Mente vazia, oficina do sistema da mídia golpista

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quarta-feira, 22 de junho de 2011

Estudo diz que Lula superou FHC e reconhece herança maldita



Colunistas da grande imprensa andaram compondo odes ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (18 de junho de 1931) por conta da comemoração dos seus bem vividos oitenta anos. Alguns textos foram constrangedoramente bajuladores. Esses mesmos colunistas, porém, tratam o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva com desdém e ironia.
É hora de colocar os pingos nos is. Os colunistas da imprensa ubilicalmente ligada ao projeto de poder do PSDB – ou de seus caciques de cocares mais empenados – podem fazer as suas escolhas políticas, mas precisam parar de mentir ao negarem que o governo Lula foi melhor do que o de FHC e que este legou àquele uma herança maldita.
Para comprovar o que digo, valer-me-ei de fonte desses colunistas. No caso, a fonte é de uso do colunista de O Globo – e mais novo “imortal” da Academia Brasileira de Letras – Merval Pereira, que assina hoje (22/6), naquele jornal, artigo em que dá conta de Estudo institulado “Redução da desigualdade da renda no governo Lula — Análise comparativa”, do professor Reinaldo Gonçalves, do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Como faz, ininterruptamente, há anos, o colunista de O Globo se vale de parte daquele estudo para induzir o leitor a acreditar em premissas de um dos dois estudos de que trata este artigo que mostrariam que não houve nenhuma grande distribuição de renda durante o governo Lula e que a que ocorreu teria feito parte de um processo mundial em que o governo anterior “surfou”.
Eis o que interessa do artigo “Desigualdade persiste”, de Merval Pereira:
(…) O Brasil experimenta melhora apenas marginal na sua posição no ranking mundial dos países com maior grau de desigualdade, entre meados da última década do século XX e meados da primeira década do século XXI, já que sai da 4ª posição no ranking mundial dos países mais desiguais para a 5ª posição.
No conjunto dos países que mostram melhores resultados quanto à redução da desigualdade, o Brasil ocupa a 3ª posição, atrás da Venezuela (projeto de orientação socialista) e do Peru (projeto liberal), o que demonstra que os programas sociais não encontraram barreiras ideológicas à sua execução (…)
Merval, como de costume, conta parte da história. Para julgar por si mesmo, o leitor que se sentir preparado para julgar um texto acadêmico complexo, poderá lê-lo clicando aqui. O texto, porém, incorre em um erro básico: ignora os resultados sociais obtidos pelo governo Lula, apesar de reconhecer que a comparação dos resultados tem que obedecer às condições objetivas de cada governo.
Mas, de fato, a conclusão do estudo usado por Merval Pereira é a de que tanto o governo FHC quanto o governo Lula foram fracos em termos de crescimento econômico, o que fez com que a redução da concentração de renda tenha tido desempenho insuficiente nos governos dos dois ex-presidentes, ainda que com larga vantagem para Lula.
O uso desse estudo por um dos que mais se derramaram em declarações de amor pelo ex-presidente tucano por si só derruba qualquer contestação a outro estudo do mesmo acadêmico da UFRJ que produz algumas conclusões que esses colunistas negam reiteradamente, como as de que o governo Lula foi melhor do que o de FHC e de que este legou àquele uma legítima herança maldita.
O estudo “Análise Comparativa do governo Lula – resultados e metodologia”, de autoria do mesmo professor Reinaldo Gonçalves e divulgado em 28 de abril de 2010, não alivia para governo nenhum. Mas, quando chega na comparação entre os governos FHC e Lula, tem que reconhecer que, apesar dos resultados insuficientes dos dois, o de Lula foi melhor. E que poderia ter sido melhor se não fosse a herança que recebeu.
Eis a comparação pura e simples dos dois governos no ranking dos que melhores resultados obtiveram:
(…) O governo FHC ocupa a 28ª posição e o governo Lula a 23ª posição em um conjunto de 29 governos. Vale notar que o governo FHC é o segundo pior da história republicana (só perde para o governo Collor). No conjunto de 6 indicadores o governo Lula tem melhor desempenho que o governo FHC em 5 indicadores (…)
(…) Em defesa do governo Lula pode-se argumentar que parte expressiva do seufraco desempenho decorre da “herança negativa” do governo FHC derivada, principalmente, do desequilíbrio das finanças públicas (…)
A íntegra do estudo que este blog contrapõe ao estudo usado por Merval Pereira pode ser lida aqui.
Como já disse, nenhum dos dois estudos pega leve com governo nenhum. Aliás, ambos são injustamente duros com o governo Lula porque desconhecem um fator crucial, os resultados tanto da distribuição de renda quanto da redução da pobreza ou do crescimento exponencial da influência do Brasil no cenário internacional são solenemente ignorados.
Contrapondo-se os dois estudos com os dados do IBGE, vê-se que, apesar de a redução da desigualdade ter sido apenas mediana em relação ao mundo, dentro da realidade brasileira foi a maior ocorrida nos últimos cinqüenta anos, conforme pode ser constatado no artigo IBGE explica por que a elite odeia Lula, publicado neste blog no mês passado. Jamais houve distribuição de renda igual no período que vai de 1960 a 2010.
Além disso, há que se levar em conta a conjuntura mundial durante a era Lula. FHC recebeu um país com a economia arrumada, ainda que ele tenha sido o responsável por essa arrumação ao fim do governo Itamar Franco, enquanto que Lula recebeu um país altamente fragilizado, sabotado incessantemente pela grande mídia e pela oposição e que enfrentou a maior crise econômica mundial dos últimos oitenta anos.
De qualquer forma, se a coalizão político-midiática que Merval Pereira integra quer usar os dados do professor Reinaldo Gonçalves, certamente tem que endossar as conclusões dele de que o governo Lula foi melhor do que o de FHC e de que este legou uma herança maldita àquele… Certo?

O “nacionalismo” naval da Folha está furado

Quando a gente fala que a mídia manipula a informação, não está dizendo que ela mente.
Está dizendo que distorce, aumentando um lado, reduzindo o outro.
Vejam o caso da manchete – e mais quase toda uma página  interna da edição de hoje da Folha de S. Paulo.
“90% das plataformas de petróleo são compradas no exterior”
Aí vem a conta marota.
Como foram compradas 22 plataformas e, destas, só três foram integralmente construídas aqui, tem-se que 3/22 é igual a  13,6%. E então, 87% dão estrangeiras. Arredondando, 90%, não é?
Aí você, pacientemente, lê toda a matéria. A repórter Leila Coimbra jamais escreve a expressão 90%, senão uma vez, para dizer que das  48 plataformas da petroleira privada OSX, 90% serão construídas no Brasil, no estaleiro que o grupo empresarial de Eike Batista está começando a construir no Porto do Açu, em sociedade com a sul-coreana Hyundai Heavy Industries, e que será, segundo os planos, o maior estaleiro das Américas.
Como a empresa já achou e extrai petróleo, é óbvio que ela não iria esperar ficar pronto o estaleiro e que o estaleiro produzisse as plataformas, não é? Até porque, é evidente, um estaleiro não é simples como “fazer um puxadinho” e construir uma plataforma não é fazer um toldo de varanda. Portanto, nada mais natural que, na fase inicial, ela comprasse quatro plataformas em estaleiros que fazem uma atrás da outra.
Mas vá lá, é uma empresa privada e, se a Folha não se incomoda em que a Vale – segundo ela, empresa privada também, embora o estado tenha a maioria das ações do consórcio controlador – faça navios lá fora, é estranho que se incomode com o fato de a OSX fazê-lo. E, como se viu, nem é o caso.
Bom, sobram então, dos 15 equipamentos utilizados no gráfico que ilustra a matéria, 11 equipamentos pertencentes à Petrobras, e só três deles  feitos no exterior: a TLP-61 e os navios-plataforma (FPSO) Santos e Angra dos Reis.
E por que? Os dois FPSO foram comprados porque se destinam aos sistemas definitivos de exploração dos campos de Tupi e Lula, os primeiros do pré-sal. Eles substituem outros, afretados no exterior, que fizeram os testes de longa duração, mas que não têm capacidade de suportar o megavolume – 100 mil barris/dia – que os poços terão na sua operação comercial.  Foi, portanto, uma opção de velocidade na entrada de operação do pré-sal.
Opção que, de forma alguma, substitui ou reduz o empenho da Petrobras em desenvolver a indústria naval e petrolífera nacionais. Tanto que os FPSO apontados como tendo “parte nacional, parte estrangeira” são, na sua maioria, cascos comprados e reformados estruturalmente no exterior – eles têm previsão de ficarem ancorados no poço por 20 anos, não podem vir á terra para pequenos reparos – e convertidos aqui em navios-plataforma. O P-58 está no Estaleiro Estaleiro Rio Grande – que vai fazer oito outros FPSO, chamados “replicantes” – e o P-52 no Estaleiro Atlântico Sul, em Pernambuco. Lá, também, será sendo feito o “Cidade de São Paulo”, que tem apenas o casco importado da China.
Aliás, uma das características comuns a muitos navios-plataforma do tipo FPSO é serem construídos, por opção econômica, a partir de cascos de antigos navios petroleiros de grande capacidade – os chamados VLCC, Very Large Crude Carriers – que não são mais competitivos como navios de longo curso mas que se prestam perfeitamente – por sua enorme capacidade de tanques -  à operação quase estacionária de um navio-plataforma. Daí a necessidade de reforma do casco, em geral em dique seco, para reforçar suas características estruturais. O complexo não é o casco, mas a construção de uma plataforma de petróleo sobre ele.
E a TLP-61? É simples, é uma plataforma de um tipo diferente, pioneira no Brasil. E não está sendo feita no exterior, não.  Está sendo feita no Estaleiro Brasfels, em Angra dos Reis.
Mas, como é uma plataforma de outro tipo, diferente de todas já utilizadas pela Petrobras, a execução do projeto implicará a utilização de uma balsa especial para a etapa de mating (acoplamento do casco ao convés). A balsa existente no Brasfels, utilizada na construção de P-52, P-51 e P-56, não se encaixa à P-61, por que a  distância entre  suas colunas é menor do que em plataformas semissubmersíveis, como as que usa a Petrobras.  Assim, a nova balsa será construída no estaleiro da Keppel Fels em Singapura, junto com uma parte do convés e dos topsides da plataforma, que chegam ao estaleiro brasileiro no fim deste ano.
Agora, se a Folha se preocupa tanto com a questão da nossa capacidade de construir aqui plataformas para a exploração de petróleo, ao ponto de dedicar uma capa do caderno de economia à nossa “incapacidade” de fazê-las, porque dedicou, no dia da inauguração da P-52, no início deste mês, a plataforma com maior índice de nacionalização já alcançado (73%), apenas dois parágrafos de uma pequena matéria, como voc~e pode ver na reprodução publicada aí ao lado?
Seria isso o que o neoacadêmico Merval Pereira disse outro dia, desqualificando os blogs, a “capacidade de hierarquizar a notícia” da grande mídia?