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segunda-feira, 25 de maio de 2015

TIJOLAÇO: MORO É “INCENTIVO FISCAL” PARA EMPREITEIRAS ESTRANGEIRAS

Marco Aurélio Carone: Relatório do Banco Mundial mostra que capital internacional financiou “choque de gestão” de Aécio


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O então governador Aécio Neves com John Briscoe, ex-diretor do Banco Mundial para Brasil e América Latina, 8 de dezembro de 2008, no Palácio da Liberdade. Foto Wellington Predro/ImprensaMG
por Marco Aurélio Carone, especial para o Viomundo
Na reportagem “Choque de gestão: dívida de R$ 80 bilhões e Estado quebrado”, publicada no Brasil de Fato em outubro de 2014, o economista Fabrício de Oliveira, autor de vários livros sobre economia brasileira e finanças públicas, entre os quais Dívida Pública do Estado de Minas Gerais: A Renegociação Necessária, afirmou:
“O ‘choque de gestão’ de Aécio Neves (PSDB), quando governador de Minas Gerais, não passou de uma jogada de marketing.
O governo vendeu a falsa ideia de haver acertado as contas do estado de Minas Gerais e atingido o déficit zero.
O slogan ‘déficit zero’, que é um pilar do programa choque de gestão, é uma ideia falsa.
“Em momento algum o governo de Minas conseguiu organizar as contas. Entre 2003 e 2010, o governo teve déficit em todos os conceitos. Atualmente, a Dívida Consolidada Líquida (DCL) está em mais de R$ 9 bilhões – saltou de R$ 70,4 para R$ 79,7, em apenas um ano. O valor corresponde a 185% da Receita Corrente Líquida (RCL)”.
O tão falado “choque de gestão”, adotado pelo PSDB mineiro, resultou ainda em: congelamento de salários do funcionalismo público, em 2003; queda de 5% no poder aquisitivo dos servidores; extinção de benefícios previdenciários; e contingenciamento de 20% das despesas públicas, reduzindo, principalmente, os recursos para políticas sociais.
O tema sempre foi tema polêmico, e as críticas a esse modelo de administração invariavelmente se restringem à sua ineficiência. Porém, Relatório do Banco Mundial, editado em julho de 2014, em pleno período eleitoral, revela que o Banco ajudou a criar, implantar e financiar o “choque de gestão”, e ainda a sua preocupação em relação à alternância do poder em Minas Gerais.
Na época, o documento foi distribuído a conglomerados financeiros, empresas multinacionais e investidores internacionais.  E mesmo após a eleição da presidenta Dilma Rousseff e a derrota do PSDB para o PT em Minas, ele nunca foi divulgado amplamente pela mídia, embora possa ser achado no site do Banco Mundial, em meio a programas e projetos.
Integrante do Sistema de Bretton Woods, do qual fazem parte também o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD), o Banco Mundial é a sua instituição financeira.
Para começar, o Relatório do Banco Mundial comprova que as declarações do economista Fabrício de Oliveira sobre o “choque de gestão” estavam certas.
O relatório traz à tona, além dos valores investidos pelo próprio Banco Mundial que alcançam a cifra de US$ 1,607 bilhão, as estratégias adotadas.  Para o Banco, Aécio Neves serviria de garoto-propaganda e Minas Gerais, de vitrine para o novo modelo financiado pelo capital internacional.
A afirmação de que o “choque de gestão” foi financiado pelo capital internacional pode parecer forte, mas o que ocorreu foi um pouco pior.  Além de utilizar o Estado de Minas Gerais e sua máquina pública, como tubo de ensaio, os valores investidos estão sendo cobrados como dívida do erário mineiro.
O relatório assusta diante da declarada e comprovada ingerência de um organismo internacional na máquina pública e nos poderes, uma vez que toda a legislação criada para dar sustentação ao “choque de gestão” foi fruto de “Autorizações Legislativas”
Ou seja, o Poder Legislativo de Minas Gerais delegou suas atribuições para que o executivo legislasse em seu nome. Tal anomalia não ocorreu nem mesmo em pleno regime militar após o golpe de 1964.
A íntegra do relatório está no final. Seguem os pontos mais polêmicos. Eles são textuais e estão em itálico.
“3. O Banco [Mundial] tem apoiado o Governo de Minas desde 2006 por meio de uma série de parcerias (Minas Gerais Partnership Series). A primeira operação da série —  Minas Gerais Partnership for Development DPL (P088543) –, no valor de US $ 170 milhões, foi em 2006. Seguiu-se  a Minas Gerais Partnership II SWAp (P101324), um projeto multissetorial de US $ 976 milhões, que foi complementada em 2010 por um Financiamento Adicional (P119215) de US$ 461 milhões. Essas operações foram seguidas pela atual, de 2012. O Banco também desempenhou papel importante de assistência técnica, colaborando frequentemente para o ajuste fino do Choque de Gestão e em programas setoriais”.
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Os três empréstimos concedidos pelo próprio Banco Mundial somam US$ 1,607 bilhão, valot citado um pouco antes.
“5. O Choque de Gestão e suas fases subsequentes impactaram em todas as áreas da gestão econômica e administrativa do Estado. Todas as operações das séries de parcerias  tiveram apoio dos diversos órgãos públicos envolvidos. O sucesso de Minas Gerais, começando com o Choque de Gestão, foi crucial  para conduzir a recuperação econômica do Estado, bem como a melhoria da prestação de serviços. Com efeito, transformou Minas de Estado falido, mal gerido e ineficiente em um Estado responsável do ponto de vista fiscal, com um modelo de gestão inovador. É considerado ‘padrão ouro’ de gestão do setor público no Brasil e no mundo”.Banco Mundial 2-001
Mais assustador é descobrir pelo Relatório do Banco Mundial que temas como segurança pública e salário dos professores mineiros deixaram de merecer investimentos por compromisso com organismo internacional.
“8. No momento da preparação da operação, o Governo de Minas Gerais (GoMG) fez um ajuste  fiscal adequado, incluindo o seu programa de despesas e suas relações fiscais com o Governo Federal. Apesar desse cuidado, a receita pode ficar aquém das expectativas devido à projeção das despesas excederem, a médio prazo, o crescimento de receita e o risco de queda dela. Uma preocupação particular do lado da despesa foi o aumento, a médio prazo, da massa salarial direcionada aos professores e à segurança pública”.Banco Mundial 3
Além do US$ 1,607 bilhão investido pelo próprio Banco Mundial, o Banco atuou na busca e aprovação de dois outros empréstimos.  Um, de € 300 milhões, da Agence Française de Développement (AFD ), e outro, de US $ 1,3 bilhão, do Credit Suisse. Os dois empréstimos foram para o governo mineiro pagar antecipadamente a sua dívida com a Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig). Essas interferências demonstram claramente os interesses internacionais nesta até agora inexplicável operação.
“14. Alavancagem de recursos externos. O pedido inicial do Estado [Minas Gerais] ao Banco [Mundial] foi um empréstimo de cerca de US $ 2 bilhões. Enquanto o Banco não pode disponibilizar esse montante com recursos próprios, ele trabalhou com o Estado para desenvolver soluções alternativas. Durante os preparativos da operação de empréstimo, o Banco Mundial forneceu aconselhamento e orientação sobre a possível estruturação de refinanciamento e explorou várias opções, incluindo garantias de empréstimos do setor privado.
A solução final envolveu uma operação de financiamento paralelo da Agence Française de Développement (AFD) e do Credit Suisse para refinanciar a dívida da Cemig. AFD concedeu um empréstimo de € 300 milhões, com base em um programa supervisionado de perto pelo Banco Mundial, enquanto o Credit Suisse emprestou US$ 1,3 bilhão.
O pacote de refinanciamento foi um dos primeiros em que um governo estadual no Brasil, desde a instituição da Lei de Responsabilidade Fiscal, tomou emprestado recursos de um credor privado externo sem a garantia de uma agência de desenvolvimento bilateral ou multilateral.
Neste sentido, uma importante inovação facilitada pela operação do Banco Mundial. Representou retorno ao financiamento de mercado para o Estado de Minas Gerais, dando exemplo para outros estados”.
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 Ou seja, o pacto Federativo foi quebrado de maneira consciente pelos governantes de Minas Gerais e pelo Banco Mundial, desrespeitando a Lei de Responsabilidade Fiscal, sem qualquer consequência.
O relatório diz também que Minas Gerais era a vitrine para o modelo que o Banco Mundial auspiciaria ver implantado em outros Estados do Brasil.
“11. Alavancagem de um modelo de gestão do Estado baseado em resultados bem-sucedidos  como um exemplo para outros estados. O objetivo desta operação foi dar suporte para as reformas implementadas pelo Governo de Minas de Gerais (GoMG) e desenvolver soluções para melhorar o desempenho do setor público e de prestação de serviços e que podem ser usadas em outros estados e países.
Desde 2006, o Banco [Mundial] tem o compromisso de apoiar a evolução desses resultados inovadores com base no modelo de gestão. Por meio das Partnership Series, o Banco Mundial tornou-se um dos principais interessados na implementação exitosa do  Choque de Gestão. O sucesso das reformas do setor público em Minas Gerais provou ser um importante modelo de demonstração contínua e útil dos efeitos para os estados brasileiros e outros países que enfrentam problemas de desenvolvimento semelhantes.
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No Relatório, o Banco Mundial diz que trabalhou com o Estado de Minas Gerais para obtenção do financiamento para quitar antecipadamente dívida com a Cemig.
O US$ 1,607 bilhão do Banco Mundial somado ao US$ 1,3 bilhão do Credit Suisse  e aos € 300 milhões da AFD totalizam R$ 9,8 bilhões. Ou seja, quase 10% do total da dívida atual do Estado de Minas Gerais, que está em R$ 93,7 bilhões. A dívida do Estado de Minas passou de R$32,9 bilhões, em 2002, para R$79,7 bilhões, em 2013.
O próprio Banco reconhece no documento que a repercussão do “choque de gestão” teve sucesso, porque foi fruto de pesado investimento em comunicação.
“24. A equipe do Banco [Mundial] trabalhou em estreita colaboração com a Agence Française de Développement (AFD), que preparou o financiamento paralelo de € 300 milhões para apoiar a redução das desigualdades sociais e regionais no Estado de Minas Gerais. A operação AFD também teve formato de apoio ao orçamento e foi baseada em estratégia do Governo de Minas  para ampliar a cobertura de infraestrutura básica e habitação nas regiões mais pobres do Estado.
A operação AFD apoiou o refinanciamento da dívida do Estado com a Cemig.
Embora o contrato não inclua o suporte para amplas reformas da administração pública, a AFD reconheceu os avanços feitos pelo GoMG com o apoio do Banco Mundial e a importância do programa de reforma atual.
Como resultado, a aprovação da operação AFD foi condicionada à aprovação pelo Banco Mundial. Além do empréstimo de  300 milhões da AFD, por um prazo de 20 anos, o Credit Suisse — escolhido em um processo competitivo com outros bancos privados– forneceu US $ 1,3 bilhão por um prazo de 15 anos e período de carência de cinco anos para refinanciar a dívida Cemig.
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 O Relatório do Banco Mundial descreve detalhadamente onde os valores emprestados foram aplicados. Assim, numa análise mais apurada do documento verifica-se que os R$ 9,8 bilhões concedidos pelo Banco Mundial, AFD e Credit Suisse não resultaram em obras, melhorias ou qualquer beneficio concreto para Minas Gerais. 
Os R$ 9,8 bilhões foram utilizados em campanhas publicitárias, convênios com ONGS, OSCIP e pagamento antecipado de dívida do Estado de Minas Gerais com a Cemig. Essa antecipação de recursos gerou caixa para que a Cemig alterasse seu objetivo. De companhia destinada a servir aos mineiros, a Cemig passou a ser sócia do capital internacional em projetos de alto risco, através das 208 subsidiárias integrais, 20 consórcios e 2 FIPs (Fundo de Investimento em Participação).
Relatório diz que os empréstimos concedidos pelo Banco Mundial ao governo de Minas Gerais para “promover oChoque de Gestão” — somam US$ 1.607 bilhão, ou seja, R$ 4.891 bilhões –foram usados para promoção do que representou a plataforma política de Aécio Neves.
Contudo, o crime maior está no fato de Relatório sugerir risco caso houvesse mudanças na direção do Estado nas eleições de 2014. O Banco Mundial  demonstra clara preocupação em relação à alternância de poder em Minas Gerais, sinalizando tomada de partido. Afinal, foi editado em pleno período eleitoral, e disponibilizado para conglomerados financeiros, empresas multinacionais e investidores internacionais que aplicam em Minas Gerais.
“63. O Choque de Gestão e o acompanhamento das mudanças foram apoiados pelo altíssimo escalão do governo.  Com as eleições agendadas para outubro de 2014, há possibilidade de mudança de prioridades políticas que poderiam se afastar do processo anterior de e/ ou diminuir o modelo de gestão de Minas Gerais. No entanto, o mais provável é que, se as prioridades da política mudarem, o modelo, que agora está bem estabelecido, seria usado para implementar essas mudanças. Por outro lado, espera-se que o próximo governo siga as prioridades do seu antecessor e continuará com o processo de reforma”. 
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 Após 2002, os pedidos de empréstimos do governo de Minas a bancos privados e instituições de fomento, a maioria estrangeiros, somaram até julho de 2014 quase R$ 20 bilhões. Ao todo, 39 leis autorizaram o Executivo a contratar esses valores nos últimos 12 anos. Desse montante, mais de R$ 16 bilhões já contratados. 
A política de contratação de empréstimos, ao contrário do que afirma o Relatório do Banco Mundial, desmontou o “choque de gestão”. Com o endividamento crescente nos últimos 12 anos, o déficit zero não foi alcançado. Pelo contrário, Minas se tornou o segundo Estado mais endividado do país, com uma dívida consolidada de R$ 79,7 bilhões em 2013. Atualmente, está em R$ 93,7 bilhões.
O governo de Minas utilizou R$ 4 bilhões desses empréstimos para quitar parte do que devia à Cemig. A troca de dívidas, porém, não teria sido um bom negócio, segundo a coordenadora da ONG Auditoria Cidadã, Maria Eulália Alvarenga. “Inicialmente a dívida era de R$ 600 milhões, no final de 2011 foi para R$ 5 bilhões, então multiplicou mais de nove vezes”, disse. De acordo com ela, o governo realizou uma troca de dívidas, ao pegar os empréstimos com os bancos privados e instituições de fomento.
O problema é que os empréstimos não foram suficientes para quitar todo o débito do Estado de Minas com a Cemig. A dívida interna foi trocada uma dívida por uma externa em dólar. Além disso, essa dívida não é transparente, pois ninguém consegue explicar como ela multiplicou nove vezes de 1998 a 2010, época do pagamento.
Resta saber se o atual governo de Minas, Fernando Pimentel (PT), determinará  uma auditoria na operação da Cemig e na dívida externa do governo mineiro, descontando os valores dos empréstimos gastos na implantação e divulgação do “choque de gestão” e que tiveram o objetivo claro de transformar Minas Gerais em um tubo de ensaio.
Se o Banco Mundial achou interessante investir neste projeto e utilizá-lo como propaganda para seus interesses nada mais justo do que ele pague a conta. Isso sem prejuízo da análise dos crimes de lesa pátria praticados por colaboracionistas na ingerência de um organismo multilateral na política de um Estado federado.