Mente vazia, oficina do sistema da mídia golpista

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sábado, 7 de abril de 2012

VEJA, COMO É ASSOCIADO O JORNALISMO AO CRIME ORGANIZADO

Os mercados ensinam a austeridade aos jornalistas gregos

Os mercados ensinam a austeridade aos jornalistas gregos
A polícia não permitiu que ninguém se aproximasse do edifício do Parlamento, e agrediu, desferiu pontapés e esmurrou indiscriminadamente manifestantes e jornalistas. Os manifestantes protestavam contra o governo e homenageavam a memória do farmacêutico aposentado Dimitris Christoulas, que se suicidou na quarta-feira, “para não se ver obrigado a revirar lixo para assegurar o seu sustento”. Enquanto isso, governo deve adiar mais uma vez anúncio da data das eleições gerais.
Esquerda.net




O presidente do sindicato dos fotojornalistas gregos, Marios Lolos, foi submetido a uma cirurgia na cabeça devido às feridas sofridas por espancamento da polícia de choque grega. Segundo o sindicato, o jornalista sofreu traumatismo craniano que exigiu a intervenção cirúrgica.

Foi o segundo dia de ataques da polícia a repórteres da imprensa e da TV e a fotojornalistas, segundo relato do site informativo Keep Talking Greece.

A polícia não permitiu que ninguém se aproximasse do edifício do Parlamento, e agrediu, desferiu pontapés e esmurrou indiscriminadamente manifestantes e jornalistas. Os manifestantes protestavam contra o governo e homenageavam a memória do farmacêutico aposentado Dimitris Christoulas, que se suicidou na quarta-feira, “para não se ver obrigado a revirar lixo para assegurar o seu sustento”.

O local do suicídio de Christoulas, que tinha 77 anos, está agora coberto de velas, pequenas bandeiras e cartazes.

A polícia grega anunciou mais tarde que fará uma investigação interna acerca da agressão a Lolos e o comportamento violento para com os jornalistas.

Eleições ameaçadas
O governo não eleito grego prepara-se para adiar mais uma vez a marcação da data das eleições gerais a pretexto de ainda não ter conseguido chegar a acordo com os credores privados que não aceitaram a solução de troca de obrigações estabelecida com a maioria dos detentores privados de dívida grega.

A data deveria ter sido anunciada esta semana mas o porta-voz do governo, Pantelis Kapsis, anunciou quarta-feira que isso só acontecerá provavelmente na próxima semana.

Este cenário torna cada vez mais prováveis as possibilidades de as eleições, previstas vagamente para maio, depois de terem sido anunciadas inicialmente para fevereiro, serem adiadas sucessivamente com base nas alegadas dificuldades para finalizar o processo que permitirá finalmente a chegada a Atenas do segundo resgate nas condições impostas pela troika. Entretanto, o governo não eleito de Papademos vai impondo já o pacote de austeridade associado a esse resgate.

A conversão de 20270 milhões de euros correspondentes às dívidas aos credores que não aceitaram o processo de troca de obrigações, conhecido como « perdão » da dívida, deveria estar concluída em 11 de abril, o que já não acontecerá porque o governo de Atenas afirma que não tem meios para o fazer. A próxima data prevista é a de 20 de abril.

A chegada do segundo resgate já acordado está, porém, dependente também do acordo com os credores que não aceitaram «o perdão». E, segundo o entendimento do governo, a marcação de eleições só poderá acontecer quando esse processo estiver concluído.

A Grécia debate-se agora com três opções: continuar a pagar as dívidas aos credores que não aceitaram o processo, sobrecarregando os encargos que estiveram na base da definição do valor do resgate; entrar em moratória nesse setor, abrindo contenciosos; ou fazer uma nova proposta, o que obrigaria a reconverter todo o acordo com os restantes, gerando uma nova onda de encargos em relação aos cálculos como estão feitos actualmente.

A chegada do segundo resgate já acordado está, porém, dependente também do acordo com os credores que não aceitaram «o perdão». E, segundo o entendimento do governo, a marcação de eleições só poderá acontecer quando esse processo estiver concluído.

Este arrastamento começa a ser interpretado como um mau sinal da Grécia em direção aos restantes países europeus : o de que as consultas populares podem passar a ficar reféns de alegadas negociações ou manifestações de insatisfação dos mercados em relação ao cumprimento dos acordos de dívida. E num momento em que as intenções de voto das várias forças de esquerda gregas que querem rejeitar o memorando da troika, excluindo o PASOK que se converteu ao neoliberalismo, atingem 35 por cento, começa a haver receios de que as eleições continuem de adiamento em adiamento enquanto o governo não eleito vai impondo fatos consumados.

Uma delegação da Esquerda Europeia da qual fez parte o presidente do Die Linke da Alemanha, Gregor Gisy, e o presidente do Partido da Esquerda Europeia, Pierre Laurent, encontrou-se em Atenas com o presidente grego, Carolias Papoulias, a quem afirmou que apesar da opinião dominante nos governos e instituições europeias e da opção única pela política de austeridade existem outras vias, mais democráticas, para combater a crise social e econômica.

Alexis Tsipas, presidente da coligação de esquerda Syriza, afirmou durante a audiência que «a Grécia é um país soberano e que o povo grego tem o direito a definir o seu próprio destino ; e se alguns pensam em adiar as eleições é necessário que assumam as consequências dessa sua opção».

Na mesma audiência, o presidente do Die Linke afirmou que «é preciso ajudar este país», pelo que as próximas eleições poderão «representar uma mudança». «É preciso enviar uma mensagem à Europa», acrescentou, «é preciso mostrar o que queremos verdadeiramente: uma Europa da democracia e da justiça social».

Fotos: www.keeptalkinggreece.com

Santayana: a crucificação de Cristo e o suicídio em Atenas

 


O Conversa Afiada reproduz artigo de Mauro Santayana, extraído do JB online:

A crucificação de Cristo, o suicídio e a rebelião em Atenas


por Mauro Santayana


O homem que prenderam, interrogaram, torturaram, humilharam, escarneceram e crucificaram, na Palestina de há quase dois mil anos, foi, conforme os Evangelhos, um ativista revolucionário. Ele contestava a ordem dominante, ao anunciar a sua substituição pelo reino de Deus. O reino de Deus, em sua pregação, era o reino do amor, da solidariedade, da igualdade. Mas não hesitou em chicotear os mercadores do templo, que antecipavam, com seus lucros à sombra de Deus, o que iriam fazer, bem mais tarde, papas como Rodrigo Bórgia, Giullio della Rovere, Giovanni Médici,  e cardeais como os dirigentes do Banco Ambrosiano, em tempos bem recentes. O papa reinante hoje, tão indulgente com os gravíssimos pecados de muitos de sua grei, decidiu, ex-catedra, que as mulheres não podem exercer o sacerdócio.


Ao longo da História, duas têm sido as imagens daquele rapaz de Nazaré. Uma é a do filho único de Deus, havido na  concepção de uma jovem virgem, escolhida pelo Criador. Outra, a do homem comum, nascido como todos os outros seres humanos, em circunstâncias de tempo e lugar que o fizeram um pregador, continuador da missão de seu primo, João Batista, decapitado porque ameaçava o poder de Herodes Antipas. Tanto João, quanto Jesus, foram, como seriam, em qualquer tempo e lugar, inimigos da ordem que privilegiava os poderosos. Por isso – e não por outra razão – foram assassinados, decapitado um, crucificado o outro.


Um e outro tiveram dúvidas, segundo os evangelistas. João Batista enviou emissário a Jesus, perguntando-lhe se era mesmo o messias que esperava, e Cristo, na agonia, indagou a Deus por que o abandonava. Os dois momentos revelam a fragilidade dos homens que foram, e é exatamente nessa debilidade que encontramos a presença de Deus: os homens sentem a presença do Absoluto quando as circunstâncias o negam. João Batista sentia-se movido pela fé, ao anunciar a vinda do Salvador.


Era um ativista, pregando a revolução que viria, chefiada por outro, pelo novo e mais poderoso dos profetas. Ao saber que Cristo pregava e realizava milagres, supôs que ele poderia ser aquele que esperava, mas duvidou. Nesse momento, moveu-se pela esperança de que o jovem nazareno fosse o Enviado – o que confirmaria a sua fé. Cristo, na hora da morte, talvez levasse a sua dúvida mais adiante, e se perguntasse se a sua morte, que previra e esperara, serviria realmente à libertação dos homens – desde que salvar é libertar. O Reino de Deus, sendo o reino da justiça, é a libertação. Daí a associação entre essa felicidade e a vida eterna, presente em quase todas as religiões. Na pregação de Cristo, a libertação começa na Terra, na confraternização entre todos os homens. Daí o conselho aos que o quisessem seguir, e ainda válido – repartissem com os pobres os seus bens, como fizeram, em seguida, os seus apóstolos, ao criar a Igreja do Caminho. Se acreditamos na vida eterna, temos que admitir que a vida na Terra é uma parcela da Eternidade, que deve ser habitada com a consciência do Todo. Assim, a vida eterna começa na precariedade da carne.


Quarta-feira passada – quando em São João del Rei, em Minas, a Igreja celebrou o Ofício das Trevas no rito antigo – um grego, Dimitris Christoulas, chegou pela manhã à Praça Syntagma, diante do Parlamento Grego, buscou a sombra de um cipreste secular, levou o revólver à têmpora, e disparou. Em seu bilhete de suicida estava a razão: aos 77 anos, farmacêutico aposentado, teve a sua pensão reduzida em mais de 30%, ao mesmo tempo em que se elevou brutalmente o custo de vida. As medidas econômicas, ditadas pelo empregado do Goldman Sachs e servidor do Banco Central Europeu, nomeado pelos banqueiros primeiro ministro da Grécia, Lucas Papademos,  não só reduziram o seu cheque de aposentado, como o privaram dos subsídios aos medicamentos. “ Quero morrer mantendo a minha dignidade, antes que me veja obrigado a  buscar comida nos restos das latas de lixo” – escreveu em seu bilhete de despedida, lido e relido pelos que tentaram socorrê-lo, e que se reuniam na praça.


“Tenho já uma idade idade que não me permite recorrer à força –  mas se um jovem agora empunhasse um kalashinov, eu seria o segundo a fazê-lo e o seguiria”.


No mesmo texto, Christoulas incita claramente os jovens gregos sem futuro à luta armada, a pendurar os traidores, na mesma praça Syntagma, “como os italianos fizeram com Mussolini em Milão, em 1945”. O tronco do cipreste se tornou  painel dos protestos escritos. Em um deles, o suicídio de Christoulas é definido como um “crime financeiro”.


A morte de Christoulas, em nome da justiça, pode trazer nova esperança ao mundo, como a de Cristo trouxe. Não importa muito se ainda não foi possível construir o reino de Deus na Terra, e tampouco importa que o nome de Cristo tenha sido invocado para justificar tantos e tão repugnantes crimes. No coração dos homens de boa vontade, qualquer que seja o seu calvário – porque todos os homens justos o escalam, onde quer que nasçam e morram – a felicidade os visita quando comungam do sentimento de amor de Cristo pela Humanidade. Nesses momentos, ainda que sejam apenas segundos fugazes, habitamos o Reino de Deus.


Nunca, em toda a História, tivemos tanto desdém pela vida dos homens, como nestes tempos de ditadura financeira universal. Estamos vivendo vésperas densas de medo, mas dentro do medo, há centelhas de esperança. A morte do aposentado, quarta-feira de trevas, em Atenas, é, com toda a carga trágica de seu gesto,  partícula de uma dessas centelhas.


Estamos cansados de sangue, mas o que está ocorrendo hoje – teorizem como quiserem economistas e sociólogos – é a etapa seguinte do grande projeto dos neoliberais, que vem sendo executado sistematicamente pelos que realmente mandam no mundo e que assumiram sua governança (para usar o termo de seu agrado), mediante a Trilateral e o Clube de Bielderbeg, controlados, como se sabe, por meia dúzia de poderosas famílias do mundo. Esse projeto é o de dizimar, por todos os meios possíveis, a população, e transformar a Terra no paraíso dos 500.000 mais poderosos, ricos e eleitos, em oposição à utopia cristã. Mas é improvável que os pobres, que são a maioria, não identifiquem seu real inimigo, e se sacrifiquem, sem resistência, ao Baal contemporâneo – esse sistema financeiro que acabou com a antiga sacralidade da moeda, ao emitir papéis sem nenhuma relação com os bens reais do mundo, nem com a dignidade do trabalho. A força da mensagem do nazareno deve ser retomada: os oprimidos – negros, brancos, mestiços, muçulmanos, cristãos, budistas e ateus – devem compreender que os habita o homem, e não animais distintos, destinados à violência em proveito dos promotores da barbárie.


Ao expirar, depois de torturado, ultrajado seu corpo, humilhado, escarnecido, Cristo se tornou a maior referência de justiça.  Aos 77 anos, o aposentado grego, ao matar-se, transformou-se em bandeira que ameaça iniciar, na Grécia, novo movimento em favor da igualdade – a mesma idéia que levou Péricles a fundar o primeiro estado de bem-estar social, ao reconstruir Atenas, empregar todos os pobres, e dotar os marinheiros do Pireu do pioneiro conjunto de casas populares da História.


Vinte séculos podem ter sido apenas rápido intervalo – um pequeno descanso da razão.


Zero Hora, o golpe de 64 e a ditadura



Ao invés de publicar um artigo de um obscuro coronel defendendo o golpe e a ditadura, ZH deveria assumir a responsabilidade pelos seus atos e por sua história. Seguindo o estilo editorial que tanto aprecia poderia inclusive publicar um artigo a favor da posição do jornal pró-ditadura e golpe de 64 e um contra.

Em sua edição deste domingo, o jornal Zero Hora publica um artigo intitulado “A dita dura brasileira”, do coronel Sérgio Sparta, defendendo o golpe civil-militar de 1964. Na pretensão de “equilibrar” o debate, o jornal publica também um artigo contra o golpe, “Resgate ao passado”, da psicóloga Luciana Knjinik.

O artigo do coronel Sparta é inqualificável, repetindo uma retórica da Guerra Fria que fede à naftalina, para dizer o mínimo. O Brasil estava ameaçado pelo marxismo-leninismo, etc. Para defender a democracia e a liberdade de expressão, os militares e seus aliados civis acabaram com a democracia e a liberdade de expressão. Uma ofensa à lógica, à democracia e a inteligência alheia.

Zero Hora apresenta-se como supostamente “neutra” neste debate, simplesmente publicando uma posição a favor e outra contrária ao golpe. No dia do aniversário do golpe, o editorial do jornal silencia sobre o tema. O veículo do Grupo RBS que supostamente defende a democracia como um valor ainda acredita que o golpe de 64 e a ditadura que se seguiu a ele é “tema de debate” que pode ser tratado na base de um texto a favor e outro contra. Para ZH, aparentemente, a condenação das torturas e assassinatos cometidos pelos agentes da ditadura ainda é “tema de debate”.

ZH poderia ter aproveitado a data para explicar por que apoiou o golpe de 1964 e a ditadura, assim como fizeram vários outros grandes veículos da imprensa brasileira que nunca deram satisfações à sociedade sobre sua postura golpista e sobre os benefícios empresariais que obtiveram com ela.

Como é sabido, o jornal Zero Hora ocupou o lugar da Última Hora, fechado pela ditadura por apoiar o governo constitucional de João Goulart. A certidão de batismo do jornal, portanto, é marcada pelo desprezo à democracia e pela aliança com o autoritarismo, o que fala muito sobre o ethos editorial que a publicação viria a desenvolver.

Três dias depois da publicação do famigerado Ato Institucional n° 5 (13 de dezembro de 1968), ZH publicou matéria sobre o assunto afirmando que “o governo federal vem recebendo a solidariedade e o apoio dos diversos setores da vida nacional”.

No dia 1° de setembro de 1969, o jornal publica um editorial intitulado “A preservação dos ideais”, exaltando a “autoridade e a irreversibilidade da Revolução”. A última frase editorial fala por si: “Os interesses nacionais devem ser preservados a qualquer preço e acima de tudo”.

Os interesses nacionais, no caso, se confundiam com os interesses privados dos donos da empresa. A expansão da empresa se consolidou em 1970, quando foi criada a sigla RBS, de Rede Brasil Sul, inspirada nas três letras das gigantes estrangeiras de comunicação CBS, NBC e ABC. A partir das boas relações estabelecidas com os governos da ditadura militar e da ação articulada com a Rede Globo, a RBS foi conseguindo novas concessões e diversificando seus negócios. O restante da história é bem conhecido.

O autoritarismo que marcou o surgimento do jornal Zero Hora parece estar vivo ainda hoje na postura editorial arrogante e covarde que vem se especializando em terceirizar suas posições conservadores pela voz de terceiros. Ao invés de publicar um artigo de um obscuro coronel defendendo o golpe e a ditadura, ZH deveria assumir a responsabilidade pelos seus atos e por sua história. Seguindo o estilo editorial que tanto aprecia poderia inclusive publicar um artigo a favor da posição do jornal pró-ditadura e golpe de 1964 e um contra.

Marco Aurélio Weissheimer é editor-chefe da Carta Maior (correio eletrônico: gamarra@hotmail.com)

O cavalo grego quase trotou por aqui

*Grécia tem a segunda noite de protestos, após suicídio de aposentado que acusou o governo de agir como uma tropa de ocupação a serviço dos mercados** criação de emprego nos EUA perde fôlego em março, com geração de 120 mil vagas (metade do total de fevereiro)**recuo reforça percepção de que o Brasil não pode vincular seu crescimento à incerteza mundial**esquerda peronista  do grupo 'La Cámpora' tem o mesmo diagnótico dos desenvolvimentistas brasileiros e quer reindustrializar a Argentina: tarefa similar exige coordenação e complementariedade entre as duas economias, tarefa que os 'livres mercados' não farão, perdendo-se em disputas comerciais menores.

 

Na década de 1990,o Acordo Multilateral de Investimento era negociado na surdina, entre países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico, por iniciativa dos EUA e da União Européia, com cinco países observadores, entre eles o Brasil, então governado pelo consórcio demotucano.

O que está acontecendo na Grécia, país que perdeu parte significativa de sua soberania, tornando-se um laboratório para experimentos do capital financeiro, não pode ser atribuído a um raio num dia de céu azul ou a uma saída de emergência para salvar o capital dos credores, mesmo que o preço seja levar o país à falência. É produto de uma ação planejada há mais de duas décadas.

A presença permanente de uma equipe da troika (Banco Central Europeu, União Européia e FMI), monitorando o fluxo de empréstimos, a criação de uma conta vinculada destinada exclusivamente ao pagamento do serviço da dívida e aceitação que tribunais de Luxemburgo julguem dissídios, não cabendo ao governo grego qualquer tipo de recurso, são evidências de uma estratégia amadurecida ao longo do tempo. Trata-se de remover os entraves colocados pelo Estado-Nação e pela democracia à dinâmica capitalista que requer, em última instância, salários baixos e elevadas taxas de poupança. Pela capacidade do capital de evitar a tributação e condições empregatícias onerosas, através da livre movimentação para outros mercados, o sonho social-democrata se desfaz como uma carta antiga de Bernstein

Mas voltemos no tempo para irmos aos fatos.

Na década de 1990,o Acordo Multilateral de Investimento( AMI) era negociado na surdina, entre os países desenvolvidos da OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico), por iniciativa dos Estados Unidos e da União Européia, com cinco países observadores, entre eles o Brasil, então governado pelo consórcio demotucano.

O que vinha a ser esse documento pôde ser resumido numa frase de Renato Ruggiero, à época diretor-geral da OCDE: "Com este documento estamos escrevendo a Constituição de uma economia global Unificada". Assim, ficamos sabendo por que até 1997 as negociações da AMI eram secretas. Ou seja, o acordo não era conhecido nem pelos parlamentares dos países envolvidos. O sigilo era explicável se conhecermos algumas das condições contidas no documento.

O AMI era uma espécie de carta magna das corporações internacionais concebidas com o objetivo de vigência mundial, para respaldar suas atividades, por cima das instituições e constituições onde atuavam. Uma antecipação do cavalo de Tróia entregue à Grécia recentemente. Criava uma nação corporativa, virtual, acima das nações convencionais, movida por um único e superior motivo: o lucro do capital internacional.

Nos seus termos conhecidos, os investidores poderiam ingressar em qualquer área, setor ou atividade sem qualquer tipo de restrição, podendo contestar ações políticas ou governamentais, desde que entendessem que qualquer uma delas viesse a prejudicar seus lucros. Muito ao contrário, o governo deveria assegurar os investimentos externos e garanti-los contra tudo que pudesse afetar sua rentabilidade.

Os governos nacionais deixavam assim de ser guardiões de seus cidadãos e passavam a representar uma espécie de guarda pretoriana do capital externo. E, se não exercesse bem essa função,cada governo passava a ser responsabilizado para cobrir qualquer intervenção do Estado suscetível de reduzir a capacidade das corporações de obterem um lucro maior. E, vejam a terrível coincidência, quem escolheria o foro para tais litígios seria o grande capital, ficando o Estado sem qualquer status jurídico-político,sem poder negar o tribunal escolhido, nem submeter os litígios à arbitragem internacional.

Nesses temos, a nossa soberania (lembremos que eram os tempos de FHC), inclusive política, estaria num dos livros-caixa dos grandes conglomerados ou disquetes de organismos multilaterais de crédito. Estaria eliminado todo e qualquer sentido de autodeterminação e independência que ainda pudéssemos ter.

O aparente recuo foi meramente tático. O que vemos na Grécia é a implantação de um fundamentalismo de mercado incompatível com o sistema democrático. Repletos de volumosas estatísticas e modelos matemáticos arcanos que fornecem a ideologia para o estabelecimento de governos autocráticos, capazes de impor sua vontade a um povo com seus direitos fundamentais subtraídos.

Se tais fatos e manobras chegam a espantar pelo tamanho da queda imposto a países com tradição democrática, imaginemos o que poderia ter acontecido ao Brasil se o resultado das urnas tivesse sido outro em 2002, 2006 e 2010. O capital nos ensina que "presente de grego" não tem nacionalidade específica. E, principalmente, que "em cavalo dado não se olha os dentes". Principalmente se estivermos diante de um pangaré troiano.

Gilson Caroni Filho é professor de Sociologia das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha), no Rio de Janeiro, colunista da Carta Maior e colaborador do Jornal do Brasil

Conservadores sem bandeira.Estandarte da hipocrisia

 


O senador Demóstenes Torres é uma figura mais emblemática do que ele próprio imagina. Essa derrocada que sofreu, após assumir o papel de guardião da moral pública, tem sido típica da oposição conservadora há mais de meio século.

Caso houvesse um lema na bandeira desses oposicionistas – sem dúvida representada pelo lábaro udenista (foto) – ele seria composto de duas palavras: “Moralidade e Legalidade”, e poderia ser apelidado imediatamente de “Estandarte da Hipocrisia”.

Esse espírito da UDN, hipocritamente moralista e legalista, assombra a democracia brasileira desde a fundação, em abril de 1945. Na esteira da participação militar do País na Segunda Guerra Mundial, os udenistas encarnaram o papel de principal oposição ao Estado Novo. Muita gente, à esquerda e à direita, foi presa e sofreu no cárcere. Não se sabe, no entanto, de nenhum udenista preso ou torturado durante o regime varguista.

No DNA da UDN, além de uma ideologia que varia do conservadorismo ao reacionarismo golpista, consta também a célula de rejeição ao que de melhor fez o ex-presidente Getúlio Vargas. A construção das bases do moderno Estado Nacional e das regras de proteção aos trabalhadores.

Principalmente por essas decisões Vargas pagou com o suicídio, em 1954, quando o arauto da oposição era Carlos Lacerda. Ele segurou o estandarte da moralidade quando criou a expressão “Mar de Lama”, que supostamente corria sob o Palácio do Catete. Nada provado, mas perfeitamente executado e ampliado pelas trombetas da mídia.

Na eleição de 1950, Vargas deu uma surra eleitoral no udenista Eduardo Gomes, um brigadeiro identificado como reserva moral do País. Gomes já tinha perdido, em 1945, para o candidato Eurico Gaspar Dutra, apoiado por Getúlio. Em 1955, a UDN empurrou para o páreo o marechal Juarez Távora. Ele perdeu para Juscelino Kubitschek, que tinha como vice o getulista João Goulart.

A UDN tentou ganhar no tapetão. Renomadas figuras do partido, como Afonso Arinos, tentaram um golpe branco com o argumento, não previsto na legislação, de que JK não havia conquistado a maioria absoluta de votos. Não deu certo.

Em 1960, os udenistas ganharam a eleição presidencial na garupa da vassoura do tresloucado Jânio Quadros. Ele renunciou após sete meses, mas levou a faixa presidencial na esperança de voltar ao poder com o apoio dos militares. Prevaleceu, no entanto, a resistência democrática, comandada por Leonel Brizola, então governador do Rio Grande do Sul. A esquerda saiu fortalecida do episódio e com a bandeira da legalidade nas mãos.

O udenismo chegou ao poder em 1964. Dessa vez a reboque dos militares, com a deposição de João Goulart. Por uma sucessão de erros políticos do presidente, e com uma parte da esquerda alimentando-se de fantasias revolucionárias, entregou de mão beijada aos golpistas o discurso da legalidade. Era falsa. A legalidade udenista abriu caminho para uma ditadura que durou 21 anos.

O mote da ética levou o espírito udenista, encarnado pelo ex-presidente Fernando Henrique, a propor o impeachment inicialmente e, posteriormente, a renúncia à reeleição ao ex-presidente Lula. Não levaram.

Os conservadores de agora, com o processo democrático fortalecido, sem o discurso da legalidade, acabam de perder a bandeira da moralidade sustentada pela hipocrisia de Demóstenes Torres. Com que bandeira eles vão à luta eleitoral?