mundo à espera?
YS – Tenho sorte. Quero lhe dizer que também enviei perguntas ao presidente Raúl Castro e ele não me respondeu. Não perco a esperança. Além disso, ele agora tem a vantagem de contar com as respostas de Obama.
SL – Como a senhora chegou até Obama?
YS – Transmiti as perguntas a várias pessoas que vinham me visitar e poderiam ter um contato com ele.
SL – Em sua opinião, Obama respondeu porque a senhora é uma blogueira cubana ou porque se opõe ao governo?
YS – Não creio. Obama respondeu porque fala com os cidadãos.
SL – Ele recebe milhões de solicitações a cada dia. Por que lhe respondeu, se a senhora é uma simples blogueira?
YS – Obama é próximo de minha geração, de meu modo de pensar.
SL – Mas por que a senhora? Existem milhões de blogueiros no mundo. Não acha que foi usada na guerra midiática de Washington contra Havana?
YS – Em minha opinião, ele talvez quisesse responder a alguns pontos, como a invasão de Cuba. Talvez eu tenha lhe dado a oportunidade de se manifestar sobre um tema que ele queria abordar havia muito tempo. A propaganda política nos fala constantemente de uma possível invasão de Cuba.
SL – Mas ocorreu uma, não?
YS – Quando?
SL – Em 1961. E, em 2003, Roger Noriega, subsecretário de Estado para Assuntos Interamericanos, disse que qualquer onda migratória cubana em direção aos Estados Unidos seria considerada uma ameaça à segurança nacional e exigiria uma resposta militar.
YS – É outro assunto. Voltando ao tema da entrevista, creio que ela permitiu esclarecer alguns pontos. Tenho a impressão de que há uma intenção de ambos os lados de não normalizar as relações, de não se entender. Perguntei-lhe quando encontraríamos uma solução.
SL – A seu ver, quem é responsável por este conflito entre os dois países?
YS – É difícil apontar um culpado.
SL – Neste caso específico, são os Estados Unidos que impõem sanções unilaterais a Cuba, e não o contrário.
YS – Sim, mas Cuba confiscou propriedades dos Estados Unidos.
SL – Tenho a impressão de que a senhora faz o papel de advogada de Washington.
YS – Os confiscos ocorreram.
SL – É verdade, mas foram realizados conforme o direito internacional. Cuba também confiscou propriedades da França, Espanha, Itália, Bélgica, Reino Unido, e indenizou estas nações. O único país que recusou as indenizações foram os Estados Unidos.
YS – Cuba também permitiu a instalação de bases militares em seu território e de mísseis de um império distante…
SL – …Como os Estados Unidos instalaram bases nucleares contra a URSS na Itália e na Turquia.
YS – Os mísseis nucleares podiam alcançar os Estados Unidos.
SL – Assim como os mísseis nucleares norte-americanos podiam alcançar Cuba ou a URSS.
YS – É verdade, mas creio que houve uma escalada no confronto por parte de ambos os países.
Os cinco presos políticos cubanos e a dissidência
SL – Abordemos outro tema. Fala-se muito dos cinco presos políticos cubanos nos Estados Unidos, condenados à prisão perpétua por infiltrar grupelhos de extrema direita na Flórida envolvidos no terrorismo contra Cuba.
YS – Não é um tema que interesse à população. É propaganda política.
SL – Mas qual é seu ponto de vista a respeito?
YS – Tentarei ser o mais neutra possível. São agentes do Ministério do Interior que se infiltraram nos Estados Unidos para coletar informações. O governo de Cuba disse que eles não desempenhavam atividades de espionagem, mas sim que haviam infiltrado grupos cubanos para evitar atos terroristas. Mas o governo cubano sempre afirmou que esses grupos estavam ligados a Washington.
SL – Então os grupos radicais de exilados têm laços com o governo dos Estados Unidos.
YS – É o que diz a propaganda política.
SL – Então não é verdade.
YS – Se é verdade, significa que os cinco realizavam atividades de espionagem.
SL – Neste caso, os Estados Unidos têm de reconhecer que os grupos violentos fazem parte do governo.
YS – É verdade.
SL – A senhora acha que os Cinco devem ser libertados ou merecem a punição?
YS – Creio que valeria a pena revisar os casos, mas em um contexto político mais apaziguado. Não acho que o uso político deste caso seja bom para eles. O governo cubano midiatiza demais este assunto.
SL – Talvez por ser um assunto totalmente censurado pela imprensa ocidental.
YS – Creio que seria bom salvar essas pessoas, que são seres humanos, têm uma família, filhos. Por outro lado, contudo, também há vítimas.
SL – Mas os cinco não cometeram crimes.
YS – Não, mas forneceram informações que causaram a morte de várias pessoas.
SL – A senhora se refere aos acontecimentos de 24 de fevereiro de 1996, quando dois aviões da organização radical Brothers to the Rescue foram derrubados depois de violar várias vezes o espaço aéreo cubano e lançar convocações à rebelião.
YS – Sim.
SL – No entanto, o promotor reconheceu que era impossível provar a culpa de Gerardo Hernández neste caso.
YS – É verdade. Penso que, quando a política se intromete em assuntos de justiça, chegamos a isso.
SL – A senhora acha que se trata de um caso político?
YS – Para o governo cubano, é um caso político.

SL – E para os Estados Unidos?
YS – Penso que existe uma separação dos poderes no país, mas é possível que o ambiente político tenha influenciado os juízes e jurados. Não creio, no entanto, que se trate de um caso político dirigido por Washigton. É difícil ter uma imagem clara deste caso, pois jamais obtivemos uma informação completa a respeito. Mas a prioridade para os cubanos é a libertação dos presos políticos.
O financiamiento dos dissidentes cubanos pelos Estados Unidos
SL – Wayne S. Smith, último embaixador dos Estados Unidos em Cuba, declarou que era “ilegal e imprudente enviar dinheiro aos dissidentes cubanos”. Acrescentou que “ninguém deveria dar dinheiro aos dissidentes, muito menos com o objetivo de derrubar o governo cubano”.
Ele explica: “Quando os Estados Unidos declaram que seu objetivo é derrubar o governo cubano e depois afirmam que um dos meios para conseguir isso é oferecer fundos aos dissidentes cubanos, estes se encontram de fato na posição de agentes pagos por uma potência estrangeira para derrubar seu próprio governo”.
YS – Creio que o financiamento da oposição pelos Estados Unidos tem sido apresentado como uma realidade, o que não é o caso. Conheço vários membros do grupo dos 75 dissidentes presos em 2003 e duvido muito dessa versão. Não tenho provas de que os 75 tenham sido presos por isso. Não acredito nas provas apresentadas nos tribunais cubanos.
SL – Não creio que seja possível ignorar esta realidade.
YS – Por quê?
SL – O próprio governo dos Estados Unidos afirma que financia a oposição interna desde 1959. Basta consultar, além dos arquivos liberados ao público, a seção 1.705 da lei Torricelli, de 1992, a seção 109 da lei Helms-Burton, de 1996, e os dois informes da Comissão de Assistência para uma Cuba Livre, de maio de 2004 e julho de 2006. Todos esses documentos revelam que o presidente dos Estados Unidos financia a oposição interna em Cuba com o objetivo de derrubar o governo de Havana.
YS: Não sei, mas…
SL – Se me permite, vou citar as leis em questão. A seção 1.705 da lei Torricelli estipula que “os Estados Unidos proporcionarã o assistência às organizações não-governamentais adequadas para apoiar indivíduos e organizações que promovem uma mudança democrática não violenta em Cuba.”
A seção 109 da lei Helms-Burton também é muito clara: “O presidente [dos Estados Unidos] está autorizado a proporcionar assistência e oferecer todo tipo de apoio a indivíduos e organizações não-governamentais independentes para unir os esforços a fim de construir uma democracia em Cuba”.
O primeiro informe da Comissão de Assistência para uma Cuba Livre prevê a elaboração de um “sólido programa de apoio que favoreça a sociedade civil cubana”. Entre as medidas previstas há um financiamento de 36 milhões de dólares para o “apoio à oposição democrática e ao fortalecimento da sociedade civil emergente”.
O segundo informe da Comissão de Assistência para uma Cuba Livre prevê um orçamento de 31 milhões de dólares para financiar ainda mais a oposição interna. Além disso, está previsto para os anos seguintes um financiamento anual de pelo menos 20 milhões de dólares, com o mesmo objetivo, “até que a ditadura deixe de existir”.
YS – Quem lhe disse que esse dinheiro chegou às mãos dos dissidentes?
SL – A Seção de Interesses Norte-americanos afirmou em um comunicado: “A política norte-americana, faz muito tempo, é proporcionar assistência humanitária ao povo cubano, especificamente a famílias de presos políticos. Também permitimos que as organizações privadas o façam.”
YS – Bem…
SL – Inclusive a Anistia Internacional, que lembra a existência de 58 presos políticos em Cuba, reconhece que eles estão detidos “por ter recebido fundos ou materiais do governo norte-americano para realizar atividades que as autoridades consideram subversivas e prejudiciais para Cuba”.
YS – Não sei se…
SL – Por outro lado, os próprios dissidentes admitem receber dinheiro dos Estados Unidos. Laura Pollán, das Damas de Branco, declarou: “Aceitamos a ajuda, o apoio, da ultradireita à esquerda, sem condições”. O opositor Vladimiro Roca também confessou que a dissidência cubana é subvencionada por Washington, alegando que a ajuda financeira recebida era “total e completamente lícita”. Para o dissidente René Gómez, o apoio econômico por parte dos Estados Unidos “não é algo a esconder ou de que precisemos nos envergonhar” .
Inclusive a imprensa ocidental reconhece. A agência France Presse informa que “os dissidentes, por sua parte, reivindicaram e assumiram essas ajudas econômicas”. A agência espanhola EFEmenciona os “opositores financiados pelos Estados Unidos”. Quanto à agência de notícias britânica Reuters, “o governo norte-americano fornece abertamente um apoio financeiro federal às atividades dos dissidentes, o que Cuba considera um ato ilegal”. E eu poderia multiplicar os exemplos.
YS – Tudo isso é culpa do governo cubano, que impede a prosperidade econômica de seus cidadãos, que impõe um racionamento à população. É preciso fazer fila para conseguir produtos. É necessário julgar antes o governo cubano, que levou milhares de pessoas a aceitar a ajuda estrangeira.
SL – O problema é que os dissidentes cometem um delito que a lei cubana e todos os códigos penais do mundo sancionam severamente. Ser financiado por uma potência estrangeira é um grave delito na Franca e no restante do mundo.
YS – Podemos admitir que o financiamento de uma oposição é uma prova de ingerência, mas…
SL – Mas, neste caso, as pessoas que a senhora qualifica de presos políticos não são presos políticos, pois cometeram um delito ao aceitar dinheiro dos Estados Unidos, e a justiça cubana as condenou com base nisso.
YS – Creio que este governo se intrometeu muitas vezes nos assuntos internos de outros países, financiando movimentos rebeldes e a guerrilha. Interveio em Angola e…
SL – Sim, mas se tratava de ajudar os movimentos independentistas contra o colonialismo português e o regime segregacionista da África do Sul. Quando a África do Sul invadiu a Namíbia, Cuba interveio para defender a independência deste país. Nelson Mandela agradeceu publicamente a Cuba e esta foi a razão pela qual fez sua primeira viagem a Havana, e não a Washington ou Paris.
YS – Mas muitos cubanos morreram por isso, longe de sua terra.
SL – Sim, mas foi por uma causa nobre, seja em Angola, no Congo ou na Namíbia. A batalha de Cuito Cuanavale, em 1988, permitiu que se pusesse fim ao apartheid na África do Sul. É o que diz Mandela! Não se sente orgulhosa disso?
YS – Concordo, mas, no fim das contas, incomoda-me mais a ingerência de meu país no exterior. O que faz falta é despenalizar a prosperidade.
SL – Inclusive o fato de se receber dinheiro de uma potência estrangeira?
YS – As pessoas têm de ser economicamente autônomas.
SL – Se entendo bem, a senhora preconiza a privatização de certos setores da economia.
YS – Não gosto do termo “privatizar” , pois tem uma conotação pejorativa, mas colocar em mãos privadas, sim.
Conquistas sociais em Cuba?
SL – É uma questão semântica, então. Quais são, para a senhora, as conquistas sociais deste país?
YS – Cada conquista teve um custo enorme. Todas as coisas que podem parecer positivas tiveram um custo em termos de liberdade. Meu filho recebe uma educação muito doutrinária e contam-lhe uma história de Cuba que em nada corresponde à realidade. Preferiria uma educação menos ideológica para meu filho. Por outro lado, ninguém quer ser professor neste país, pois os salários são muito baixos.
SL – Concordo, mas isso não impede que Cuba seja o país com o maior número de professores por habitante do mundo, com salas de 20 alunos no máximo, o que não ocorre na França, por exemplo.
YS – Sim, mas houve um custo, e por isso a educação e a saúde não são verdadeiras conquistas para mim.
SL – Não podemos negar algo reconhecido por todas as instituições internacionais. Em relação à educação, o índice de analfabetismo é de 11,7% na América Latina e 0,2% em Cuba. O índice de escolaridade no ensino primário é de 92% na América Latina e 100% em Cuba, e no ensino secundário é de 52% e 99,7%, respectivamente. São cifras do Departamento de Educação da Unesco.
YS – Certo, mas, em 1959, embora Cuba vivesse em condições difíceis, a situação não era tão ruim. Havia uma vida intelectual florescente, um pensamento político vivo. Na verdade, a maioria das supostas conquistas atuais, apresentadas como resultados do sistema, eram inerentes a nossa idiossincrasia. Essas conquistas existiam antes.
SL – Não é verdade. Vou citar uma fonte acima de qualquer suspeita: um informe do Banco Mundial. É uma citação bastante longa, mas vale a pena.
“Cuba é internacionalmente reconhecida por seus êxitos no campo da educação e da saúde, com um serviço social que supera o da maior parte dos países em desenvolvimento e, em certos setores, comparável ao dos países desenvolvidos. Desde a Revolução cubana de 1959 e do estabelecimento de um governo comunista com partido único, o país criou um sistema de serviços sociais que garante o acesso universal à educação e à saúde, proporcionado pelo Estado. Este modelo permitiu que Cuba alcançasse uma alfabetização universal, a erradicação de certas enfermidades, o acesso geral à água potável e a salubridade pública de base, uma das taxas de mortalidade infantil mais baixas da região e uma das maiores expectativas de vida. Uma revisão dos indicadores sociais de Cuba revela uma melhora quase contínua desde 1960 até 1980. Vários índices importantes, como a expectativa de vida e a taxa de mortalidade infantil, continuaram melhorando durante a crise econômica do país nos anos 90… Atualmente, o serviço social de Cuba é um dos melhores do mundo em desenvolvimento, como documentam numerosas fontes internacionais, entre elas a Organização Mundial de Saúde, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento e outras agências da ONU, e o Banco Mundial. Segundo os índices de desenvolvimento do mundo em 2002, Cuba supera amplamente a América Latina e o Caribe e outros países com renda média nos mais importantes indicadores de educação, saúde e salubridade pública.”
Além disso, os números comprovam. Em 1959, a taxa de mortalidade infantil era de 60 por mil. Em 2009, era de 4,8. Trata-se da taxa mais baixa do continente americano do Terceiro Mundo; inclusive mais baixa que a dos Estados Unidos.
YS – Bom, mas…
SL – A expectativa de vida era de 58 anos antes da Revolução. Agora é de quase 80 anos, similar à de muitos países desenvolvidos. Cuba tem hoje 67.000 médicos frente aos 6.000 de 1959. Segundo o diário ingles The Guardian, Cuba tem duas vezes mais médicos que a Inglaterra para uma população quatro vezes menor.
YS – Certo, mas, em termos de liberdade de expressão, houve um recuo em relação ao governo de Batista. O regime era uma ditadura, mas havia uma liberdade de imprensa plural e aberta, programas de rádio de todas as tendências políticas.
SL – Não é verdade. A censura da imprensa também existia. Entre dezembro de 1956 e janeiro de 1959, durante a guerra contra o regime de Batista, a censura foi imposta em 630 de 759 dias. E aos opositores reservava-se um triste destino.
YS – É verdade que havia censura, intimidações e mortos ao final.
SL – Então a senhora não pode dizer que a situação era melhor com Batista, já que os opositores eram assassinados. Já não é o caso hoje. A senhora acha que a data de 1º de janeiro é uma tragédia para a história de Cuba?
YS – Não, de modo algum. Foi um processo que motivou muita esperança, mas traiu a maioria dos cubanos. Fui um momento luminosos para boa parte da população, mas puseram fim a uma ditadura e instauraram outra. Mas não sou tão negativa como alguns.
Luis Posada Carriles, a lei de Ajuste Cubano e a emigração
SL – O que acha de Luis Posada Carriles, ex-agente da CIA responsável por numerosos crimes em Cuba e a quem os Estados Unidos recusam-se a julgar?
YS – É um tema político que não interessa às pessoas. É uma cortina de fumaça.
SL – Interessa, pelo menos, aos parentes das vítimas. Qual é seu ponto de vista a respeito?
YS – Não gosto de ações violentas.
SL – Condena seus atos terroristas?
YS – Condeno todo ato de terrorismo, inclusive os cometidos atualmente no Iraque por uma suposta resistência iraquiana que mata os iraquianos.
SL – Quem mata os iraquianos? Os ataques da resistência ou os bombardeios dos Estados Unidos?

YS – Não sei.
SL – Uma palavra sobre a lei de Ajuste Cubano, que determina que todo cubano que emigra legal o ilegalmente para os Estados Unidos obtém automaticamente o status de residente permanente.
YS – É uma vantagem que os demais países não têm. Mas o fato de os cubanos emigrarem para os Estados Unidos deve-se à situação difícil aqui.
SL – Além disso, os Estados Unidos são o país mais rico do mundo. Muitos europeus também emigram para lá. A senhora reconhece que a lei de Ajuste Cubano é uma formidável ferramenta de incitação à emigração legal e ilegal?
YS – É, efetivamente, um fator de incitação.
SL – A senhora não vê isso como uma ferramenta para desestabilizar a sociedade e o governo?
YS – Neste caso, também podemos dizer que a concessão da cidadania espanhola aos descendentes de espanhóis nascidos em Cuba é um fator de desestabilizaçã o.
SL – Não tem nada a ver, pois existem razões históricas e, além disso, a Espanha aplica esta lei a todos os países da América Latina e não só a Cuba, enquanto a lei de Ajuste Cubano é única no mundo.
YS – Mas existem fortes relações. Joga-se beisebol em Cuba como nos Estados Unidos.
SL – Na República Dominicana também, mas não existe uma lei de ajuste dominicano.
YS – Existe, no entanto, uma tradição de aproximação.
SL – Então por que esta lei não foi aprovada antes da Revolução?
YS – Por que os cubanos não queriam deixar seu país. Na época, Cuba era um país de imigração, não de emigração.
SL – É absolutamente falso, já que, nos anos 50, Cuba ocupava o segundo lugar entre os países americanos em termos de emigração rumo aos Estados Unidos, imediatamente atrás do México. Cuba mandava mais emigrantes para os Estados Unidos que toda a América Central e toda a América do Sul juntas, enquanto que atualmente Cuba só ocupa o décimo lugar apesar da lei de Ajuste Cubano e das sanções econômicas.
YS – Talvez, mas não havia essa obsessão de abandonar o país.
SL – As cifras demonstram o contrário. Atualmente, repito, Cuba só ocupa o décimo lugar no continente americano em termos de fluxo migratório para os Estados Unidos. Então a obsessão da qual você me fala é mais forte en nove países do continente pelo menos.
YS – Sim, mas naquela época os cubanos iam e regressavam.

Maierovitch:STF poupa (Collor de) Melo

 

(Collor de) Melo, o Campeão do Corporativismo

O Conversa Afiada reproduz texto de Wálter Maierovitch publicado em seu blog no Portal Terra:

STF faz julgamento pontual para poupar ministro Marco Aurélio


Depois de mais de quatro horas de sessão, o Supremo Tribunal Federal (STF) ainda não chegou ao exame da grande polêmica, sobre a competência correcional do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).


O início foi marcado por sustentações orais, com intervenções do advogado da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), do presidente da OAB (aquele acusado de receber vencimentos sem ter trabalhado), do advogado-geral da União e do procurador-geral da Justiça. Com exceção do representante da AMB, todos os demais pediram a cassação da liminar de Marco Aurélio, no que toca ao tema do poder correcional do CNJ.


Os ministros do STF entenderam, por maioria, que deveriam, com relação às liminares concedidas pelo ministro Marco Aurélio, examinar em tópicos as postulações contidas na ação declaratória de inconstitucionalidade ajuizada pela Associação de Magistrados Brasileiros (AMB). E assim decidiram porque, na ação, a AMB atacou vários dispositivos da Resolução 135/2011, que unificou a forma dos procedimentos administrativos. Com relação à lei da Ficha Limpa, julgaram de uma vez só, a mostrar que a meta era poupar o ministro Marco Aurélio.


No particular, a Resolução 135/2011 foi, antes de aprovada pelo CNJ, encaminhada à AMB para sugestões. Por ofício, a AMB participou que não tinha sugestões a dar. Depois da publicação da Resolução 135/2011 e diante dos gritos de togas corporativas, a AMB resolveu questionar, no STF, a constitucionalidade de vários artigos. Não contente, pediu liminar, no apagar das luzes do ano Judiciário de 2011.

A respeito da unificação procedimental dos feitos disciplinares, o CNJ agiu diante de casos teratológicos. Por exemplo, um Tribunal de Justiça, ao examinar processo administrativo disciplinar contra juiz, chegou a concluir por consumados desvios funcionais. Parte do tribunal entendeu que a pena adequada seria a de aposentadoria compulsória (a mais grave). A outra parte, no entanto, optava pela pena de censura. Diante da divergência, a Corte entendeu em absolver o juiz acusado. Pela Resolução, caso estivesse em vigor ao tempo, seria aplicada, diante da divergência quanto à sanção mas acordo a respeito da culpa, a pena menos grave (censura).

O julgamento “debulhado” servirá para poupar o desgaste do ministro Marco Aurélio, caso se conclua — relativamente à questão principal — ter o CNJ competência corrente e não subsidiária. É que, em alguns artigos da Resolução, os ministros concluírão, por unanimidade, que o CNJ legislou, ou seja, tomou o lugar do Legislativo. Em outras palavras, o ministro Marco Aurélio acertou com relação ao óbvio.

Pano rápido. Não só os 17 mil magistrados em atividade aguardam uma definição do STF, depois do enorme desgaste perante a opinião pública esclarecida, e  decorrente da atuação corporativa nada republicana da AMB. A sociedade civil, que é a favor da transparência e contra os privilégios, espera que o STF, órgão de cúpula, não a decepcione.

Marcio Sotelo Felippe: O Pinheirinho e a banalidade do mal


por Marcio Sotelo Felippe
O livro que Hannah Arendt escreveu  sobre o  julgamento de Adolf Eichmann em Jerusalém tinha como subtítulo  “a banalidade do mal”. Eichmann foi sequestrado na Argentina pelo Mossad, o serviço secreto de Israel. Havia organizado o sistema de  transporte de judeus para os campos de concentração. Arendt viu um homem medíocre e raso. Um burocrata batedor de carimbos. Alguém que podemos  encontrar na rua levando o cachorro para passear, que nos cumprimenta gentilmente e  fala sobre o tempo. Nenhuma personalidade tonitruante. Mas agindo com carimbos no mesmo plano de Gengis Khan com a espada  ou Torquemada com a fogueira.
Alegava que cumpriu o seu dever, e o que o dever era o imperativo categórico de Kant. Ao afirmar isso, parecia a Arendt que ele era incapaz de imaginar que qualquer interlocutor imediatamente lhe responderia que roubar e matar milhões de pessoas são atos logicamente  incompatíveis com a categoria “dever”. E que não poderia haver tréplica  possível a este argumento. Que ninguém escolhe viver em uma sociedade de ladrões e assassinos, o que é uma implicação primária do imperativo categórico. Ou de  qualquer sistema inteligível de moralidade.
Arendt percebe que Eichmann é incapaz de raciocínio moral minimamente superior à noção de cumprimento de ordens. Que seus juízos são rudimentares. Que na sua “filosofia moral” as consequências das ordens recebidas são irrelevantes, mesmo que milhões de pessoas estejam morrendo. Podemos imaginar que um transporte bem sucedido de judeus para Auschwitz terá sido efusivamente festejado, e que Eichmann terá brindado com champagne seu sucesso funcional em vários momentos, com subalternos e superiores hierárquicos.
Eichmann tinha um intelecto que lhe permitia organizar o transporte compulsório de milhões de presos. Mas em sua defesa era incapaz de formular um raciocínio moral que fosse além do conceito de cumprimento de ordens.
“A acusação deixava implícito que ele não só agira conscientemente, coisa que ele não negava, como também agira por motivos baixos e plenamente consciente da natureza criminosa de seus feitos. Quanto aos motivos baixos, ele tinha certeza absoluta de que, no fundo de seu coração, não era aquilo que se chamava de innerer Schweinehund”, um bastardo imundo; e quanto à sua consciência, ele se lembrava perfeitamente de que só ficava com a consciência pesada quando não fazia aquilo que lhe ordenavam – embarcar milhões de homens, mulheres e crianças para a morte, com grande aplicação e o mais meticuloso cuidado. Isso era mesmo difícil de engolir. Meia dúzia de psiquiatras haviam atestado sua “normalidade” – “pelo menos mais normal do que eu fiquei depois de examiná-lo”, teria exclamado um deles, enquanto outros consideraram seu perfil psicológico, sua atitude quanto a esposa e filhos, mãe e pai, irmãos, irmãs e amigos, “não apenas normal, mas inteiramente desejável” (Eichmann em Jerusalém, Companhia das Letras, pag. 36/37).
Um homem normal. Dedicado à família, leal a seus amigos, cumpridor de seus deveres. A banalidade: sua máxima instância moral era o que lhe diziam ser o dever. Qual o sentido do dever que lhe impunham? Ele não ia até esse ponto. Desse dever resultariam mortes? Ele não ia até esse ponto. Mortes horrendas, pessoas dizimadas como moscas? Ele não ia até esse ponto. Algumas reações ao caso Pinheirinho invocam as lições de Hannah Arendt.
As banalidades: há  uma ordem social fundada na propriedade. Há regras sobre a propriedade. Onde vamos parar se todo mundo começa a invadir propriedades? Ordens devem ser cumpridas.  A juíza cumpriu seu dever. O presidente do Tribunal, que se empenhou pessoalmente a ponto de remeter para lá um assessor, cumpriu seu dever. A Polícia Militar cumpriu seu dever. O governador cumpriu seu dever. Mas impedir que 6 mil pessoas se vissem, de uma hora para outra, de surpresa e praticamente na calada da noite, arremessadas de suas casas para o nada, isto não era dever de ninguém.
A juíza dá entrevista exultante com o resultado da operação:
“a operação me surpreendeu positivamente. A Polícia Militar se preparou, se planejou durante mais de quatro meses (…) desempenhou um serviço admirável que é motivo de orgulho pra todos nós (…) A Polícia Militar agiu com competência e com honra mesmo”
Quatro meses! Em nenhum momento desses 4 meses ela se deteve para pensar que, senhora da jurisdição, estava ao seu alcance dar ao caso uma solução que não resultasse naquela inominável violência, naquela barbárie? Que havia precedentes jurisprudenciais, que estão  sendo publicados  às dúzias nas redes sociais? No entanto, tudo que ela diz agora é que a Polícia Militar prestou um serviço “motivo de orgulho”: a Polícia Militar cumpriu seu dever. Ela cumpriu seu dever.
Na Folha de S. Paulo de 28 de janeiro, o advogado João Antonio Wiegerinck nos ensina – de forma tristemente banal -   quedireito à propriedade é um direito tão antigo quanto o direito à dignidade da pessoa humana na maior parte das constituições ocidentais. Como princípios constitucionais que são, inexiste uma hierarquia científica entre eles ou os demais princípios (…) a retirada de invasores de uma propriedade adquirida honestamente e pela qual se paga tributos ao Estado é um ato lícito e voltado à boa observância da ordem (…) o que todo cidadão de bem deseja é que a sociedade em que vive ofereça estabilidade na manutenção das regras a serem observadas por todos, sem favorecimentos ou discriminações. Quem tem consciência de estar vivendo ilegalmente sabe que um dia isso será cobrado. Tomara que de agora em diante com mais dignidade e prevenção.”
O que o articulista diz não vai além do conceito de ordem, legalidade e propriedade. A realidade social, a inexistência de habitações, a miséria de quem se vê obrigado a morar onde consegue e não onde quer,  tudo isso está ausente do juízo do articulista. A banalidade do seu juízo ignora a ideia de um sentido e de uma racionalização da propriedade. Na frase “o que importa para o cidadão de bem é a estabilidade e a manutenção das regras”, vejam a associação de ideias entre estabilidade, manutenção e bem.
Para denunciar a trivialidade dessa associação, basta perguntar: qual o sentido desta “estabilidade” e desta “manutenção”? Por que elas são, assim sem mais, o bem (sutilmente encaixado na expressão “cidadão de bem”)? Em outros termos: para ele, bem é igual estabilidade e manutenção de uma regra. Bem é cumprir o dever. O que resulta desse dever? Ele não chega a esse ponto.
A chave de ouro do articulista é: os culpados são os moradores. Viviam ilegalmente e deveriam saber que um dia seriam cobrados. Eu mesmo estaria louco de vontade de participar de uma invasão e viver “ilegalmente”. Não veria a hora de largar meu apartamento e invadir um terreno privado, construir um barraco e depois, com minhas próprias mãos, uns dois ou três cômodos de alvenaria e lá amontoar meus filhos. Mas eu e milhões de brasileiros  não fazemos isso porque somos “cidadãos de bem”. Os moradores do Pinheirinho são delinquentes. Como vivem na ilegalidade, agora foram cobrados. Bem feito. As pessoas que defendem a perversidade social não são burras. Elas são hegemônicas na estrutura social e política do país. Defendem interesses. São competentes e preparadas. Mas não há como defender perversidades sociais sem argumentos banais. O mal, na sua lógica intrínseca, é  moralmente burro, como percebeu Hannah Arendt.

Marcio Sotelo Felippe é procurador do Estado de São Paulo.

Com greve de fome na porta da Globo, JN fugiu para Cuba.




O ativista Pedro Rios Leão, desde domingo, se algemou na calçada em frente à TV Globo, e está fazendo greve de fome.

O motivo, segundo suas próprias palavras:
– Minha maior arma é o constrangimento porque passa a TV Globo, que simboliza a mídia conservadora e maniqueísta que escondeu o massacre cometido pela polícia e por agentes da guarda municipal de São José dos Campos. Houve mortes em Pinheirinho e ninguém denunciou isso. Minha greve de fome tem o objetivo de denunciar os atos de barbárie cometidos contra uma população desarmada. Meu protesto é para que o governador Geraldo Alckmin seja preso. Que os desembargadores que assinaram a ordem para que a violência ocorresse sejam presos. Que o proprietário daquelas terras, o especulador Naji Nahas seja preso. - Pedro Rios esteve no Pinheirinho e gravou vários vídeos com as atrocidades e depoimentos de moradores.
Independente de concordar ou não com tudo o que Pedro Rios diz ou faz, o fato, que é notícia, está literalmente na porta da TV Globo. Basta a produção da emissora chegar na janela e filmar. É só sair na rua e gravar.

E o fato é um ativista faz greve de fome contra a violação dos direitos humanos de crianças, idosos, trabalhadoras e trabalhadores do Pinheirinho.

Mas a emissora não dá uma palavra a respeito da notícia que bate na porta da emissora.

Para falar de direitos humanos, a Globo fugiu para Cuba na terça-feira, e o Jornal Nacional chegou a tirar dos arquivos notícias já antigas para requentá-las, inclusive sobre... suposta greve de fome de prisioneiro cubano!

Detalhe: na mesma terça-feira a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República emitiu nota pública "Sobre as violações de Direitos Humanos na reintegração de posse do bairro Pinheirinho, em São José dos Campos/SP". Nenhuma palavra a respeito no Jornal Nacional.

http://goo.gl/UQR5D

Como pode uma emissora de TV brasileira cobrar posicionamento do governo brasileiro sobre direito humanos em Cuba, e não noticiar providências deste mesmo governo brasileiro sobre violação de direitos humanos contra cidadãos brasileiros? Inclusive exigência de alimentação adequada, assistência médica e garantia de matrícula escolar para crianças?

Só blog entrevista vítima baleada e

Só o blog Viomundo fez entrevista com a vítima baleada pela Guarda Municipal durante a ação policial no Pinheirinho. O ocorrência não é negada nem pela Polícia Militar de São Paulo. No entanto a velha mídia, que tem estrutura com equipe, equipamentos e dinheiro para fazer essas coberturas, prefere evitar o assunto para poupar seus companheiros demo-tucanos, os governadores Alckmin, o prefeito Eduardo Cury e o mega-especulador Naji Nahas.

Assim, liberdade de imprensa para quê? Se a notícia que interessa ao povo brasileiro é censurada pelos donos dos canais de TV e jornais.

Notícias como estas são importantes para a população, independente de considerações políticas, para que a situação dos desalojados se resolva e para que barbaridades como estas não se repitam.

Na edição de quarta-feira do Jornal Nacional, a Globo foi obrigada a romper o silêncio e falar da audiência pública na Assembléia Legislativa de São Paulo sobre o Pinheirinho. Mas acabou usando a matéria para bajular o governador tucano, como se ele fosse resolver tudo com o cheque aluguel, que também não resolve, pois está mais para cheque sem fundos, conforme explicado pela Helena na Rede Brasil Atual.

O 'FIM DA CRISE' E O OXÍMORO ORTODOXO

A expressão 'contração fiscal expansionista' sugere um simples oxímoro, mas representa mais que uma contradição vocabular quando se sabe que abriga a viga mestra da proposta conservadora  para a crise mundial. Pulsa nesse paradoxo, ademais, uma visão de desenvolvimento recorrente em terras brasileiras, baseada na hipótese de que um bom arrocho nas despesas públicas e nas políticas sociais é pré-condição para se  'liberar' espaço à queda dos juros e, ato contínuo, festejar o 'crescimento saudável' capitaneado pelo setor privado. O tacão de Angela Merkel sobre os parceiros do euro; a decadência inglesa sob Cameron; a pobre Espanha com 48,5% da juventude desempregada; Portugal do extremismo conservador  que flertou com a volta da mais valia absoluta e a sofrida Grécia das crianças que desmaiam de fome em sala de aula, sem esquecer o embate orçamentário nos EUA, são protagonistas  da gigantesca massa de interesses e sacrifícios em ebulição no interior desse inocente  jogo de palavras. No fundo, estamos novamente às voltas com o bordão do Estado mínimo adaptado às condições da maior crise do capitalismo desde 1929. Não há nada de acadêmico nisso. A resiliência de um marco divisor que esfarela direitos e cospe desemprego planeta afora, em troca de uma improvável redenção purgativa  da economia, é a evidência mais óbvia de que o colapso neoliberal  ainda não produziu um antídoto ancorado em forças sociais aptas a inaugurar um novo ciclo histórico.  É desse horizonte escuro e inóspito  que  irrompem sinais bruxelantes  de  uma 'recuperação' trombeteada pela mídia, na qual bancos e grandes corporações emergem leves, líquidos e lucrativos. Mas a renda,  a qualidade do emprego, os direitos e a subjetividade despencam na maioria das nações. Bancos e grandes corporações acumulam cerca de US$ 13 trilhões em caixa no mundo rico. Mas não emprestam, não investem, nem contratam. Coube ao Presidente do Santander, Emilio Botín, elucidar esse desencontro com uma explicação que desmente o suposto poder regenerador  do oxímoro ortodoxo: " O crédito não flui e não emprestamos mais porque não há demanda solvente na sociedade", justificou Don Botín na 3ª feira, em Madrid. Em resumo, a 'contração' vai bem, já a contrapartida expansionista patina --justamente porque a contração vai bem.

A única mulher que confronta o Exército

O Conversa Afiada republica e-mail  de amigo navegante Luis e reportagem de Igor Natusch:

O repórter Igor Natusch e o site SUL21 são os únicos que mantêm sob mira e vigilância o escabroso caso do soldado estuprado no quartel de Santa Maria, terra natal do ex-ministro Nelson Jobim, que nunca disse um ai a respeito do caso.

A única autoridade federal que peita o Exército e mostra interesse neste crime é uma mulher, Maria do Rosário, ministra-chefe da Secretaria dos Direitos Humanos da Presidência da República.

Veja o que eles contam sobre os últimos desdobramentos, que ninguém do PiG noticia.

SUL21

Governo federal visita Santa Maria e cobra militares sobre caso de soldado estuprado


Igor Natusch, do SUL21


Em nota oficial, o Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH), órgão ligado à Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, divulgou nesta terça-feira (31) informações sobre a missão enviada para cuidar do caso do soldado que acusa ter sido estuprado por outros quatro colegas em um quartel em Santa Maria (RS). A nota critica procedimentos adotados pelo Exército no decorrer do caso, apontando especialmente o período em que os militares mantiveram o jovem no hospital, sem avisar os familiares do que tinha ocorrido e sem permitir visitas.


“As Forças Armadas devem comunicar às famílias das possíveis vítimas sobre toda suspeita de violação de Direitos Humanos, ocorrida em área militar ou local sob seu controle, imediatamente à ciência dos fatos, o que não aconteceu no presente caso”, afirma o documento. É acentuada também a necessidade de “garantir a integridade física e psicológica do denunciante, bem como sua vida em sociedade”, preservando o direito do jovem soldado de proteger sua intimidade. Há menção também à adoção de “medidas enérgicas” contra a propagação negativa do caso em redes sociais.


A delegação esteve em Santa Maria nos dias 16 e 17 do mês de janeiro, coletando informações sobre o caso e conversando com os envolvidos, incluindo o jovem denunciante e seus familiares. A Secretaria de Direitos Humanos garante que vai seguir acompanhando o caso, dando especial atenção ao laudo sobre a possível deficiência mental leve do jovem estuprado – que não apenas o tornaria inimputável, como demonstraria que ele não tinha condições de prestar serviço militar, o que não foi detectado durante os exames de admissão.


A visita dos representantes vinha sendo cogitada desde setembro do ano passado, mas não tinha sido viabilizada até o começo deste ano. Em conversa com o Sul21 em dezembro, o ouvidor Domingos Silveira afirmou que não havia previsão para um acompanhamento mais próximo do caso. A declaração teria irritado Maria do Rosário, que entrou em contato com CDDPH para viabilizar a visita.


O soldado denunciou em maio ter sido estuprado por quatro colegas de caserna, enquanto cumpria pena administrativa no Parque Regional de Manutenção de Santa Maria, região Central do estado. Após a violência, o jovem ficou mais de uma semana internado no hospital militar — em parte desse período, sem poder fazer contato nem mesmo com seus familiares. Após inquérito sigiloso, o Exército concluiu que o jovem não foi vítima de violência, e sim cúmplice do crime de pederastia — ou seja, que fez sexo consentido com outros quatro soldados dentro do quartel. Uma série de evidências, porém, coloca em dúvida a conclusão do Ministério Público Militar, como já reportado anteriormente pelo Sul21.


No momento, o processo está parado na Justiça Militar de Santa Maria, enquanto se aguarda um parecer sobre as condições mentais do jovem soldado enfrentar julgamento. Não há prazo para o anúncio de uma conclusão sobre o laudo.