Mente vazia, oficina do sistema da mídia golpista

Mente vazia, oficina do sistema da mídia golpista

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

A Imprensa versus Lula – golpe ou sangramento”: o livro e os fatos



No momento em que jornais brasileiros jogam a toalha e já começam a falar de Dilma como eleita, é hora de lembrar que a turma do lado de lá não está morta.
Hora de lembrar do que eles são capazes.
Hora de lembrar do quase-golpe tramado em 2005 e 2006.
É o que faço agora. Reproduzo a entevista que concedi ao jornalista Antônio Barbosa Filho, e que ele publicou no livro recém-lançado ”A Imprensa X Lula – golpe ou sangramento”.
===
1) Lula elegeu-se na quarta tentativa, enfrentando uma grande resistência de parte da elite empresarial (“risco Lula”), da então situação (Fernando Henrique advertindo que poderíamos “nos tornar uma Argentina”), e da chamada “grande imprensa”. Vc acha que a vitória deveu-se à fadiga das práticas neoliberais na década de 90? Quem foram os derrotados por Lula, nos âmbitos político e econômico?
Sim, a eleição de Lula deveu-se – em parte – a essa “fadiga” com as políticas neoliberais. Esse é um movimento que se observa em toda a América do Sul. O curioso é que nesses outros países os liberais foram alijados do poder, saíram completamente derrotados. Aqui no Brasil a derrota não foi completa. Lula teve que compor com os (neo) liberais, entregando o BC para um ex-tucano, e pactuando com o mercado uma política economica conservadora (pacto expresso na famosa “Carta aos Brasileiros” de 2002; e na administração Palocci na Fazenda).
Gostaria de lembrar que, em 2002, Lula não sofreu ataques da chamada “grande imprensa”. A Globo estava fragilizada (com o “default” de sua dívida, herança dos anos de FHC), e os outros veículos compreenderam que – dado o fracasso do segundo mandato de FHC – a vitória de Lula seria inevitável. O que fizeram foi “domar” Lula. Engolir a vitoria, mas garantir que ela não significasse rompimentos. Ainda assim, a eleição de Lula significou, sim, uma derrota para setores que dominaram o Estado brasileiro na década anterior. Ao contrário do que se costuma dizer, Lula não foi “apenas” uma continuidade de FHC. Não!
Apesar de conduzir um governo muito moderado, Lula conduziu mudanças emblemáticas em pelo menos 4 áreas: - criação de um mercado consumidor de massas (recuperação do salário-mínimo, do salário do funcionalismo, Bolsa-Familia, política mais agressiva e popular de crédito) – teve papel fundamental no enfrentamento da crise, porque Brasil deixou de depender só das exportações e pôde basear sua recuperação no mercado interno; - respeito aos movimentos sociais – parceria com sindicatos, diálogo com as centrais, com o MST; - recuperação do papel do Estado – fim das privatizações, valorização do funcionalismo, novos concursos públicos, recuperação do papel planejador do Estado (por exemplo, no campo da energia, em que Dilma apoiou a criação de uma estatal para planejar novos empreendimentos hidrelétricos), fortalecimento dos bancos públicos (não mais como financiadores de privatizações fajutas, mas como indutores do desenvolvimento); - política externa soberana – enterro da Alca, criação da UNASUL, valorização de parcerias China, India, Irã; fim do alinhamento com os EUA.

Os três últimos pontos explicam o ódio que latifundiários, “grande imprensa” e parte da velha classe média (que não suporta o avanço de uma nova classe média, e gostaria de ver o Brasil no velho leito de dependência em relação aos EUA) sentem por Lula.
O primeiro ponto, em contraposição, explica porque parte do grande empresariado fechou com Lula: essa turma nunca vendeu tanto, nunca faturou tanto. Lula ampliou as bases do capitalismo brasileiro.
Lula faz um governo social-democrata moderado (e o empresário inteligente gosta disso)
A esquerda sempre pregou a “aliança da classe operária com as classes médias”. No poder, Lula produziu outra aliança: classe operária + grande massa desorganizada (e agora atendida por programas sociais) + grande empresariado.
De fora, ficou a classe média. Que berra na imprensa, ou em certos blogs onde corre o esgoto da direita. Esse povo é que tentou derrubar Lula em 2005 – com um discurso udenista.
2) Contabilizo pelo menos dez “crises” fabricadas pela oposição e pela mídia nesses sete anos de governo Lula, do mensalão às epidemias, da política indigenista à importação de aviões para a FAB, do PNDH 3 ao “Estado policial” apontado por Gilmar Mendes. Em que momentos vc acha que a governabilidade esteve mais ameaçada?
Sem dúvida, esteve mais ameaçada em 2005. Ali, pensou-se em derrubar Lula. O movimento não foi adiante porque prosperou entre os tucanos a tese de “sangrar Lula” até a eleição, para que ele não saísse como “vítima” – mas humilhado, derrotado eleitoralmente.
Os tucanos só não tinham previsto que Lula já criara com as massas uma ligação que o fez forte de novo em 2006.
Ao contrário de 2002, em 2006 a “grande imprensa” foi pra cima de Lula porque entrou em desespero ao ver que o “sangramento” não surtira efeito.
Ressalto, também, que o PT cometeu muitos erros. E que não é saudável nem honesto jogar toda a culpa da crise de 2005 para a imprensa.
Lula pagou o preço por fechar uma aliança heterodoxa – com PL, PTB, PP – para governar. Além disso, o PT perdeu combatividade, acomodou-se nos acordos de bastidor. Preferiu a conciliação com velhos inimigos. Na primeira crise, os novos aliados mostraram que não eram aliados de verdade.
Tudo isso é fato.
Mas o que não dava pra aceitar, em 2006, era ver o chamado “jornalismo seletivo” - a chamar o Mensalão de “maior escândalo da história”. E quem eram os “denunciantes”? ACM, o PFL e os tucanos.
Acho que o eleitor entendeu do que se tratava…

3) A mídia tradicional engajou-se numa campanha cerrada de desgaste do Governo Lula, com denúncias quase semanais, além da visível “blindagem” das oposições. Como vc vê esta postura da mídia, agindo como partido (segundo a própria presidente da ANJ)?
Essa postura ficou mais clara a partir da campanha de 2006, e sobretudo no segundo mandato de Lula.
Em parte, essa postura se explica pelo fato de esses veículos serem os representantes dos setores derrotados pelo projeto (ultra-moderado, repita-se) de Lula.
Mas há mais que isso. Há dinheiro em disputa. Um articulista da “Folha” deixou isso muito claro em 2009, ao reclamar do que chamou de “Bolsa Mídia”. O governo Lula (sobretudo depois da entrada de Franklin Martins na SECOM) passou a distribuir verbas públicas de publicidade não apenas para os 100 ou 200 maiores veículos – como se fazia antes. Mas para 2000 ou 3000 – espalhados por todo o país.
Ou seja, a fatia ficou (um pouco) menor para “Folha”, “Estadao”, “Veja”, “O Globo”.
Eles querem “Bolsa Midia” só pra eles!
Fora isso, Lula quebrou o papel “mediador” da velha imprensa. Ele não fala mais “através” da imprensa. Ele fala direto com os cidadãos. Isso incomoda muito os velhos barões da imprensa.

4) Vc chegou a ouvir de alguém do Governo manifestação de apreensão quanto à governabilidade? Algum receio concreto de um golpe? Ou a campanha permanente visava apenas “sangrar”, mas não derrubar Lula?
Como já expliquei em resposta anterior, a campanha era pra “sangrar”. Aparentemente, ninguém realmente importante chegou a pensar em um golpe tradicional. Derrubada, se viesse, viria pelo Parlamento. Setores do então PFL (hoje DEM) chegaram a projetar essa hipóteses em 2005. Mas não vingou. Faltava a eles gente pra botar na rua. E Lula tnha povo para defendê-lo. Ficaram com medo de repetir 1954, transformando Lula num novo Getulio.

5) Explorou-se bastante as manifestações do general Augusto Heleno, como qualquer outra inquietação na caserna. Vc acha que a oposição a Lula e a mídia tentaram de alguma maneira “sublevar” algum setor ou alguma liderança militar? Como vc vê a conduta dos militares durante o Governo Lula?
Tenta-se trazer os militares (especialmente os mais antigos, da reserva) para esse movimento radicalizado da classe média anti-Lula. Pra isso, exploram-se dois temas caros aos militares da velha guarda: o suposto alinhamento de Lula com a esquerda latino-americana, e as tentativas (tímidas) de se abrir arquivos e levar a julgamento responsáveis por tortura e assassinatos durante a ditadura.
Na reação ao PNDH-3, isso ficou muito claro.
Não creio que um golpe hoje teria a configuração do golpe de 64. Militares da reserva fazem barulho. Mas golpe, se vier, terá uma aparência de legalidade (no modelo hondurenho).
Hoje, creio, a artilharia da mídia é mais pesada (e muito mais perigosa) do que os canhões dos militares.
6) Em recentes encontros, os proprietários dos meios de comunicação brasileiros têm deixado claro que farão “tudo que for possível” para evitar a vitória de Dilma Roussef. De que maneira tal interferência pode ameaçar a lisura do pleito, ou mesmo dificultar a posse da candidata da situação, caso eleita? Em síntese: o processo democrático corre risco neste ano eleitoral?
Em encontro do Instituto Millenium, e em declarações posteriores da presidenta da ANJ (Judith Brito), a mídia deixou claro que se organiza como um “partido”. Em vez de repercutir as falas e os posicionamentos da oposição, a mídia ocupou o lugar dos partidos de oposição – de forma explícita – produzindo programas, estratégias, conteúdos – que depois são utilizados pelas siglas de oposição.
O grande partido de oposição hoje no Brasil chama-se PIG (o Partido da Imprensa Golpista – detectado por Paul Henrique Amorim, com auxílio do deputado Fernando Ferro do PT-PE), e suas sublegendas são Veja, Globo, Folha, RBS, Zero Hora…
Essa turma já deu mostras de que vai radicalizar em 2010. Se sentir que pode empurrar Serra pra vitória, vai usar todas as armas –não creio em golpe clássico, mas em pequenos golpes de terror (com informações falsas ou distorcidas) a tentar influir na decisão do eleitor, às vésperas do pleito.
Não creio que tenham força para influenciar TSE, ou para fraudar a eleição.
Mas ainda possuem força para gerar pânico, para disseminar mentiras. Por isso, é preciso ficara atento em 2010. Será a eleição mais suja desde Collor em 89.

7) Várias das “crises” foram esvaziadas pela imediata resposta e esclarecimentos feitos pela chamada “blogosfera”. Qual o papel da internet e dos blogs independentes na fiscalização da mídia cartelizada, e da defesa da informação mais fiel? Em que momentos a blogosfera conseguiu maior sucesso no desmascaramento de “crises” e/ou tentativas de golpe midiático?
A blogosfera tem um papel importante, mas não devemos superestimá-lo. Ainda geramos pouco conteúdo próprio, não conseguimos criar uma “contra-pauta” àquela que a mídia tradicional impõe ao Brasil. O que fazemos é denunciar que a mídia tem lado, tem partido. Ajudamos a tirar a máscara da neutralidade e da imparcialidade que eles tentaram vestir nos anos 90…
Verdade que Folha, Globo, Veja ajudam bastante nesse processo de arrancar as máscaras. Eles adotam um comportamento quase “didático”, que facilita o trabalho da blogosfera.
Mas voltando à sua pergunta: a blogosfera teve um papel importante já desde 2006 - por exemplo, ao repercutir o belíssimo trabalho de Raimundo Pereira, na “CartaCapital”, que desmascarava o serviço sujo feito pela Globo nas vésperas do primeiro turno (naquela oportunidade, um diretor da Globo chegou a dizer na redação que, “se fosse só a revista nem valia a pena responder, mas a denúncia contra nós correu a internet, é algo muito grave”);
- mais recentemente, a blogosfera reagiu à Folha em dois episódios – quando o jornal chamou a ditadura de ditabranda (o blogueiro Eduardo Guimaraes comandou um protesto que levou 500 pessoas pra porta do jornal, e obrigou os Frias a se desculparem, ainda que de forma envergonhada), e quando o diário publicou uma ficha falsa de Dilma na primeira página (a reação foi tremenda, desmoralizando a Folha, provocando cancelamento de assinaturas…);
- em 2010, tivemos o espisodio da vinheta dos 45 anos da Globo (propaganda subliminar de Serra, com o número e o slogan do candidato); a blogosfera reagiu, e a Globo tirou o comercial do ar (porque teve também, ressalte-se, oposição interna de artistas que não aceitaram ser usados nessa manobra sórdida).

Nenhum comentário:

Postar um comentário

comentários sujeitos a moderação.