Mente vazia, oficina do sistema da mídia golpista

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segunda-feira, 9 de junho de 2014

SP: o espírito de 32 em 2014

A alta finança hoje é a cafeicultura do século XXI. Vencê-la implica desmontar sua dominância sobre o desenvolvimento. E romper limites impostos à democracia.

por: Saul Leblon 
Arquivo
O PSDB  governa o Estado de São Paulo há 20 anos.

Mário Covas foi eleito governador em 1994, seis anos depois de criada a sigla que completa 26 anos de existência  neste 25 de junho.

Geraldo Alckmin, o plantonista atual do bunker concorre à reeleição em outubro, depois de ter participado diretamente de quatro das cinco gestões tucanas no estado.

Alckmin foi vice de Covas em 1994 e 1998.

Em 2001 assumiu o governo com a morte de Covas.

Emendou o terceiro ciclo à frente do estado em 2002, eleito governador.

Feito que repetiria em 2010.

Está na sua quarta passagem pelo poder, que  encerra pleiteando a reeleição para um 5º mandato em outubro.

No interregno de 2006 a 2010, quando não esteve diretamente no comando do governo, Alckmin assumiu a secretaria de Desenvolvimento do estado na gestão Serra.

Duas décadas no poder e 44% de intenções de voto para o pleito estadual de 2014, (a se dar crédito ao Datafolha do último sábado),  não é algo que se possa menosprezar.

O desconhecimento em relação aos demais candidatos  pesa significativamente a favor de Alckmin.

Padilha (PT) é um nome novo na política.

O fato de estar há tanto tempo no rodízio dá ao tucano uma aura de ‘normalidade’ em tempos de sobressalto e inquietação.

O sentimento, porém, possivelmente  fosse o oposto, se o dispositivo midiático conservador não tornasse difuso aquilo que é estrutural.

Ou seja, as duas décadas de autodeclarada  proficiência administrativa  do PSDB em São Paulo não se traduziram em bem-estar social efetivo para o conjunto dos paulistas.

Na realidade, elas refletem mais a conveniência  da plutocracia brasileira,  que fez do estado sua  linha Maginot, do que a consagração de uma obra democrática.

Em parte, é o que explica a renitente presença desse insípido, mas fiel gerente do comodato do dinheiro grosso no poder estadual.

Nenhum outro quadro dirigente do PSDB de São Paulo esteve tão presente  no ciclo de escândalos da Alstom, marca registrada do caixa 2 tucano na gestão do metrô paulista, quanto Geraldo Alckmin.

A julgar pelos relatos do próprio oligopólio associado às encomendas do metrô, o intercurso entre o cofre das empresas e o caixa pessoal e coletivo do tucanato começou em 1998, quando ele era vice de Covas.

E não parou mais de fluir.

Entre 1998 e 2001 sabe-se, graças às investigações realizadas pelo Ministério Público da Suíça, que pelo menos 34 milhões de francos franceses foram pagos em subornos  a autoridades  tucanas, na lubrificação de contratos do metrô.

Com a morte de Covas, em 2001, Alckmin assumiu o comando desse comodato. E se manteve à frente dele até 2006.

Seria injusto atribuir-lhe a exclusiva liderança do processo.

No  período de negociação de alguns dos grandes  contratos de transporte e energia o então genro do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, David Zylbersztajn, dirigia  a pasta de energia da gestão Covas e Alckmin (deixou o cargo em janeiro de 1998 para assumir a direção geral da Agência Nacional do Petróleo).
 
O serrista Mauro Arce comandava a de Transportes. Andrea Matarazzo bordejava o circuito.

Assim por diante.

Nada disso  retira de  Alckmin o que é de Alckmin.

Um contrato de R$ 223,5 milhões com a Alston, para a compra de 12 trens, foi assinado em 28 de dezembro de 2005.

Sem licitação.

Alckmin era o governador.

Um total de 139 contratos assinados entre a Alstom e o Governo do Estado de São Paulo nos últimos anos (governos  Serra e Alckmin) ,no valor  de  US$ 4,6 bilhões, está sob suspeita.

As investigações na justiça paulista se arrastam, em que pese o esforço solitário do ministério público suíço.

Sempre discreto, semi-invisível  tanto quanto a obra, Alckmin é um dente da engrenagem que move os interesses comuns do dinheiro e do PSDB no grande diretório do capitalismo brasileiro em que se transformou  o aparato estatal bandeirante.

A dissociação entre esse aparato  e o interesse público pode ser medida pelo hiato entre as promessas do tucano na campanha vitoriosa de 2010 e o saldo efetivo deste final de mandato.

Alckmin entregou então aos paulistas um compromisso sortido, cravejado de números suculentos.

Entre eles, o de construir 150 mil moradias, promover um salto no transporte público e na saúde, construir  12 piscinões em São Paulo etc.

Quatro anos depois, sobrou o quê?

Em janeiro de 2014 Alckmin comunicou que mudara de ideia em relação aos piscinões.

Desistiu, alega,  a partir  de cálculos hidrológicos que indicariam a suficiência de uma ‘otimização’ das instalações existentes.

Dos 12 piscinões prometidos, três foram feitos, outros dois estão em obras.

A meta de oferecer 150 mil moradias às faixas de renda mais pobres ostenta frustração igualmente grave.

Em 2013, a construção de unidades populares pelo governo estadual registrou queda de 80% na capital.

Isso num ano em que explodiram as ocupações de edificações públicas e privadas pelos sem-teto na cidade.

Das 150 mil unidades previstas,  seu governo entregou até agora  55.483 moradias.

Estamos falando da prioridade habitacional do PSDB no estado mais rico da federação, que tem um déficit de 1,11 milhão de moradias  --o maior do Brasil em termos absolutos.

Mesmo no confronto com seus pares, o desempenho  de Alckmin  é derrisório.

Em 1998, por exemplo, o então governador  Covas (PSDB) construiu, no ano, o equivalente próximo da marca que Alckmin atingirá ao longo de toda a sua quarta passagem pelo Estado (52.167 unidades).

Na área da saúde é sugestivo dizer que São Paulo receberá um dos maiores contingentes do Programa Mais Médicos: 1.279 profissionais vão atender a 7,2 milhões de moradores desassistidos do estado.

O corolário do modo Alckmin de governar  é o atual uso do ‘volume morto’ do sistema Cantareira –último recurso antes do racionamento oficial , presente na vida cotidiana de vários bairros da capital.

São Paulo vive a estiagem mais severa desde 1930. Ademais da exacerbação climática, porém, há o efeito cumulativo da contradição estrutural entre a lógica do poder bandeirante e as questões do interesse coletivo.

O abastecimento de São Paulo se apoia no mesmo fluxo de mananciais interligados ao final da década de 70, meados dos anos 80.

A população de São Paulo dobrou no período.

Nas últimas duas décadas, a curva demográfica conviveu com administrações que não se anteciparam  ao colapso implantando a infraestrutura capaz de evitá-lo.

O flanco do abastecimento de água foi escancarado pela estiagem.

Outros, de gravidade equivalente, caso da mobilidade urbana simbolizada na expansão de um metrô que se arrasta como uma lesma, ou do déficit habitacional, para não citar o desempenho constrangedor da rede estadual de ensino, inscrevem  as marcas da ineficiência no cotidiano sofrido da sociedade.

São Paulo tem 3% do território brasileiro, 22% da população e 33% do PIB nacional.

Há 84 anos, no bojo de uma crise mundial capitalista , que esfarelou os preços das matérias-primas e destroçou a inserção brasileira no mercado mundial, o poder da oligarquia  paulista foi afrontado  por Vargas.

A política centralizadora e industrializante de Getúlio  sacudiu o chão das oligarquias estaduais, especialmente o da mais sólida delas, em São Paulo.

O governo Vargas reconheceria oficialmente os sindicatos dos operários, legalizaria o Partido Comunista e adotaria uma política de direitos e valorização do salário dos trabalhadores.

O amparo de Getúlio à cafeicultura, com a política de compra e queima de estoques, combinou-se com um manejava  do  câmbio, de forma a capturar um pedaço da receita exportadora, como se fora um imposto sobre as vendas do setor.

O circuito do dinheiro, o quanto, como e onde aplicar deixou de ser prerrogativa exclusiva das elites paulistas e assemelhadas.

A sublevação de São Paulo em 1932 refletia esse desacordo travestido de ideais liberais democráticos.

A tentativa derrotada de 1932 iria se repetir ao longo da história.

Sempre que um governante tentou sobrepor os interesses gerais do país à lógica do dinheiro graúdo concentrado em São Paulo, a elite local reagiu. 

São Paulo perdeu importância produtiva desde então, mas se mantém como o bunker financeiro do capitalismo  brasileiro.

A alta finança é o café atual.

O que significa, paradoxalmente, deter um poder de fogo em relação à esfera  federal e ao resto da economia muito superior ao disponível no ciclo da cafeicultura e mesmo  no seu auge como ‘a fábrica’ do país.

Para a plutocracia paulista e parte da classe média ter um governante do PSDB à frente do aparelho de Estado não é uma questão da democracia, mas  de fortificação de uma trincheira desse privilégio.

O governo Vargas, apesar do levante de 1932 – esmagado em três meses--  sustentou uma política de compromisso com os grupos cafeicultores, garantindo-lhes uma taxa de retorno em plena crise mundial.

Mutatis mutandis, os governos do PT fizeram o mesmo ao garantir ao setor industrial paulista, e à banca aqui centralizada,  uma demanda aquecida por bens de consumo e crédito, em pleno colapso da ordem neoliberal no mundo.

A exemplo do que ocorre hoje, nem por isso a oligarquia de São Paulo deixou de conspirar contra Vargas e contra a lógica de desenvolvimento que ele personificou.

Trinta e dois anos depois  de 1932, ela conseguiria finalmente, em março de 1964, atingir seu objetivo:  abortar as fundações de uma democracia social no país que subtrairia o seu mando o sobre o dinheiro e a nação.

Em 1964, os vapores constitucionalistas  de 32 revelariam sua frágil densidade liberal.

Sobreveio em seu lugar uma ditadura feroz, que derrubou um governo legitimamente exercido por um Presidente reformista e democrático.

Essa mesma lógica explica por que  –mesmo menosprezando Alckmin—essa mesma elite hoje cerra fileiras na sua reeleição. 

Poupando-o  do que efetivamente significa em termos de mediocridade administrativa.

E esbanjando complacência diante de seus vínculos incontornáveis  com a malversação tucana dos fundos públicos em São Paulo.

Quem já sobrepôs a  baioneta ao voto para defender seus interesses de classe não vê dificuldade alguma em dar a esse  rebaixado  funcionário um quinto ciclo à frente do comodato de negócios que se incrustou no poder público estadual.

Vencer esse arranjo de forças encastoado em São Paulo vai além das urnas.
 
Requer, simultaneamente, desmonta-lo na dimensão superior do seu poder.

Vale dizer,  na dominância financeira sobre o desenvolvimento brasileiro.

E nos limites estreitos impostos ao exercício da democracia e ao fluxo da informação no país.

Essa dimensão do poder paulista será enfrentada no escrutínio presidencial de outubro. 

Não imagine na Copa, porque ela é uma realidade

holandesa
Tomei um avião, hoje de manhã, do Rio para Brasilia.
Duas cidades-sede da Copa.
Tranquilidade completa.
O avião era da Azul, destes que tem TV a bordo.
Assisti, portanto, o esforço da Globo em tentar mostrar algum problema na estrutura de recepção aos estrangeiros.
Nada, a não ser a greve do metrô de São Paulo, que espantou uma turista canadense.
Mas que rapidamente ficou satisfeitíssima com uma senhora, brasileira, que lhe ofereceu carona.
Durante anos você ouviu o “imagina na Copa” para figurar o desastre que seria o desempenho do Brasil como anfitrião.
Conversa fiada.
Claro que pode ocorrer um problema aqui, outro ali, um assalto, coisas que se passam em qualquer parte do mundo.
Nosso país sofreu, por parte de uma mídia e uma elitezinha subdesenvolvida mentalmente, uma campanha indescritível de desmoralização.
A história dos gastos públicos é igual.
Recomendo a leitura do post de Rodrigo Vianna, onde um colunista esportivo dizia que não se justificava combater a ideia de uma Copa no Brasil com “o velho argumento de que é melhor construir escolas e hospitais é falso”.
Dizia isso, claro, nos anos 80.
A melhor história  do dia, para mim, é a da “desorganização padrão Fifa” da Seleção Inglesa, que esqueceu um jogador no hotel.
E a melhor imagem é a da torcedora holandesa, feliz da vida diante de sua barraca do “acampotel” montado para torcedores de seu país num clube de funcionários da Eletropaulo, perto da Represa de Guarapiranga, uma tradição da torcida laranja.
Barracas de plástico e camas de pinho!
Imagina na Copa!
Depois reclamam do Lula ter falado em babaquice…

Eric Nepomuceno: No ar, um movimento desestabilizador; estaria o mercado financeiro por trás dessa jogada?





Coisas estranhas no Brasil
Existe um inegável mal-estar generalizado, palpável no ar. Há um crescente pessimismo com a economia. E aí começam a aparecer estranhezas.

por Eric Nepomuceno, na Carta Maior

As eleições acontecerão em outubro, a campanha oficial começa no rádio e na televisão em agosto, mas as pesquisas saltitam a cada quinzena, ou quase. Se o eleitorado parece desinteressado, o empresariado parece, mais que interessado, ansioso, inquieto.

As pesquisas mais recentes, do Datafolha, indicam que Dilma Rousseff retomou seu viés de queda. Isso, claro, é destacado no noticiário. O que ninguém parece lembrar é que seus dois principais adversários, o tucano Aécio Neves e Eduardo Campos, do PSB, também caíram.

Dilma havia recuperado terreno em pesquisas anteriores, e agora tornou a cair. Uma questão nebulosa: se ela retrocede e os outros não avançam – pior: também recuam –, onde foram parar os votos perdidos? Por que nenhum dos dois netos, cujos avôs são a principal garantia de suas trajetórias, é beneficiado?
Tudo indica que a maior surpresa foi o forte aumento dos que declaram que seu voto será nulo ou em branco, e também dos que se declaram indecisos. Nesses quesitos, houve uma reviravolta em comparação às pesquisas anteriores.

Existe um inegável mal-estar generalizado, palpável no ar. Há um crescente pessimismo com a economia. E aí começam a aparecer estranhezas.

Por exemplo: muito se martela a nota de que vivemos debaixo de forte pressão inflacionária. Essa campanha persiste e se alastra, apesar de os índices mostrarem o contrário (desde meados de março a taxa de inflação vem baixando de maneira constante). Ao mesmo tempo, fala-se que aumentou o temor a perder o emprego, apesar dos índices de desemprego continuar baixos.

Há contradições e incongruências entre os próprios entrevistados, tanto nos resultados do Ibope como nos do Datafolha: a aprovação do governo de Dilma equivale à desaprovação. A imensa maioria (na média dos institutos, mais de 70% dos entrevistados) pede mudanças na forma de governar, mas um índice similar diz que sua vida melhorou e que estão satisfeitos. Há uma espécie de batalhão desnorteado, que se queixa de tudo e de qualquer coisa sem dizer exatamente de que se trata. De onde vem esse mal-estar, essa tensa irritação que impregna a atmosfera das grandes cidades brasileiras?

Não são poucos – nem necessariamente paranoicos – os brasileiros que sentem que, a cada semana, aumenta a sensação de que está em marcha um nebuloso, melífluo movimento desestabilizador. O que ninguém consegue é detectar quem está por trás, quem organiza, a que interesses esse movimento responde.
E no entanto, existe um dado que, se não dá resposta a essas questões, certamente dá o que pensar: a influência direta entre a divulgação dos resultados das pesquisas e as oscilações do mercado financeiro, que tem nos grandes meios de comunicação seu esforçado e eficaz porta-voz.

Desde 2002, quando Lula derrotou José Serra, essa sacrossanta entidade chamada mercado não padecia tamanhos ataques de ansiedade pré-eleitoral. A reeleição de Lula, em 2006, e a eleição de Dilma, em 2010, foram engolidas sem maiores esforços. Agora, o clima é outro, bem outro.

Não é sem razão que bancos, agentes, corretores e investidores gastam um bom dinheiro contratando pesquisas eleitorais para uso restrito. São pesquisas paralelas, e o sistema funciona assim: cada vez que um instituto anuncia que estará em campo fazendo entrevistas, instituições financeiras encomendam outra, sigilosa. Desta forma ficam sabendo, com um ou dois ou três dias de antecipação, qual será o resultado a ser anunciado. Como a cada queda (ou avanço) de Dilma ocorre invariavelmente uma alteração na Bolsa de Valores, uma oscilação no câmbio e outra na taxa de juros a futuro, ter uma indicação fiável desses dados significa uma boa oportunidade de especular e ganhar.

O empresariado brasileiro não gosta nem um pouco da política econômica de Dilma Rousseff. Os donos do dinheiro, menos ainda. Mas gostam de ganhar. E adoram especular.

Há algo estranho quando tantas greves se repetem e persistem, e mais ainda quando levadas adiante por minorias sindicais, como aconteceu no transporte público do Rio de Janeiro. A profusão de paralisações não faz mais do que ampliar o mal-estar e a irritação popular. Nota-se claramente que, insuflada pelos grandes meios de comunicação, em especial a televisão, essa irritação popular é direcionada aos políticos em geral e aos governos em particular. E, uma vez mais, Dilma é o alvo preferencial.

Nesse clima estranho, nessa atmosfera um tanto rarefeita, começa a Copa do Mundo. Haverá mobilizações de protesto, greves selvagens e sem norte, haverá de tudo um pouco, até mesmo futebol.
Serão tempos estranhos, e estranha será a caminhada daqui até as urnas de outubro.

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